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Quinta-feira, 28 de março de 2024

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em busca da poesia

Jornalista e escritora defende tese para livro reportagem sobre "Os Outros" que habitam Manoel de Barros

Foto: Reprodução

Máquina de escrever de Manoel de Barros

Máquina de escrever de Manoel de Barros

Ela quer desbravar Manoel de Barros e destrinchar os inúmeros outros que existem dentro do poeta e escritor mato-grossense que agora reside em Campo Grande. Para realizar esta caminhada rumo ao encontro do que representa tantos outros dentro de um gigante da literatura, ela caminhou de Mato Grosso do Sul até o Rio de Janeiro e conheceu aqueles que o cercam em vida. Com a veia literária latente, a jornalista e escritora cuiabana (que por sinal nos brinda com seus textos como repórter do Olhar Conceito), Stéfanie Medeiros, defende a sua dissertação de conclusão de curso de jornalismo na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) nesta segunda-feira (24) às 11h e que será publicado posteriormente em um livro reportagem. A tese "Os outros - o livro reportagem como plataforma para a construção do perfil de Manoel de Barros" foi orientada pelo professor ms. Ailton Segura.

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Stéfanie tem grandes olhos questionadores e curiosos que entregam a sua vontade de discorrer sobre o mundo com as suas experiências particulares. A escolha por Manoel de Barros aconteceu com o seu primeiro encontro com o escritor, quando em um momento difícil encontrou alento nas palavras do poeta, que a fez abrir estes olhos curiosos para um mundo novo de possibilidades. Era o encantamento com a poesia que fez florescer uma relação entre leitora e escritor. A inspiração para desbravar esses outros surgiu do poema "A maior riqueza do homem" (na íntegra ao final da matéria).

Manoel de Barros quando jovem
Mesmo sem conhecer Manoel, Stéfanie já se colocava a criar em sua imaginação, como viveria o escritor, como era o seu ambiente particular. Afinal, precisava entender tudo isso para conseguir decifrar um pouco deste talento literário que a presenteou com diversos poemas, mas elenca o seu preferido como o poema de Bernardo, com sua inocência e naturalidade, com pássaros que pousam em seu ombro.

Sua relação com o Pantanal foi entendida melhor pela jovem estudante quando pelo Olhar Conceito foi desbravar a terra que originou muitos poemas daquele descobridor, e pode vivenciar a calmaria, a natureza, o voar sincronizado dos pássaros, o tempo que corre devagar, o rio que leva consigo a vida. O encantamento estava concretizado. O Manoel de Barros, o Pantanal, a simplicidade da poesia colorida que ganhava seus dias. Pronto. Não havia retorno.

Era preciso destrinchar esta relação, este afeto que encontrou em palavras até então desconhecidas, mas que revelaram o mundo. Com muita coragem e determinação, começou de forma sensível a abordar o artista. Como chegar até Manoel de Barros? Como conseguir uma entrevista? O escritor está com 97 anos e com a saúde comprometida. Não seria fácil.

Com as letras a borbulharem em sua mente, decidiu que a abordagem seria pelo caminho comum aos dois: a escrita. E foi através de cartas enviadas no decorrer de um ano, que Stéfanie tentou se aproximar de Manoel de Barros. Enviou pedaços do que é, do que faz e o que a motivou a querer conhecer mais sobre os outros que habitam o escritor. Entregou seu coração nas folhas de papel que enviou e esperou por uma resposta que nunca chegou.

Tentou o telefone. Ouviu a voz de Manoel de Barros no fundo a orientar a esposa para dizer que a jornalista procurasse um tal de João Balão, que por coincidência do destino foi padrinho de casamento dos tios de Stéfanie.

O empurrão foi o passo necessário para ir de encontro a este caminho. Com um primeiro contato feito, agora era preciso caminhar em busca destes retalhos de Manoel, como a escritora revela, e assim realizou entrevistas com Martha Barros no Rio de Janeiro, com o irmão de Manoel, Abílio Leite de Barros e o amigo de longa data e jornalista Pedro Spíndola em Campo Grande.

Manoel de Barros e o amigo Pedro Spíndola


Foram muitos percalços para conseguir retratar um pouco destes tantos outros que habitam no escritor. A filha Martha Barros tentou dissuadir a jornalista a prosseguir com seu caminho, dizendo que não era importante: a obra de Manoel era maior do que o escritor. Mas, com a teimosia inerente de todo bom jornalista e escritor, prosseguiu com afinco em sua pesquisa e recebeu informações preciosas de Spíndola que cedeu um acervo rico do poeta, com anotações, diários, publicações, entre outras coisas.

O Manoel de Barros, não chegou a conhecer, apesar de contemplar a sua casa de fora em Campo Grande, como parte de uma história que não pode vivenciar. Agora, este retalho está formado em livro reportagem à exemplo do que Gay Talese fez no perfil de Frank Sinatra, que não chegou a ser entrevistado, apenas descrito pelos outros que o acompanharam em vida.

A jornalista Stéfanie Medeiros durante suas desventuras pelo Pantanal de Manoel de Barros

 

A defesa da dissertação “Os outros - o livro reportagem como plataforma para a construção do perfil de Manoel de Barros” irá resultar na conclusão do livro reportagem, que Stéfanie estuda meios para a publicação. O acervo cedido por Pedro Spíndola será devolvido no primeiro semestre deste ano, porém, a jornalista realiza um trabalho de digitalização para tentar parceria para expor todo este conteúdo digitalmente.

Os seus caminhos a fizeram encontrar o Manoel do papel, o da sua imaginação, e um olhar por dentro da fechadura de sua vida para desbravar o que é e foi real em sua vida de escritor e poeta. O resultado? Logo será conhecido do público quando o livro for publicado e revelar mais dos Outros Manóeis que habitam no poeta e em todos os seus leitores. Mesmo não conhecendo em carne e osso, toda a experiência a fez se aproximar como se fossem velhos conhecidos, a dividir silêncios, um café e poemas sobre as desimportâncias da vida, na cadeira de balanço a contemplar passarinhos e árvores, no caminhar preguiçoso dos dias tranquilos e pantaneiros.

Cercada pelos livros e universo literário, jornalista mergulhou na poética de Manoel


A maior riqueza do homem
é a sua incompletude.
Nesse ponto sou abastado.
Palavras que me aceitam como sou - eu não aceito.

Não agüento ser apenas um sujeito que abre portas,
que puxa válvulas, que olha o relógio,
que compra pão às 6 horas da tarde,
que vai lá fora, que aponta lápis,
que vê a uva etc. etc.

Perdoai
Mas eu preciso ser Outros.
Eu penso renovar o homem usando


“A maior riqueza do homem”, do livro “O retrato do artista quando coisa” (1998).
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