Olhar Direto

Sexta-feira, 19 de abril de 2024

Opinião

O juiz leigo é a bola da vez.

Foi notícia recente em inúmeros meios de comunicação do Brasil o episódio ocorrido no 3º juizado Especial Cível de Duque de Caxias-RJ, onde uma juíza leiga levou à prisão uma advogada no exercício de sua atividade.

Para a língua portuguesa, leigo é aquela pessoa que não detém conhecimento aprofundado sobre determinado assunto. Sim, existem juízes leigos!

Da Judicialização dos direitos fundamentais, as intermináveis ações de reparação de danos morais por relação de consumo existentes no Poder Judiciário Brasileiro e o fato ocorrido em Duque de Caxias, a culpa é do próprio Estado Brasileiro.

Ao trazer para si o monopólio da Segurança Pública, Educação, Saúde Pública e Pacificação dos Conflitos, o Estado assumiu uma responsabilidade enorme que sabidamente vem demonstrando sua ineficiência.

Não necessita de muito esforço para perceber que dos itens apontados, nada, exatamente nada vem funcionando no Brasil nos dias atuais.

Ideias para diminuir o peso do Estado ou amenizar sua incompetência são usadas, como a teoria do mínimo existencial, por exemplo, com intuito de justificar o que, como dito, saltam aos olhos, o Estado Brasileiro contrariando a própria Constituição da República é ineficiente aos fins que se destina (art. 37, da Constituição).

Mas, essa mesma ineficiência não se observa na arrecadação de impostos. Não precisamos de muitos exemplos para demonstrar o que afirmo, basta ir a uma repartição (órgão) do Estado de assistência pública, como um pronto socorro, uma policlínica, por exemplo, ou a uma exatoria cuja finalidade é arrecadar tributos, para constatarmos as diferenças. Até o tratamento é diferenciado, os hospitais, as policlínicas lotadas sem locais sequer para o doente sentar enquanto aguarda seu atendimento, por sua vez, na exatoria (ou secretaria de Fazenda Pública) o espaço é amplo, ar condicionado, inúmeras cadeiras, até a energia pessoal dos agentes públicos ali são diferentes dos órgãos responsáveis pela entrega do fim estatal (a finalidade do Estado é o cidadão não o próprio Estado).

A ineficiência do Estado nas questões acimas mencionadas, inevitavelmente batem a porta do Estado Juiz, uma vez que cabe a ele dirimir os conflitos.

É sabido que o maior cliente do Poder Judiciário é a própria fazenda pública, que ineficiente, gera em outro Poder Estatal a maioria de seu acervo processual.

Por sua vez, dada a enorme quantidade de demandas advindas da Fazenda Pública que chegam diariamente ao poder judiciário (na grande maioria execuções fiscais e ações requerendo liminares por atendimento à saúde), o Poder Judiciário fica inviabilizado para dar andamento satisfatório às demais demandas que chegam em suas escrivanias.

Com esse panorama, o Estado Juiz, talvez não querendo dar solução eficaz ao problema, ou até mesmo não disposto a meter o dedo na ferida (sic), uma vez que é dependente do duodécimo a ele destinado pelo Poder Executivo, cria em suas dependências "puxadinhos", incorrendo na mesma ineficiência do Estado Executivo (Poder Executivo).

Atribuo, sob a minha ótica, a responsabilidade da dificuldade passada pelo Poder Judiciário ao próprio Judiciário. Vejam as sentenças proferidas nas relações de consumo, onde o Poder Judiciário reconhece a ocorrência de ato ilícito, condena o agente do dano geralmente a indenizar o lesado em 5 e poucos mil reais por causar lesão moral a outrem.

A justificativa para tal sanção (5 e poucos mil reais para indenizar um dano moral) de ordem intima é para evitar o enriquecimento ilícito do beneficiado (ofendido) e para que o agente causador da ofensa reflita sobre seu ato. Conclusão, nunca teve efeito algum, o código de defesa do consumidor tem exatos 28 anos e as sentenças não atingiram seus objetivos (coibir, punir e servir de efeito pedagógico).

Vejam as pautas de julgamentos das inúmeras varas cíveis e juizados especiais, os agentes quase sempre são os mesmos, telefonia, bancos, concessionarias de serviços públicos, etc. As sentenças sim, são as mesmas, modificando somente a parte preambular modificando a qualificação do Autor ao caso em concreto. Como alterar essa realidade? Certamente aplicando de forma objetiva o que se destina a sanção, reparar, punir, educar. Da forma que vem sendo feito já demostrou que não serve.

Mas não, a sentença está ali pronta. E isso explica a existência do juiz leigo nos Juizados Especiais, uma vez que é sabido que como auxiliar do juízo (assim como o diretor da escrivania, oficial de justiça, a moça[o] do protocolo) não detém jurisdição, logo não decide, mesmo entendendo diversamente do magistrado titular do juízo, tem que sujeitar sua decisão ao crivo do magistrado togado (investido de jurisdição).

A função tem previsão legal, na Constituição Federal (art. 98, inciso I) e na lei de criação dos juizados especiais nº 9.099/95, em seu art. 7º, e deveria, assim como o objetivo da lei nº 9.099/95, ser exceção e não regra.

Há uma tendência hoje das ações judiciais serem direcionadas aos juizados especiais, principalmente pelas orientações contidas nos Regimentos Internos dos Tribunais, para dificultar a concessão dos benefícios da justiça gratuita, mesmo a lei definindo expressamente os critérios para tanto (art. 99, §§ 2º e 3º do CPC). Arrecadar é o foco! Sim Excelências, essa é a mensagem que nós advogados deciframos.

Ocorre que os Juizados Especiais já não suportam o fluxo de processos em sua jurisdição, uma decisão de mérito satisfativa no microssistema dos juizados especiais cíveis demora o mesmo tempo que uma decisão da justiça comum. Raramente é de forma inversa.

Aí, para dar resultado aos fins que se destinam o Estado Juiz, criam a figura do juiz leigo (a exemplo dos antigos juízes classistas da justiça do trabalho), dando aparência de autoridade a quem não a tem, mas a depender da pessoa que está na função, por um questão da condição humana (vaidade), acredita ser o próprio detentor da jurisdição, levando ao lamentável episódio ocorrido na Comarca de Duque de Caxias na sala de audiências do 3º juizado especial cível, que determinou a prisão com o uso de algemas de um profissional que a própria Constituição da República, outorgou a condição de profissional indispensável a administração da justiça (art. 133, CF).

Mas como administrar aquilo que está em condição inadministrável? Olhem aí o resultado. Vejam o severo contingenciamento sofrido na Justiça do Trabalho recentemente.

Sensato foi o magistrado titular daquele juizado em que a advogada no exercício de sua função saiu algemada, Dr. João Batista Damasceno, ao requerer ao presidente do TJRJ a dispensa da juíza leiga que ordenou de forma autoritária a prisão da advogada, afirmando que: "(...) Se não defendermos as prerrogativas de quem defende direitos, não teremos quem nos defenda quando nossos direitos forem violados". Diz ainda, "(...) a figura do juiz leigo é uma espécie de terceirização da atividade judicial e sua existência precisa ser repensada".

A culpa é sempre do Estado.


Jean Lucas Teixeira de Carvalho é Advogado brasileiro residente em Lima no Peru. Especialista em Direito Processual Civil. Direito do Trabalho, Processo do Trabalho e Direito Previdenciário. Direito Eleitoral e Improbidade Administrativa, pela Fundação Escola Superior do Ministério Público de Mato Grosso.
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