Olhar Direto

Quinta-feira, 28 de março de 2024

Opinião

A hipocrisia e o admirável mundo novo do garantismo penal

Um dos significados do substantivo hipocrisia no dicionário é o de corresponder ao hábito que se baseia na demonstração de uma virtude ou de um sentimento inexistente ou então a característica daquilo (ou de quem) que não é honesto: a hipocrisia do discurso. Neste exato momento, por conta da divulgação pelo site esquerdista “The IntercePT Brasil” de mensagens de celular do Juiz Sérgio Moro e Procuradores do MPF, obtidas de forma CRIMINOSA por não se sabe quem, assistimos a um dos maiores shows de hipocrisia por parte significativa da imprensa, articulistas, políticos e, pasmem, Ministros do Supremo como o Sr. Gilmar Mendes.

O público leigo e que não milita no mundo jurídico provavelmente não ouviu falar em “garantismo penal”. Chamo a atenção porque, doravante, esta palavra estará em voga, como já vem fazendo o jornalista Reinaldo Azevedo. Por quê? Os ataques ao Ministro Moro ensejarão um embasamento jurídico para construção de uma narrativa que crie no senso comum, notadamente o da militância petista, motivos para robustecer a já pálida bandeira do “Lula-livre”. É aqui que adentramos às duas questões deste artigo: a hipocrisia e o garantismo.

O garantismopenal é daquelas construções humanas bem intencionadas e com vistas à proteção das pessoas contra o arbítrio e o poder punitivo estatal. Assenta-se nos modernos princípios constitucionais como, por exemplo, a legalidade estrita, presunção de inocência, juiz natural, ampla defesa, contraditório, devido processo legal etc. No mundo real, como inúmeras estruturas legais pensadas para melhorar o sistema, pode ser manobrado em favor de interesses escusos ou proteção de criminosos. Veja-se a presunção de inocência. Como princípio constitucional e aplicado como deseja parte do STF, praticamente não mais veríamos os criminosos do colarinho branco na cadeia.

Não se pretende subavaliar os avanços civilizatórios de tal corrente doutrinária, até porque este não é um texto jurídico.Luigi Ferrajoli é um jurista italiano e principal expoente no mundo do direito penal dogarantismo. Em seu livro Direito e Razão, Ferrajoli desenvolve o que ele denominou de “sistema penal garantista – SG”, alicerçado em dez axiomas ou princípios axiológicos fundamentais que vão desde os conhecidos “não há pena sem crime” (nullapoenasine crimine) e “não há crime sem lei anterior que o defina” (nullumcrimensine lege)até o “não há prova sem defesa (nullarobatiosinedefensione). Deste modo, segundo Ferrajoli, tais princípios definem o modelo garantista de direito ou de responsabilidade penal, ou seja, “as regras do jogo fundamental do direito penal”. As constituições modernas os incorporam de alguma forma, como no caso da nossa (Artigo 5º, Incisos XXXVII, XXXIX, XL, XLIII, XLVI, LIII, LIV,LV, LVI, LVII, LIX, LXI, LXII, LXIII, LXV, LXVI, LXVII, LXVIII, LXIX, LXXVIII, CF/88) a título de exemplo.

Assim, é corolário desse sistema o modelo de persecução penal acusatório, onde existe a separação entre acusador e julgador. Vige em nosso sistema um modelo misto. Inquisitório na fase pré-processual (Inquérito policial) e acusatório na fase processual. Entre as principais características do sistema acusatório, segundo o jurista brasileiro garantistaAury Lopes Jr, está no fato de que o juiz é tido como um terceiro imparcial, “alheio ao labor de investigação e passivo no que se refere à coleta da prova, tanto de imputação como de descargo”. Ainda, segundo o próprio jurista, isto tudo em tese, uma vez que o próprio Código de Processo Penal atribui poderes instrutórios ao juiz e a maioria dos tribunais e doutrinadores defende essa postura ativa por parte do juiz.

O ex juiz Sérgio Moro vai ser atacado justamente nesta emblemática questão. As supostas mensagens (ainda não há os originais) trocadas entre juiz e procurador atentaram contra ao princípio da imparcialidade judicial? Houve severa ruptura aos princípios norteadores do sistema acusatório e ao garantismo penal? Tal prática é comum entre os operadores do direito no Brasil? Juiz imparcial é juiz neutro? Houve prejuízo para a defesa? Houve juízo de valoração sobre as provas sem embasamento técnico?  Estas são algumas das questões técnicas que poderão ser levantadas caso haja judicialização dos fatos.

Saindo agora da esfera jurídica e adentrando a moral, todo esse episódio canhestro, fruto de uma ação criminosa, somente está com a repercussão atual por um motivo muito simples: envolve a figura de um criminoso, chefe de uma quadrilha que instalou-se no aparelho do estado (cleptocracia) destacando-se por um dos maiores assalto organizado aos cofres públicos de que se tem notícia na história das Nações.

