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Sexta-feira, 29 de março de 2024

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Conserto Silva

Profissão remanescente: últimos costuradores de bola resistem no Centro de Cuiabá

Foto: Olhar Direto

Profissão remanescente: últimos costuradores de bola resistem no Centro de Cuiabá
As incontáveis malas e mochilas do Conserto Silva guardam uma das mais antigas profissões. Consertar bolsas e malas quase sempre está atrelado para o caminho de costurar bolas de futebol. Os irmãos José Gonçalves e Dejair da Silva Santos já fizeram a alegria de muito menino e garantiram a pelada de sexta-feira de tantos outros boleiros, em mais de 40 anos de serviço.



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No fundo do estabelecimento, atrás de um balcão e na máquina de costura, Dejair, de 67 anos conserta uma mochila jeans em silêncio. O único barulho do ambiente é a televisão ligada na “Sessão da Tarde” e da máquina a trabalhar. Sem tirar os olhos do zíper que está arrumando, ele conta que nunca trabalhou em nenhuma outra função, a não ser a de costurar o remendo das pessoas.

Ser costureiro ou sapateiro é um cargo de gerações. Ele aprendeu o ofício com o pai, aos 17. “Meu pai era o sapateiro da ‘Sapataria Trindade’, famosa sapataria da rua do meio (Rua Ricardo Franco), ai pelos anos 1970. No caso de costurar bola, porque a profissão que eu exerço hoje foi com o Baiano. Isso de costurar mala e bolsa é outra profissão. Baiano trabalhou junto com meu pai, na Trindade também, só que ele saiu e montou uma sapataria por conta, ai ele pediu permissão pro meu pai e ele deixou, e fui aprender a profissão com ele, que é essa aqui”, diz ainda segurando a mochila.
 

Seus filhos, entretanto, não se interessaram por sua função e seguiram outros caminhos. Dejair então continuou com as malas e aposentou as bolas, tocando o ofício pro irmão, José Gonçalves. “Eu fiquei mais no serviço burocrático. E também é muito difícil bola hoje em dia. São difíceis pra costurar, elas já vêm tudo ‘localizada’ (sem costura)”, conta Dejair. Hoje, José é o responsável pelos pedidos de bolas dos clientes.  “Eu não mexo mais com bola. Bola tem que ter paciência e eu não tenho mais”, e ri.

O futebol na vida do cuiabano de São Gonçalo Beira Rio não se resume apenas ao passado de remendar bolas. Ele, dom bosquino de tchape e cruz e santista de coração, já foi presidente do clube São Gonçalo Beira Rio nos anos 2000. Dejair deixou o clube quando os jogadores começaram a cobrar pra jogar amadoramente. “Era profissional nada, era boleiro aproveitador. Eu tinha o bar lá e tomava conta do time, aí parei”.

Assim como os clientes vão chegando de repente, José entra no recinto. Desde os 15 anos ele faz da costura de bolas seu ganha-pão, e conseguiu criar assim o casal de filhos, que hoje é um mecânico e uma contabilista.
 

Com duas agulhas, o trabalho manual e silencioso demanda pouco tempo, a depender da dificuldade. O torcedor do Operário e Flamengo leva cerca de 10 a 15 minutos para trocar uma câmara, e cobra de R$ 10 a R$ 15 para costurar. “Se pegar uma bola e não largar, é coisa de meia hora pra consertar. Mas isso para colar. Agora para trocar uma câmara, é até mais rápido. Tem a válvula também, que o pessoal vem pra trocar o bico”, explica. Para colar, ele cobra de R$ 30 a R$ 35.

Os pedidos que chegaram naquele breve período da tarde eram todos de bolsas. José conta que em uma semana boa, recebe de 5 a 6 bolas. Mas tem semana que não vem nenhuma. No início, ele recebia tantas encomendas, que tinha que levá-las pra casa, para costurar enquanto assistia ao jogo de domingo – e seu filho observava o trabalho, aprendendo também o ofício.

Já passaram pelas mãos do costureiro bolas de futebol de crianças que jogam na rua a profissionais, como do Operário e Mixto. A Olímpica Esportes, sempre que recebe um produto com defeito de fábrica, também leva pra eles, assim como alunos de Educação Física da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e da Prefeitura.

Ele estima que o movimento caiu cerca de 50%. Isso se deve muito provavelmente pelo modo como a fabricação das bolas mudou. “Tem muitas bolas hoje que são descartáveis, não tem conserto. Ou a pessoa compra uma bola boa, ou compra aquelas descartáveis. Tem muitas bolas boas, de primeira, que não tem conserto, porque não tem costura. Então é difícil, mas ainda tem muitas bolas para consertar, e a gente conserta né?”.

Serviço

Endereço:
Rua Campo Grande, nº 84 - Centro
Horário: comercial do Centro
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