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no fim, somos todos humanos

Dia da Mulher: o consumo, o machismo velado e a objetificação da sexualidade feminina

08 Mar 2014 - 16:10

Especial para o Olhar Conceito - Nina Moon

Foto: Reprodução

Mulheres em luta em 1917

Mulheres em luta em 1917

E então, chegou o Dia Internacional das Mulheres, 8 de março. E as campanhas para homenagear acabaram saindo como um tiro pela culatra com efeito negativo, pois, muitas foram consideradas de cunho machista. E deste oceano de opiniões e divergências que é feito a Internet, surgiram defensores, acusadores, e aqueles que relegam as datas comemorativas das minorias como atrativo comercial para impulsionar as vendas, e outros que justificam que o motivo por trás das datas deve ser o principal: uma reflexão sobre como tratamos o outro, que é diferente de nós. Este assunto envolve muitas polêmicas e tentaremos perpassar por algumas delas.

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Temos Dia da Mulher, Dia da Consciência Negra, Dia do Índio, as minorias são ressaltadas nos calendários para não nos deixar esquecer que houve manchas na história da humanidade com aquilo que é diferente. E vale lembrar que o padrão e o normal é: ‘homem, heterossexual, caucasiano’. Exclui-se ai: homossexuais, mulheres, crianças, idosos, negros, índios, orientais. Afinal, quem é a maioria? Eu não vejo dia do homem branco. Deve ser porque eles são os responsáveis pela dominação dos outros povos e subjugação dos mesmos, e por isso não devem ser lembrados?

Mas, estamos sendo preconceituosos, porque generalizar é sempre um erro. Brancos, negros, amarelos, com boceta ou pinto, todas as pessoas são singulares e possuem histórias que devem ser contadas. Porém, o que precisamos ter em mente é o respeito. Afinal, vivemos em um mundo que as pessoas já se sentem cansadas: quem sempre lutou, desiste e quem nunca lutou, sequer pretende começar. E de todas as opiniões divergentes, o que mais chocou é ver que as próprias mulheres ajudam a perpetuar estes estereótipos formados por uma sociedade preconceituosa, que apenas repassa comportamentos influenciados pela mídia, sequer sem pensar duas vezes como isso pode afetar a sua vida.

Propagandas de cerveja retratam mulher como objeto de consumo 


E a mídia retrata a mulher assim: um objeto sexual. Enquanto muitas criticavam as campanhas tendenciosas que ressaltavam lados considerados supérfluos sobre o que é ser mulher, outros surgiam com as vozes sobre a exposição da mulher na mídia. “Gosta de putaria no carnaval, mas quando faz campanha com cunho humorístico, ficam revoltadas”. Sim, muitos gostam de pular o carnaval: brancos, negros, amarelos, com bocetas e pintos. Mas, é a globeleza nua na televisão, é a mulher gostosa sendo dividida no anúncio de cerveja, é a mulher linda que só pode ser linda e poderosa se consumir todos os produtos que a mídia propõe.

Para ser linda é preciso ser magra, malhada, definida, com silicone nos seios, sorriso perfeito, bocão, bótox, cirurgias plásticas, pouco cérebro e muita bunda. E claro, existem muitas mulheres que se contentam em ser apenas o corpo e nunca a mente. Mas, existe o outro lado. Do mesmo jeito que acontece com os brancos, negros, amarelos e com um pinto entre as pernas. Os homens também têm que ser musculosos, viris, protetores, homens de família, responsáveis, chefes, que ganham bem e desfilam em seus carros esportes para pegar as mulheres que saem desfilando com seus silicones e batons borrados.

Somos uma sociedade de espelhos, mas o nosso reflexo é vazio. É porque nos preocupamos mais com a venda do nosso sexo, do que com o que ocorre ao nosso redor e dentro de nós. Nos preocupamos com o sexo, porque ele é o objetivo final de tudo isso: do consumo, da propaganda, da homenagem, da venda, da suposta igualdade entre os gêneros, as raças, os credos. O sexo é o objetivo final de tudo porque ele é a nossa missão enquanto animais: reprodução e perpetuação da espécie. Não adianta negar. Seu corpo não nega.

E não se engane em achar que não. O filme Histeria é apenas mais um exemplo disso, as mulheres eram diagnosticadas com a ‘doença’ no século XIX e o tratamento: masturbação por parte do médico na paciente. Cansado do ‘serviço’, um jovem médico decidiu ir além e criou o vibrador. Será que a histeria das mulheres não vem acompanhada da falta de conhecimento do próprio corpo? Do tabu existente sobre o órgão sexual feminino e as mulheres que sentem vergonha de explorar seu próprio corpo, porque tudo isso é até hoje, reprimido pela sociedade? Enfim, passamos da repressão total do sexo da mulher à exploração da sua imagem sexual, sem que as mulheres possam ter passado pelo autoconhecimento do corpo, uma depreciação enquanto pessoa que precisa da plenitude para o bem estar.

Filme Histeria


O filme Ninfomaníaca de Lars von Trier também causou ‘histeria’ coletiva no cinema em Cuiabá, enquanto homens e mulheres davam gargalhada pelo estranhamento causado com o corpo exposto de forma tão crua, com o sexo sendo retratado de forma tão natural e animalesca (como é), eu me questionava: “isso não é comédia, é um drama que aborda mais um tabu, o sexo”. E esta reação coletiva se chama vergonha, porque nos acostumamos a dizer que mulher que fala ou conhece sobre sexo é ‘piriguete, vagabunda’ e quantos outros adjetivos, e depois, os homens reclamam da histeria de suas mulheres, por não entender o corpo delas (e nem o deles). E a histeria revelou sobre os homens, nas cenas de sexo, as risadinhas abafadas nos diziam mais sobre a sociedade do que sobre o filme que é artístico.

Filme Ninfomaníaca


O 8 de março deveria ser lembrado pelo que realmente foi, a resistências das mulheres contra o regime russo em 1917, contra as condições de trabalho e abusos. As datas são a resistência destes povos, que são considerados minorias. E esta ‘histeria’ coletiva como alguns querem denominar sobre certas ‘homenagens’ no Dia da Mulher apenas revelam que não superamos os episódios do passado. Ainda continuamos preconceituosos e machistas. Até as mulheres são machistas. Vivemos um tempo que todos querem externar as suas dores e revoltas pelas redes sociais, mas, devemos nos ater a voz que vem de dentro e te diz o que é errado ou não.

Ninguém precisou dizer que ficou ofendido para eu antes, me ofender. Ninguém precisou dizer que vivemos em um mundo que está às avessas, para eu poder entender toda a revolta que se instalou diante da data. Não queremos presentes, mimos e flores. Queremos a tão almejada igualdade, e que nos não diferenciem mais como o ‘sexo frágil’, mas, que aprendam a nos enxergar, como parte do princípio da vida e da humanidade. Não podemos mais aceitar ser tratadas como um produto de mercado, dispostas em qualquer prateleira prontas para o consumo, e ainda, submetidas a avaliação e depreciação por aqueles que nos consomem.

Mas, enquanto reforçarmos estes estereótipos, enquanto a mulher for retratada como um mero corpo para reprodução e de preferência sem neurônios, enquanto o negro for retratado como o empregado, motorista, favelado, e enquanto o índio for retratado como o estranho, desajustado e ladrão de terras, estaremos dando voltas na nossa própria hipocrisia, porque nos esquecemos do que é mais importante: somos todos seres humanos.


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