Ora, todos os dias princípios do sistema penal garantista são quebrados ou violados no trabalho de persecução penal executado pelo Estado. O poder judiciário não possui estrutura organizacional que suporte a demanda de milhões de processos/ano em todas as áreas do direito. Nem por isso vemos um levante de juristas, analistas, ativistas e imprensa em uma cruzada demolidora para fazer valer as garantias fundamentais dos indivíduos frente ao poder punitivo estatal. Reina a hipocrisia.

Criminosas da cepa de Lula, com recursos financeiros para contratar bancas de advogados e comprar pareceres de renomados juristas, jamais iriam responder por seus crimes em um sistema judicial como o nosso. O mais humilde dos brasileiros sabe o que é esperar pela resolução de uma demanda na justiça, desde um simples litígio com seu vizinho, a prisão em flagrante do filho que furtou um pequeno objeto até o homicídio de um ente querido. A justiça tarde e, não poucas vezes, falha em seu mister. No entanto, o juiz conversou com o promotor! Anule-se tudo! Reina a hipocrisia!

No admirável mundo novo garantista o juiz é absolutamente imparcial e trabalha com estrutura de pessoal e recursos compatíveis com a demanda. O Ministério Público e as Polícias Judiciárias igualmente estão no mesmo patamar evolutivo e de qualidade operacional. Mas a realidade, sempre ela, insiste em nos decepcionar. Os princípios do sistema penal garantista são manejados pelos grandes criminosos, os quais possuem os recursos necessários para impedir ou retardar o poder punitivo estatal para aplicar a lei penal. Foi a Operação Lava-jato que começou a mudar essa lógica perversa, a custo de trabalho, esforço e dedicação. Ao levantar a ponta do iceberg, a polícia e o MP depararam-se com um complexo aparelho criminoso, dotado de uma engenharia financeira extremamente complexa, que envolvia até um departamento estruturado para gerir recursos de propina na maior empreiteira do Brasil. Além de abastecer o caixa das campanhas petistas, alavancaram as eleições de repúblicas bolivarianas e ditaduras africanas. Foi necessário a constituição de uma Força-Tarefa de Estado para fazer frente às investigações e levar para a cadeia expoentes graúdos do mundo político e empresarial. É disto que se trata a Lava-Jato e não a investigação de quadrilhas de bairro.

Ao tempo em que invocam os fundamentos garantistas para anular a lava-jato, seus apologistas silenciam sobre a quebra dos mesmos princípios ao aceitarem que os frutos de uma ação criminosa grave seja utilizada para atingir a reputação dos operadores da Força-Tarefa através de um site ideológico, um jornalista militante e utiliza-se de um direito constitucional (proteção da fonte) para ocultar um crime e criminosos. Quantos desses “defensores da democracia” resistiriam à revelação de suas mensagens telefônicas? Reina a hipocrisia.

O próprio Ferrajoli aborda em seu livro a questão da “falácia garantista”, ou seja, a “ideia de que bastem as razões de um direito bom, dotado de sistemas avançados e realizáveis de garantias constitucionais, para conter os poderes e para pôr os direitos fundamentais a salvo de suas distorções”. Quando o Estado-Juiz atinge as entranhas do poder político, desmascarando uma realidade travestida de “governo dos pobres”, como aconteceu com a operação lava-jato, é óbvio que o “sistema” que vigorava reaja à altura. Assim,é natural que o “modelo garantista” delineado em abstrato e que jaz em silêncio no dia-a-dia do Estado e de seus administrados, surja com vigor para exigir que seus princípios e normas constitucionais produzam seus efeitos para tutelar os autores intelectuais e principais operadores da cleptocracia implantada pelo lulo-petismo das garras da lei.

A desproporção da narrativa dos defensores da delinquência política, a despeito de tudo o que já foi desvelado, quando contraposto às mensagens divulgadas pelo site “The IntercePT” Brasilé assustador. Querem fazer crer que Lula foi julgado por um tribunal de exceção e está na condição de “preso político”. Vale tudo para soltar o messias da revolução bolivariana tupiniquim.

Felizmente o Brasil é outro. Não mais subsiste um discurso hegemônico de uma esquerda esquizofrênica e vitimista. A maioria da população já sabe perceber a democracia com os olhos de uma incipiente direita conservadora. Essas pessoas reaprenderam a dar às coisas e fatos o nome certo: crime é crimee não “mal feitos” como dizia certa Presidenta. Os eleitores de Bolsonaro estão saturados com a corrupção, este câncer que corrói a dignidade da nação. Como bem disse o General Heleno, o Brasil não merece um presidente desonesto!
 

Julio Cezar Rodrigues é economista e advogado (rodriguesadv193@gmail.com)
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