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30 ANOS DE CARREIRA

Funk "Deu onda" é coisa fugaz e vai durar dois meses, dispara vocalista do Raimundos; veja entrevista

21 Jan 2017 - 15:54

Da Redação - Paulo Victor Fanaia Teixeira

Foto: Olhar Direto

Digão, em entrevista ao Olhar Conceito

Digão, em entrevista ao Olhar Conceito

Crítico ferrenho do mercado fonográfico e com mais de 30 anos no cenário rock com a banda Raimundos, o vocalista e guitarrista Digão não poupa o verbo e é figura mais do que qualificada para explicar: que Diabo está acontecendo com a música brasileira? Eles “só querem uma nova Anitta, um novo Gustavo Lima ou um Luan Santana”, contestou o músico. Digão ainda condenou o mais recente “hit” do verão, o funk “Deu onda”: “muquiquinha fugaz que vai durar dois meses” e fez declaração inédita: as portas para o ex-vocalista, Rofoldo, não estão fechadas e é possível um retorno, mediante profunda conversa.  

A banda, lançada em 1987, celebra sua longevidade ao lado de Canisso, Marquim e Caio Cunha, com um DVD acústico gravado em novembro, ao lado de craques, como Dinho Ouro Preto, do Capital Inicial e da cantora Ivete Sangalo.

Digão esteve na redação de Olhar Conceito na tarde desta quinta-feira (19). Ele tocou naquela noite no Malcom Pub, onde apresentou o projeto “Clássicos do Rock”, ao lado da banda cuiabana Ponto Seis. Ao longo da entrevista, confirma alguns dos clássicos da banda:

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Digão, como você enxerga o cenário rock atualmente?

“A gente tá vivendo um momento de muitas mudanças, o rock n´roll não é o que está em voga, não é o que está nas rádios, você vê uma febre de sertanejo e um pouco do funk. Mas isso é uma coisa que não me preocupa, pois acho que rock n´roll vai estar ali borbulhando no underground e ele é de ciclos. Tivemos o ciclo dos anos 80 e 90, em 2000 tivemos uma galerinha, mas já foi algo mais diluído. Acredito e essa é a mensagem que passo para todo mundo que curte rock n´roll e que tem banda de rock: não deixe de acreditar, não tente fazer musiquinha só para diretor de rádio. Faça musica sua, algo seu, pegue suas influencias, misture em um caldeirão e faça algo seu, pois se você se preocupar com os moldes você estará matando aquilo que é mais importante: a descoberta de coisas novas. Estou na fé e o fato de o sertanejo está lá...bem, o que me deixa mais tranquilo é saber que eles estão lá não por motivos musicais, mas por grana que está comprando os espaços, nos rádios, compram espaços na TV, e é isso. O rock está ali por fora, e é nas beiradas que você chega à sopa”.
 
 
E o Raimundos no meio disso?

“O Raimundos tem seu espaço garantido, mas todo mundo sentiu um pouco a diminuição do público e no número de casas de shows, lugares para tocar. Mesmo assim conseguimos fazer o DVD acústico que vai fazer a gente entrar em camadas que não entrou ainda. Gravamos em novembro de 2016, com participações maravilhosas, como Marcão do Charlie Brown Jr., Alexandre, do Natiruts, Dinho do Capital Inicial, Ivete Sangalo...e ficou muito bom. Tudo funcionou bem, ficou muito bom, todas as participações, o DVD, com fotos lindíssimas. Gravamos em Curitiba, no teatro Positivo, um lugar maravilhoso, enorme e mesmo com Guns N´Roses tocando no mesmo dia que a gente, concorrendo com eles, mesmo assim ficou ótimo. A gente não se abalou e fizemos do mesmo jeito, o palco, o cenário e o telão. O DVD chama-se ‘Acústico Raimundos’. É nosso disco de inéditas, foi a Som Livre que ajudou a fazer esse DVD”.

Melhor que crowdfounding (plataforma em que alguém solicita doações de populares para realização de um produto cultural)?

“Eu gosto do crowdfounding, mas acho que ele tem que ser usado no momento certo. É bom para quem já tem nome, mas não tem acesso à gravadora. Porque gravador hoje, o que ela quer? Ela quer uma nova Anitta, um novo Gustavo Lima, um novo Luan Santana e não é por aí, o Raimundos sempre trabalhou por fora e sempre tivemos que trabalhar com duas musicas para começar a ‘pegar’”. 
 

E eles?

“Eles trabalham música por música agora. Esses dias eu estava passando e vi um folder com pôster de um artista que dizia: ‘dia tal, o novo sucesso de fulano de tal estará nas rádios’. Eu falo assim, ‘pera aí, eles já tem o dia certo para entrar na rádio e já são sucesso?’. É um jogo de carta marcada, o sucesso já está garantido e acho que é isso que está estragando a música brasileira. Eles estão dominando na base da falcatrua, no dinheiro. Acho isso péssimo, pois faço a música pela música, não faço para vender”.

E a internet, o Youtube e o Spotfiy?

