Olhar Direto

Terça-feira, 23 de abril de 2024

Opinião

Será o fim da Social-democracia?

Defender os direitos sociais em face da instabilidade constitucional instalada pelo governo atual não significa optar pela volta da esquerda "lulista" ao poder. Até porque o PMDB sempre esteve negociando com o PT a governabilidade do Poder Executivo. Porém, quando o PT não quis mais "pagar" por isso, começou a sofrer ataques ininterruptos de boa parte do Congresso Nacional e, diante da crise econômica, do desequilíbrio nas contas pública, do aumento do desemprego e do desenrolar da operação Lava Jato, logo veio perdendo o que restava de legitimidade e credibilidade junto à opinião pública, o que acabou abrindo margem para que o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff(PT) ocorresse. Uma ruptura na democracia que abriu alas para uma série de retrocessos na legislação constitucional do país.

Contudo, o que se pode concluir ao analisar o conjunto dessas emendas e reformas é que, na ânsia de ajustar a economia e gerar empregos, o atual governo, juntamente com os seus aliados do Congresso, têm violado os direitos fundamentais do cidadão, sobretudo, aqueles elencados a partir do artigo 6º da Constituição que tratam dos direitos sociais.

Não obstante a esse desmonte proposital do Estado, que deveria garantir essas liberdades positivas aos indivíduos, com a finalidade de melhorar as condições de vida dos menos favorecidos, agora o atual governo mostra a sua real face despótica ao tentar aprovar (a qualquer custo, via fisiologismo e a toque de caixa) uma reforma trabalhista no Senado (PLC 38/2017). O projeto, que praticamente enterra a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), atenta contra inúmeras conquistas dos trabalhadores.

Diante dessas manobras políticas, fica a indagação: Em qual livro de história os economistas de Temer leram que, para gerar empregos e equilibrar o orçamento, seria necessário criar um ambiente de apartheid econômico no Brasil? Com mão-de-obra barata, socialmente desprotegida e desempenhada em um sistema escravagista? 

Do que adianta ajustar a economia e gerar empregos, mas se, em longo prazo, a produtividade do trabalho vai inevitavelmente cair, pois qual ser humano consegue trabalhar 12 horas ininterruptas e descansar nesse ínterim apenas 30 minutos durante 18 dias consecutivos? Apenas um robô poderia fazer isso ou um escravo da revolução industrial. Essa era a proposta de um tucano líder dos ruralistas no Parlamento Federal até poucos dias atrás.   

No entanto, nos últimos dias boa parte da grande imprensa vem comemorando os 60 mil novos postos de trabalho, a queda dos juros, um recuo insignificante da inflação e a aparente saída da recessão. O que isso representa em um universo de quase 14 milhões de desempregados? É lógico que quando o mercado deixar de ser aquecido pelos bilhões liberados para saques nas contas inativas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), a realidade volta a bater na porta dos brasileiros. 

Do que adianta gerar milhares de empregos agora, se no futuro a renda e o poder de consumo dos trabalhadores pode despencar, bem como a formalidade desses postos de trabalho. Esse quadro obscuro se explica porque se o cidadão não tem mais um sistema de proteção social, terá que pagar por isso; na prática, conjugando todas essas medidas impopulares decorrentes das emendas de Temer, o que vai restar de serviço público para o cidadão? Trabalhar sem se aposentar até morrer consumindo apenas a cesta básica de cada mês.

A potencialidade do mercado interno brasileiro não será uma meta do governo, pois ele se fragilizará ainda mais. O turismo vai se estagnar de vez, pois quem não tem dinheiro nem para sobreviver como é que vai conseguir viajar? Por isso o governo tem planejado investir na qualificação em massa dessa mão-de-obra barata, transformando os cidadãos em peças para engrenar a nova industrialização no país. Mas o problema é que aquecer apenas um setor da economia, sem pensar na inclusão social de um todo, está se criando um ambiente propício para informalidade e o que é pior, para marginalização.

Pois o efeito do conjunto dessas emendas à Constituição na camada economicamente mais vulnerável da sociedade será de estagnação, ou seja, vai aumentar a desigualdade social no país. Veja bem, o sujeito não tem saúde, nem educação, muito menos uma assistência social por parte do Estado, bem como nenhuma perspectiva de se aposentar tão cedo; enfim, o que será mais atrativo para ele? O mercado informal, a criminalidade ou os porões insalubres das fábricas sem nenhum tipo de segurança do trabalho?

Tentar equilibrar as contas públicas sem garantir os direitos sociais, caminhando para insustentabilidade econômica, é a mesma coisa que retirar as muletas dos cavalos para fazer uma roda para carroça andar mais rápido. A coisa toda uma hora vai desandar. Além do mais, a história de muitos países já nos revelou que a economia nunca se manteve estável em época de exploração social.        
       
Assim, diante desses fatos - que revelaram o estrangulamento do que restava dos direitos sociais dentro do já fragilizado "Estado Democrático" – a história registrará que o governo de Temer, através dessas malfadadas reformas (PEC do Teto, terceirização e as reformas: trabalhista e da previdência), agiu de forma impositiva contrariando a opinião pública.

Portanto, era necessário controlar os gastos públicos sim do país, sem que com isso precisasse se violar os direitos antes consagrados na Carta Magna de 88, bem como ainda é necessário buscar a viabilidade (depois de um amplo debate público) para a reforma tributária e para regularizar o déficit da previdência. Porém, as ações antidemocráticas por parte deste governo – que tentam implantar reformas de cima para baixo sacrificando ainda mais os mais pobres – revelam que realmente eles (assim como o PT não tinha) não têm também legitimidade e credibilidade para terminar essa missão republicana, pois não representam o anseio da população, mas apenas alguns interesses escusos de uma minoria aristocrática, que por sua vez, não tem a mínima vontade de criar os filhos deles aqui no Brasil.

*Marcelo Ferraz é jornalista e escritor. 
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