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Quinta-feira, 28 de março de 2024

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Fotógrafa cuiabana retrata rotina de sua avó que sofre de demência em ensaio documental

Foto: Manu Rigoni

Dona Ermelinda, avó de Manu

Dona Ermelinda, avó de Manu

Observar o acordar, as refeições, os devaneios, o dia a dia de Ermelinda era o que a fotógrafa Manu Rigoni queria ao decidir fazer um ensaio documental de sua avó. Aos 95 anos, ela sofre de demência e já não reconhece quase ninguém, inclusive Manu, sua neta mais nova. Na última semana, ela passou oito dias com uma máquina fotográfica, retratando o que ela acredita ser o final de uma geração de sua família.

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Manu (foto à esquerda) é catarinense, mas vive em Cuiabá, e teve a ideia de fazer o ensaio documental durante um curso à distância que fez com Annie Leibovitz. “A Annie falou uma coisa, que fotografar nossa família, fazer documentário de quem a gente ama, é muito mais difícil do que fazer de alguém que você não conheça”. Ela decidiu aceitar o desafio.

“As lembranças que eu tenho de infância é a gente se reunindo. Ela tem árvores de nozes no sítio dela, são enormes, e desde que eu me conheço por gente as árvores existem, então a gente sempre fez almoço embaixo delas, sempre com ela presente, e essa foi uma forma de eu resgatar e manter a lembrança dela hoje aqui”, afirma “A gente tem fotos dela sorrindo, linda, guardadas, mas não é ela, Hoje ela não está vivendo isso”.

No primeiro dia em que chegou a casa de sua avó, no interior de Santa Catarina, ela não a reconheceu, e passou todo o tempo se escondendo e fugindo da neta. Depois disso, as coisas mudaram. “O segundo dia foi incrível, porque ela me viu numa fotografia, me reconheceu na fotografia, mas não me reconheceu do lado dela”.

Aos poucos, a fotógrafa foi redescobrindo quem era sua avó agora, e não mais quem era a avó de suas lembranças. “Eu tentei não interferir. Queria mostrar a rotina dela, como é... Porque além de tudo ela tem câncer de pele, e é um câncer bem agressivo, que já está nela há muitos anos, ela está com muita ferida, é bem complicado. (...) E uma vez isso incomodava ela, [mas] nestes dias que eu passei com ela fotografando, e eu fiz filmagem também, percebi que ela não está nem aí. Ela coça.... eu acho que ela não tem mais noção do que se tornou, ou não consegue comparar com como ela era antes”.

A ideia de Manu é fazer diversas viagens como esta, e acompanhar a vida de sua avó até o fim. Por isso, afirma que esta foi apenas a primeira parte de sua série documental. “Eu fui no verão, e eu quero voltar no inverno pra ver como as coisas funcionam no inverno, porque é bem diferente. No verão ela caminha pra caramba, ela não para, no inverno eu não sei se vai ser a mesma coisa, porque [lá] é muito frio”, afirma.

Só depois de tirar todas essas fotos é que ela pretende vê-las. Por enquanto, só selecionou duas. “Não é fácil você ver alguém que você ama tanto numa situação dessas. É um desafio e tanto você ver alguém que você conheceu muito saudável e agora está assim... e ao longo do tempo vai piorando. [Mas] com o tempo eu vou percebendo que não, eu estou fazendo isso não pra um dia mostrar isso pro mundo, não foi pensando nisso, mas foi pensando mais na memória da minha família”.

História

Manu Rigoni veio morar em Cuiabá em 2008, depois de fazer uma prova de transferência da faculdade onde estudava, em Comboriú. Formou-se em Rádio & TV pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), e por muito tempo a fotografia foi apenas um trabalho ‘a mais’, que ela fazia junto a outros, até que o tempo começou a ficar curto demais para duas atividades. “Começou a tomar todos os meus sábados, todo o tempo, eu não conseguia mais ter descanso, eu não parava mais. Então eu pensei não, vou fazer o que eu gosto mesmo, o que eu acredito que vai dar certo, que é a fotografia”, lembra.

No início, ela trabalhava somente fotografando eventos, como casamentos e aniversários, junto a um sócio. Em 2017, quando decidiu caminhar sozinha, começou a estudar mais sobre a fotografia documental, sua maior paixão. Em um dos cursos que fez, conheceu um brasileiro que trabalha com fotografia documental de família , e viu aí um nicho possível para ganhar dinheiro com este tipo de trabalho.

Sua primeira cliente foi também uma amiga, que queria documentar o crescimento do filho dos oito aos quinze anos. “Eu avisava que ia lá fotografar, e toda vez que eu avisava, chegava lá e ela estava toda maquiada. E eu falava: ‘não, não é isso que eu quero mostrar, eu quero mostrar seu relacionamento com ele, você não precisa estar bonita’.” Manu começou a chegar de surpresa, e aos poucos a amiga entendeu a proposta. O resultado são fotos da mãe ajudando o filho a fazer a tarefa de casa, os dois montando a árvore de natal, e outros aspectos da rotina.

A amiga e seu filho (Foto: Manu Rigoni)

Outro trabalho feito por ela foi a documentação do dia de aniversário de uma menina, de manhã até as oito horas da noite. “Criança é mais fácil, porque ela não está nem aí, você está lá e ela está brincando, não quer nem saber de você”, comenta a fotógrafa. Neste ensaio, um momento a surpreendeu. “Ia ter um evento na escola [dela] e eu fui junto, com o pai dela e ela. E ela falou: ‘Eu quero te mostrar uma brincadeira que ninguém sabe que eu gosto de fazer’. Então ela me levou lá no cantinho, e disse, ‘quando eu vou sair eu sempre saio por aqui, eu brinco disso...’. Então eu falo, poxa, que lembrança que ela vai ter um dia, quando ela crescer, daqui 30 anos? Ela vai ver essa foto e lembrar, ah, eu fazia isso na escola. É uma coisa real, e é isso que eu tento fazer com que as pessoas entendam.  Que a fotografia de verdade é uma fotografia muito mais bonita. Lógico, amo fazer ensaio, sou apaixonada, mas a fotografia documental é algo que eu quero, mesmo que seja pouco, quero sempre levar pras minhas fotografias”.

Foto do dia do aniversário (Foto: Manu Rigoni)

O dia da festa de 6 anos da Marina from Manu Rigoni on Vimeo.



O resultado de tanto esforço veio com o reconhecimento. No último dia 28 de fevereiro, Manu recebeu a notícia que tinha ficado em terceiro lugar na ‘Documentary Family Awards’, um concurso só de fotos documentais. Ela foi a única brasileira na lista das dez melhores fotografias de parto, com uma foto de um pai mostrando o filho, recém-nascido, pela janela da maternidade. Veja essa e as outras fotografias vencedoras AQUI.

Foto premiada pela DFA (Foto: Manu Rigoni)

Serviço

Para conhecer mais sobre o trabalho de Manu, acesse o instagram dela AQUI, e o das fotos documentais AQUI.

Informações e contato: SITE / (65) 9 8111-7079.
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