“Ah, são isso, esqueça disco, a gente não faz mais disco para vender, mas para estar na mídia, no mercado. As pessoas que copiem, podem copiar, quanto copiado melhor. Se eu chegar amanhã em uma feira e encontrar o CD do Raimundos falsificado, para mim é indiferente. Eu quero que a banda caia na boca do povo e que a gente faça shows. Eu vejo muito a crise, o Brasil nesta crise fica muito difícil para as pessoas comprarem discos. Agora, esses aí que estão no topo, viram e dizem que venderam 800 mil cópias. Eu faço uma pergunta: ‘vem cá, você quer olhar aqui na minha cara, me chamando de babaca, e dizer que 800 mil pessoas entraram na Saraiva ou na FNAC e compraram 800 mil discos no Brasil todo? Na boa, melhor você tomar no *#$&”.

Não é assim?

“Não, eles pegaram uma empresa...fizeram um negócio com ela e todo mundo recebeu um disco, mas a empresa que comprou todos, e aí eles contam como se fosse venda. Fazem um cambalacho com uma empresa, dão milhares de discos e fingem que a empresa comprou e é triste isso, por isso eu bato forte nessa galera. Eles tratam o músico como lixo, só se importam com a dupla (sertaneja) e você olha atrás, estão uns gatos pingados tocando triste ali, sem destaque. Bem diferente do rock, no rock o baterista é importante, o baixista é importante, é uma banda, cara, isso é música, eles se conheceram na escola, montaram a banda, tinham um sonho, tomaram na cabeça e a coisa foi...isso é música, isso é pra sempre”. 
 

Realmente...

“É...esses dias eu tava me lembrando: e aquela música mesmo que o pessoal cantava, do vagalume? ‘vou caçar mais um milhão de vagalumes por aí...’ 

"Vagalumes", da banda Pollo?

"É...essa música tocou muito. Cadê? Não me lembro dessa banda, não lembro da cara deles, não se vê em lugar nenhum, enquanto isso o Legião Urbana está tocando, Capital está tocando, o Rappa, Raimundos nas rádios. É uma coisa que é pra sempre. Não aguento essas musiquinha ‘ah, não sei o que me deu onda, nhenhemnhem’ (funk "Deu Onda", do MC G15). Aquela coisa fugaz, música que vai durar dois meses. Não se fazem mais coisas para durar, saca...móveis, carros. É triste”.

Então é tudo comprado?

“Desculpe-me, os espaços estão todos comprados. Ele está lá horas na TV? Puff, pagou para estar ali e lógico, pagando para rádio, pagando para tudo, uma hora as pessoas vão gostar, vão consumir. E aí amanhã ele ‘ah, olha aqui o disco de ouro que eu ganhei’. ‘Ganhei’ não, ‘paguei’”.

Você acha que em alguma época, com a saída de Rodolfo (ex-vocalista), o Raimundos se tornou cover de si mesmo?

“Muitos falaram na época, logo que Rodolfo saiu da banda e a gente, sempre espirituoso, apesar dos pesares, dissemos, ‘se você acha que sou cover, pode ter certeza que eu sou o melhor cover de Raimundos que você vai ver na vida’. Com o tempo, porém, essa mesma galera começou a enxergar que existe (agora vou falar em terceira pessoa, acho horrível isso!) o Digão como vocalista, as pessoas me veem cantando. Saiu na rua e as pessoas me chamam de vocalista. Ouvimos absurdos horríveis na época, jornalistas que aproveitaram o momento para pisar. Tudo bem venda seus jornais, fiquem à vontade se querem me fazer de carniça. Mas, virou o jogo. Já era”.

E hoje?

“Ah... as pessoas querem que o Raimundos esteja como estava naquela época, mas não vai, pois não existe a ‘onda’. Naquela época vínhamos do grunge, do Nirvana, do Red Hot Chilli Peppers, era outro cenário. As pessoas querem, de um dia para outro, que eu seja como era o Raimundos naquela época, não é assim. Dentro das possibilidades o Raimundos está muito bem, podem falar o que for, mas o show do Raimundos é do $%& e as pessoas agitam como antigamente. A gente está bem e em um caminho ascendente, sempre subindo”.

 

O que virou do Rodolfo?

“Não sei, não tenho contato. Minha vida tomou outro caminho, ele também, ele deixou bem claro isso, eu respeitei, mas nunca mais. De vez em quando ouvia falar de uma entrevista ou outra que ele falava mal, mas ele fala mal de uma coisa que usufrui, é triste. E outra: eu não quero saber, velho. É aquela história: agora quem não quer sou eu! (risos). Eu me realizei profissionalmente, gosto de cantar, acho estranho eu voltar a ser guitarrista, ficar em segundo plano. É estranho para mim, vai ser estranho. Eu não estou fechando a porta, mas é porque realmente é uma conversa muito mais profunda e eu não sou um cara de fazer concessões, tipo ‘ah, não posso cantar essa música’. Não, se quer ser do Raimundos tem que cantar qualquer uma, tem que ser do Raimundos mesmo”.

Então, a iniciativa de tocar solo aqui em Cuiabá em nada tem a ver com o fim do Raimundos, não é?

“Não, pelo amor de Deus! Você está doido, eu sair do Raimundos?! O Raimundos é minha vida”.
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