Olhar Direto

Quinta-feira, 28 de março de 2024

Opinião

A dor

Desde os primórdios da humanidade até os dias de hoje, os estudiosos da arte de curar têm a dor como uma das suas principais preocupações. Tentam entender e controlar a sua ocorrência.

Os povos antigos atribuíam a dor aos maus espíritos e acreditavam que era uma espécie de punição por atos faltosos cometidos. A medicina era então exercida por sacerdotes, que invocavam os serviços dos deuses para a cura da dor. Eles se utilizavam de remédios naturais, e ofereciam preces e sacrifícios aos deuses que, agradecidos, proporcionavam alívio ao doente.

Não vou discorrer aqui sobre a evolução da história da dor ao longo desses séculos. Só registrar que ela foi um dos fatores que mais afetaram o curso da história humana, pois que acometeu e acomete a população mundial indiscriminadamente.

Atualmente, de acordo com a “International Association for Study of Pain” (IASP), “a dor é uma experiência sensorial e emocional desagradável, associada a uma lesão tissular real ou potencial”. A IASP destaca ainda “o reconhecimento de que a dor é complexa, subjetiva e sujeita às particularidades de cada indivíduo, envolvendo dimensões afetivas, interpretativas e comportamentais, além das fisiológicas e sensoriais”.

E é dessa dor que escrevo hoje: a dor afetiva, emocional e psíquica. Hoje, a neurociência já descobriu que mente e cérebro são indissociáveis e que aquela angústia ou depressão, por exemplo, podem ser muito mais intensa que a dor de uma fratura - é o que nos explica a psicóloga Dra. Dirce Perissinotti. E ela vai mais além: “o sofrimento psíquico imposto por um evento doloroso muitas vezes é

mais devastador que a própria lesão”.

Já existe psicanálise só para aliviar as dores motivadas pelos conflitos emocionais.

Os boêmios costumam chamar a dor psíquica de ‘dor de cotovelo’.

À moda dos antigos sacerdotes, os boêmios têm sua terapêutica médica para a cura de qualquer dor: à noite, dança ao som de muita música ao vivo, com sax, trompete, instrumentos de corda e ritmistas acompanhando boleros, samba canções, sambas de roda e todo tipo da gostosa música cafona feita sob medida para curar a dor de cotovelo. Ah, sim! Uma geladinha para potencializar os efeitos da loira do colarinho branco, e pronto. Eis a cura para qualquer dor.

Ao sol raiar, ninguém deixará ‘o pronto atendimento’ noturno com dores.

As dores físicas, quase não existem mais com os modernos fármacos e as suas mais variadas vias de acesso, feitas com total segurança.

Em um procedimento cirúrgico o mais seguro de todos em nossos dias é o anestésico, embora o paciente pense sempre o contrário.

Há poucos dias fui submetido a uma punção no meu joelho, desgastado pelo tempo de uso. As pessoas me perguntaram sobre o tamanho da agulha e se tinha sentido dor. Para dizer a verdade não vi o tamanho da ‘perfuradora’, e dor não senti.

A analgesia decretou o final da dor física. Entretanto, não conseguimos nos livrar das dores psíquicas, ou como dizem os poetas - as dores da alma.

Essa máquina maravilhosa que é o nosso cérebro, ou ‘célebro’, como batizou o mais novo avecista do Porto, não aceita fantasias da indústria farmacêutica, mesmo amparada pela mais sofisticada das mídias.

Estive doente por esses dias e percorri todos os caminhos por mim conhecidos em busca da minha cura. Melhorei, é verdade. Mas, a dor nos leva a percorrer outros caminhos.

E foi o que fiz. Embrenhei-me por um totalmente desconhecido. No início deste percurso, o desconhecido causou grande turbulência em minha alma. Mas, por fim, ele se tornou o meu mais caro aliado para a cessação das minhas dores.

A mente e o cérebro são indissociáveis. Entrei, pela dor, na medicina do séc. XXI.

Esta experiência me fez lembrar John Lennon: “Não se drogue por não ser capaz de suportar sua própria dor. Eu estive em todos os lugares e só me encontrei em mim mesmo”.

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