Olhar Direto

Quinta-feira, 28 de março de 2024

Opinião

O Estado e os direitos LGBTQ+

As eleições gerais de 2018 serão realizadas no ano em que se comemora 40 anos do movimento LGBTQ+ no Brasil. Na realidade, diante do conservadorismo crescente e a falta de políticas públicas para gays, lésbicas, bissexuais e pessoas trans, pouco há de se comemorar. No Congresso Nacional, são dezenas de projetos de lei à espera de aprovação. Entre as propostas, 13 se destacam, como a criminalização da LGBTQfobia, casamento homoafetivo, alteração do nome e da identidade sexual e outras medidas para promover a igualdade, como uso de banheiro de acordo com a identidade de gênero.

A aprovação de tais projetos é de grande importância para nós LGBTQs, mesmo que alguns destes temas já tenham certo avanço devido a intervenção do judiciário. Caso, por exemplo, do projeto (PLS 612/2011) em trâmite no Senado, no qual se reconhece como entidade familiar a união estável entre duas pessoas (independente de gênero) e prevê que essa união possa ser convertida em casamento. Ambos os direitos foram assegurados pelo STF e CNJ. No entanto, a mudança via Legislativo reforçaria o respaldo legal, afastando qualquer ameaça de mudança de entendimento.

A estagnação política vista até então no Congresso e nos Estados ainda preocupa, devido ao perfil e pouco conhecimento demonstrado pela maioria dos candidatos aos cargos de governador, senador e deputados federal e estadual. Em meio ao debate eleitoral, candidatos erram ao falar que o Estado não deve intervir na vida privada das pessoas, como se esta militância buscasse privilégios que interviessem na relação íntima dos brasileiros.

A questão não é buscar garantir os direitos igualitários dentro de quatro paredes, mas fora delas.

O que se busca são garantias de que gays, lésbicas, bissexuais, trans e todos os outros grupos que o símbolo + representa na sigla, tenham o seu direito de cidadania e saiam da marginalidade. Realidade cruel vista hoje em todos os cantos do país.

Concordo que o Estado não deve se meter na ORIENTAÇÃO SEXUAL (digo isso em caixa alta, pois ainda insistem em relacionar a atração a uma escolha e não a atração afetiva e sexual). Defender que cada cidadão é livre para cuidar da sua vida, sem preconceitos, é um falso discurso de quem pouco se importa com a urgência LGBTQ+, mas não quer ficar mal na fita, nem com os conservadores e falsos moralistas nem com quem sofre na pele o preconceito e discriminação por ser quem se é.

Quando se fala de políticas públicas para LGBTQ+, não se trata de questões íntimas, mas no pensar em o que se fazer para tratar crimes perversos contra travestis, por exemplo. Assim como a falta de empregos para transexuais que ainda encontram dificuldades para ter seu verdadeiro nome e gênero em documentos oficiais. E ainda, ações governamentais para combater o crime de ódio contra essas pessoas e acabar com a impunidade dos agressores, entendendo que crimes relacionados a questão de orientação sexual e gênero devem sim ser tratadas de forma contextualizada, como nos casos de racismo e feminicídio (que ainda apresentam suas deficiências).

Se não bastasse a letargia do Estado em colocar em prática estes projetos, ainda há ações para retirar o pouco que conseguiu avançar. Para o azar da população mato-grossense, um parlamentar do nosso Estado, aquele mais conhecido por se posicionar contra o Mikey do que pelos projetos de relevância, chegou a apresentar uma proposta na Câmara Federal para que apenas casais formados por homem e mulher possam adotar.

Diante de tal exemplo, o discurso de que o Estado não deve “meter a colher” em questões envolvendo LGBTQ+, por se tratar de assuntos íntimos, cai por terra. Como o Estado não pode intervir para manter o direito de casais gays adotarem, mas aceita deputados inescrupulosos apresentarem projetos para estipular uma proibição a ação que se configurou como um avanço na questão do abandono afetivo e social de diversas crianças brasileiras?

É curioso acompanhar que o Estado vem sendo utilizado apenas para atender aos interesses daqueles que temem a ameaça que a evolução social representa a sistemas arcaicos.

Aparentemente, o sistema político brasileiro funciona da seguinte forma: se for para retirar direitos, o Estado está a postos, mas para garantir a dignidade humana, a sociedade deve seguir seu caminho natural, pendendo para suprimir as súplicas das minorias.

Apesar de ser tão claro, quem clama por privilégios não são aqueles que morrem pelo fato de se travestir ou demonstrar afeto a quem se ama em público. O discurso de que as minorias querem privilégios é tão ultrapassado, que nem mesmo o mais ignorante ator político consegue acreditar.

Por fim, é preciso falar que Mato Grosso é um dos poucos estados brasileiros que ainda não possui um conselho específico para discutir políticas públicas de inclusão e defesa da dignidade desta comunidade. Em 2015, o governo chegou a baixar um decreto instituindo tal grupo de discussão. No entanto, a defesa da tradicional família brasileira e conservadorismo que domina o Legislativo fez com que importante iniciativa ruísse. Desde então nada continuou sendo feito.

O período eleitoral, talvez, seja a única luz no fim do túnel para que parte esquecida da população mato-grossense seja ouvida. Até o momento, importante passo já foi dado: há quem levante a bandeira arco-íris não só como falsos simpatizantes focados apenas nos votos da comunidade. A partir da possibilidade de escolha, a torcida é de que em meio a tortuoso caminho até o Parlamento, tais candidatos mantenham a bandeira em riste e lutem para que estas dezenas de projetos não fiquem apenas no papel.


Airton Marques é jornalista, formado em Rádio e TV pela UFMT e editor de política do portal Rdnews. Cânceriano e palmeirense, nasceu em Minas Gerais, mas se considera cuiabano de coração há mais de 15 anos. E-mail: airtonmlf@gmail.com.
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