Cada choque que temos nas nossas relações oferece uma oportunidade ímpar para olharmos para nós mesmos e investigarmos as raízes internas do mal entendido externo. A desarmonia nos nossos relacionamentos pode estar refletindo uma parte nossa que não aceitamos e que está em desequilíbrio.

Ao invés de esperar e cobrar mudanças de comportamento da parte dos outros, será bem mais inteligente e edificante se colocarmos essa energia a nosso serviço, direcioná-la para dentro de nós, procurando nos compreender, nos observar e nos conhecer melhor. Conflitos intensos e perturbadores surgem quando um quer mudar o outro, contudo, sem se darem ao trabalho de olhar e investigar o próprio comportamento.

Temos que admitir que mal entendidos podem ocorrer quando as pessoas têm um convívio freqüente e mais estreito, principalmente, se levarmos em conta que a grande maioria das pessoas anda em descompasso consigo mesma e, conseqüentemente, com os outros também.

Além disso, precisamos entender que cada indivíduo tem sua natureza própria e única. Ninguém é igual, pois não somos cópias uns dos outros. Num único dia, freqüentemente, passamos por humores diferentes de acordo com os acontecimentos e as situações vivenciadas. E mais, não temos o poder de mudar o outro, seja este quem for: o filho, o cônjuge, o chefe, o pai, a mãe, o amigo, etc. No máximo, podemos mudar a nós mesmos. E ainda assim, mudamos apenas o nosso entendimento, o que permite mudar o nosso olhar e o nosso modo de agir.

Todavia, se estivermos mais familiarizados e em paz conosco, a convivência familiar e social terá chances de ser mais harmônica, de fato, saudável e fraterna, uma vez que não projetaremos lá fora a nossa briga e confusão internas. Se a nossa visão está clara, torna-se mais fácil distinguir o que é conteúdo nosso e o que é do outro. Assim, tampouco vamos nos prestar a sermos depósitos do lixo emocional das pessoas que convivemos. Podemos escolher deixar o lixo que não nos pertence fora da nossa casa, sem que nos cause transtornos e distúrbios mais sérios, em nível físico, mental ou espiritual.

É bom lembrar que mesmo que o mundo lá fora nos rejeite, temos sempre a sagrada opção de nos aceitar e nos acolher com amor e confiança. E esse ombro amigo que oferecemos a nós mesmos é uma atitude que opera verdadeiros milagres! Nessa guinada para dentro do espaço interior, guiados por um sentimento profundo de auto-aceitação de qualquer face nossa, nos observando silenciosamente, sem julgamentos, muitos condicionamentos, reações e amarras se dissolvem. Neste simples passo, mudanças significativas acontecem, naturalmente, sem esforço.

O combustível para qualquer transformação pessoal é o amor e a compreensão. Relacionar-se de forma harmônica conosco e com as pessoas é uma arte que exige um exercício constante de boa vontade, paciência, entendimento e amizade, a curto, médio e longo prazo. Nem sempre é fácil, mas é possível, se não impormos a nós e aos outros, cobranças absurdas e mudanças bruscas e imediatas. As mudanças consistentes não acontecem da noite para o dia, nem pela imposição de quem quer que seja.

Que todos nós sejamos vitoriosos na conquista deste grande e belo tesouro para as nossas vidas: a capacidade de sermos amigos de verdade de nós mesmos, amigos incondicionais, seja nos momentos de alegria, tristeza, saúde, doença, sucesso ou fracasso.

Que possamos conviver conosco e com os outros com menos julgamentos, preconceitos, rejeições, intolerância e mais afeto, amizade, respeito, paciência, compreensão e sobretudo, muita compaixão com os limites de cada um, com as partes que julgamos falhas e que temos dificuldades de aceitar, seja dentro ou fora. Isso é um pacto de paz, amizade e tolerância conosco e com as pessoas que a Existência nos faz conviver, seja por um momento, um dia ou a vida inteira.

BENEDITA ENILDES DE CAMPOS CORRÊA é Administradora e Terapeuta Corporal Ayurvda. Prof. de Yoga. Ministra seminários vivenciais às organizações governamentais e privadas. E-mail: omsaraas@terra.com.br