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Quinta-feira, 28 de março de 2024

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“Tem que ser cego, mudo e surdo”, diz garçom que há 36 anos serve gabinete da Prefeitura de Cuiabá

Foto: Rogério Florentino Pereira/Olhar Direto

“Tem que ser cego, mudo e surdo”, diz garçom que há 36 anos serve gabinete da Prefeitura de Cuiabá
Gustavo De Arruda, Anildo Lima Barros, Wilson Araújo, Dante de Oliveira, Estevão Torquato, Frederico Campos, José Meirelles, Roberto França, Wilson Santos, Chico Galindo, Mauro Mendes e Emanuel Pinheiro: estes doze homens tem mais de uma coisa em comum. Além de terem sido chefes do Poder Executivo em Cuiabá, todos foram servidos por Nivaldo Rosa, 59, um guiratinense que, há quase 37 anos, é garçom do gabinete do Prefeito na capital. O segredo para manter o emprego? “Tem que ser cego, mudo e surdo”.



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Nivaldo nasceu em Guiratinga (387km de Cuiabá), e veio para a capital aos nove anos de idade, com a família. Aos quinze, começou a trabalhar na construção civil com o irmão, que era mestre de obras. Aos dezenove, virou balconista da lanchonete Anaconda, na Avenida Barão de Melgaço, e desde então não saiu mais do ramo.

Um ano e oito meses depois, foi para a cantina do Palácio do Governo, mas, quando o contrato de licitação venceu, novamente ficou sem emprego.  “Eu estava parado, e um colega meu que trabalhava de garçom aqui [na Prefeitura] me chamou. Ele saiu em 86, passou a ser fiscal”, conta Nivaldo, que, ao contrário do colega, continua no posto até hoje.

Na foto, Nivaldo aos 23 anos; Segurando-a, Nivaldo hoje (Foto: Rogério Florentino / Olhar Direto)

Naquela época, a carga horária era de 30 horas, então ele aproveitou para trabalhar, também, como garçom no Governo do Estado, onde ficou por 20 anos, e serviu Dante de Oliveira, Blairo Maggi e Silval Barbosa.

Com tantos anos de trabalho, o garçom garante que nunca viu nem ouviu nada que o tenha assustado. “Eu não lembro”. Para além disso, confessa que é a confiança que o mantém no emprego até hoje. “Eles confiam em mim. Aqui você tem que ser cego, mudo e surdo. Entra num ouvido e sai no outro, você não escuta nada. Então as pessoas pegam confiança. Se ficar conversando muito, vai sair”. Não que não tentem ‘puxar sua língua’: “As pessoas perguntam: o que estão fazendo lá? Quem está lá? Eu falo: ‘Não sei, tem um pessoal aí’. Tem que ter jogo de cintura”.

A rotina do garçom é a mesma desde os 23 anos. Acorda por volta das 5h30 da manhã, sai às 6h30 de sua casa, no bairro João Bosco Pinheiro (ao lado do 1º de Março), e chega por volta de 7h30 na Prefeitura. Faz o café e passa o dia servindo os funcionários e as visitas. Nivaldo garante que não pode faltar água, café e guaraná ralado. Inclusive, ele mesmo inventou uma receita especial de guaraná, - servido com melaço de cana - mas só oferece para os mais próximos. “O melaço eu tenho que trazer da minha casa, a Prefeitura só compra açúcar. Então eu só sirvo pro Prefeito quando ele está sozinho, e outras pessoas”, brinca. Às 18h, o garçom sai do posto, pega o ônibus, e chega em casa por volta das 19h, onde encontra a esposa, que trabalha de doméstica.



Antigamente, além desta jornada, ele ainda fazia trabalhos de freelancer, como garçom e churrasqueiro em festas. “Ficava o dia inteiro aqui, e às vezes trabalhava sexta à noite. Chegava de madrugada, aí saía de manhã de novo pra servir almoço, e ia pra outra festa à noite. Naquele tempo tinha muita festa. Tinha vezes que ia até domingo no almoço, trabalhando direto”. Foi com esse esforço que criou os três filhos. Um deles seguiu os passos do pai e é garçom, outro é eletricista, e o outro é motorista. Nivaldo também tem sete netos.

A rotina exaustiva e a alimentação desregrada, no entanto, não deixaram barato para ele. Em 2009, descobriu que estava com as veias entupidas, e fez o procedimento de cateterismo seis vezes, antes de se render à ponte de safena. Na época, ficou seis meses sem trabalhar, e já não aguentava mais ficar em casa. “Me deu muita dor de cabeça”, lembra.

Voltou com tudo em 2010. Seis anos depois, se aposentou, mas colocou-se à disposição de Emanuel Pinheiro caso precisassem dele. “Ele disse que precisava. Porque eu conheço o Emanuel e a esposa dele há muito tempo, desde que ele era vereador”, conta. Nivaldo tornou-se funcionário de cargo comissionado e, pelo menos até o final do atual mandato, pretende continuar trabalhando. “Não tenho nada pra fazer em casa”.

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