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Quinta-feira, 28 de março de 2024

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Uma figura folclórica a caminhar por Cuiabá, mulher da vida e de calças, assim foi Maria Taquara

Foto: JB Conrado

Uma figura folclórica a caminhar por Cuiabá, mulher da vida e de calças, assim foi Maria Taquara
Ela descia a rua com uma trouxa de roupa na cabeça. Todos os dias. Uma eterna rotina de uma mulher pobre e humilde, mas, trabalhadora. O ano é 1940. E ela até hoje povoa o imaginário cuiabano. Pode-se dizer que se tornou uma lenda. A transgressora da moral e dos bons costumes, a primeira mulher a usar calças em Cuiabá. Historiadores dizem que ela sempre esteve à frente do seu tempo. Seu paradeiro é desconhecido, a sua origem também. O que paira sobre ela são as névoas das fábulas que se criaram para perpetuar este ícone cuiabano. Seu nome é Maria. Sobrenome não se sabe. Apenas que por aqui, a chamavam de Taquara.

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Maria Taquara. Assim conhecida pelo corpo esguio e magro. Figura folclórica de Cuiabá. A imagem que muitos possuem dela é exatamente o de lavadeira, descendo até o Córrego Mané Pinto com as trouxas de roupas dos clientes ricos na cabeça. Uma mulher humilde. Mas o que se sabe de Taquara não para por aí. Foi motivo de prisão para muitos soldados, que pulavam o muro do quartel, para se encontrarem com a esguia mulher em seu barracão. Dizem que Maria Taquara era mulher de calças e mulher da vida.

Aníbal Alencastro, historiador, rememora que conheceu Maria Taquara. Ao servir no exército em 1962 em Cuiabá, é ele quem narra as peripécias dos soldados que procuravam calor nos braços de Maria Taquara. “Durante a vigília da noite, os soldados deixavam seus postos e pulavam os muros para se encontrarem com ela, cujo barracão ficava ao lado do quartel. Depois,o sargento passava e olhava para os fuzis deixados do lado do muro e com isso, vários homens eram presos pelo abandono de posto. Tudo pela Maria Taquara”, contou.



O historiador adianta que ela não era uma mulher bonita, mas que possuía um semblante sério. Ninguém mexia com Maria Taquara, que perambulava pelos bares da cidade bebendo sua pinga. Era uma figura que fazia parte da paisagem urbana de Cuiabá. “Com certeza se tornou um dos personagens folclóricos que a cidade tem. Lembro dela descendo com a mala de roupas na cabeça e o cigarro de palha na boca”, disse.

Maria Taquara não tinha vaidade e não se importava com o que diziam dela, tanto que os olhares tortos para uma mulher de calças tão pouco a incomodaram. Talvez não haja uma explicação concreta para que a memória desta mulher negra e magra com uma trouxa de roupas na cabeça seja tão lembrada em Cuiabá. Na verdade, muitos que passam em um dos pontos de ônibus mais movimentados da cidade, não se dão conta do folclore que emerge ao citar o nome de Maria Taquara, que agora se consolidou em estátua, para nunca deixar a memória do ir e vir do seu labor diário.

A professora de semiótica, Marília Beatriz Figueiredo Leite analisa um pouco desta figura folclórica e gosta de comentar que Cuiabá é uma das poucas cidades em que se ergueu uma estátua para uma prostituta. “Haveria tanto interesse na figura de Maria Taquara se não houvesse o monumento e de que imagem de mulher se trata sob o signo indicial”, questiona.

Para Marília, a questão da imagem da mulher sob o signo indicial é de que se trata de um ‘non-sense’ próprio de uma sociedade que tem vocação para liberdades. “É uma leitura entremeada de verdades e mentiras, posto que um ler a partir de um sentir capturante. O texto/imagem Maria Taquara aprisiona uma narrativa de olhar, uma cadeia aprisionada por fascinações dos que passam pelo local em que esta situada a imagem memória”, explica sobre o monumento deTaquara.



Mas, a professora vai além e explica que o texto pode ser entendido como uma montagem cênica de personagem, como um jogo de xadrez social. “Um jogo que se realiza executando as várias combinações no tabuleiro da leitura social! Quanto à primeira pergunta acredito que todo registro visa à fixação das várias possibilidades que o material visual recorta e marca. Neste caso Maria Taquara aborda um aspecto lúdico da sociedade cuiabana e também aponta a relação conflitiva que assinala a junção do sujeito com o mundo circundante. O local do monumento é, pois, onde o sentido daquela mulher precisa ser visto e entendido como uma face ex/ótica dos pedaços diurnos e noturnos da entidade MARIA...”, argumentou.

O símbolo e o signo estão fixados em uma estátua de aço na Praça Maria Taquara. E mesmo que milhares de pessoas passem por ela, que ainda segura a trouxa de roupas na cabeça, e que não conhecem sua história, destino, caminhos, nem imaginam, que desta figura folclórica que povoou a mente de soldados se fez até música. E mesmo que ninguém saiba quem era a mulher negra e magra que perambulava por Cuiabá, ela se fará presente, com seu semblante frio e de aço, a olhar para o futuro estando sempre no passado.

Um dia Maria Taquara veio ao chão em meio a chuva e ao vento, mas não tardou a voltar a nos olhar


"Maria Taquara, Maria meu bem.

Mulher de todos, que não é de ninguém.

Taquara de dia, de noite meu bem,

Maria Taquara, não é de ninguém.

Muié de sordado, de meganha também.

De dia Maria, de noite meu bem.

Maria é Cuiabá, Cuiabá é Maria

Não importa se é noite, não importa se é dia.

Maria é Taquara,

Taquara é Maria,

Avançada no tempo,

Mulher fantasia”.


Música de Moisés Martins
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