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Domingo, 28 de abril de 2024

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Poeta aos 21: terceiro livro de Matheus Jacob já vai para segunda edição

Foto: Stéfanie Medeiros

A concha é uma das metáfora mais importantes para Matheus. Para o jovem, a concha representa o poeta: pequena, frágil, mas de onde é possível ouvir o mar inteiro.

A concha é uma das metáfora mais importantes para Matheus. Para o jovem, a concha representa o poeta: pequena, frágil, mas de onde é possível ouvir o mar inteiro.

Algumas crianças têm privilégios. Mas em 2001, uma geração inteira, ainda em fase de alfabetização, foi contemplada com um livro que mudou muita coisa. Uma destas principais alterações foi o fato de que o amor pela leitura veio naturalmente, sem gritos, chinelos ou pais jovens arrancando os cabelos brancos. Não, esta geração queria ler. E mais que isso: gostava do que lia.

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Matheus Jacob Barreto é um dos filhos da geração Harry Potter. Mas agora, ao invés de mero consumidor de trabalhos literários, tornou-se produtor. Aos 21 anos, publicou seu terceiro livro de poesias pela editora Scortecci. Na orelha do livro “É”, o mais recente, esta escrito:

Matheus Jacob Barreto (1992) nasceu na cidade de Cuiabá, MT. Foi um dos 50 vencedores da competição nacional “III Prêmio Literário Canon de Poesia 2010” e teve seu poema vencedor publicado na antologia de mesmo nome, publicado pela Scortecci Editora em 2011. Em outubro do mesmo ano, lançou seu primeiro livro de poemas, “O Cancioneiro dos ventos”, e em 2012 lançou “De volta para o mundo” na Bienal Internacional do Livro de São Paulo. Estuda na Universidade de São Paulo e mora na capital Paulista.

Mas uma conversa um pouco mais atenta com Matheus, percebemos que este currículo recheado de alguém com tão pouca idade ganha um tom despretensioso, reflexos de um jovem experimentalista que encontrou a calma que precisa para chegar aonde quer.

De férias do curso de letras, habilitação em alemão, da USP, Matheus volta para a casa dos pais no Jardim das Américas, em Cuiabá. Depois de ler e navegar pelo youtube, Matheus prepara um café ao modo antigo: Deixa a sala fresca e vai para a cozinha esquentar a água. Em pé, começa a digressionar sobre seus primeiros livros.

Em um lapso de empolgação pelo prêmio vencido em 2010, publicou o “Cancioneiro dos ventos”, mas em pé na cozinha, quase quatro anos depois, reflete que não devia ter feito isto. As poesias desta primeira publicação são extremamente técnicas, todas na forma de soneto, mas falta aquele fio tênue que abre o diálogo entre o poema e o leitor.

“De volta para o mundo” já tem uma estética mais livre, com poemas soltos e sem forma definida. Mas ainda assim é preso em si mesmo. E este é o mérito de “É”, composto de três parte e pouco mais de 200 poemas. Matheus soube que desta vez tinha feito algo acessível ao leitor, tanto ao versado em poesia, como ao que nunca leu um verso. Um de seus colegas lhe contou que atravessou as 242 páginas de “É” em uma madrugada e que suava ao ler os poemas.



Por isto, Matheus considera “É” o seu primeiro livro. Coando o café e o colocando em um pires de vidro, senta em um dos bancos na mesa da cozinha, refletindo que a técnica usada em “É”. O ritmo dos poemas transmite sensações aos leitores, pensa em voz alta. Os leitores acham que primeiro vem o poema, depois o ritmo. Mas na verdade, primeiro vem o ritmo e os versos se formam de acordo com a cadência de sons que ecoa na mente.

E isto, para Matheus, pode acontecer em qualquer lugar. No ponto de ônibus, na faculdade, em uma festa, de madrugada, na fila do pão. Por isto sempre tem uma caderneta junto a si. “Posso estar sem roupa, mas sempre tenho uma caderneta comigo. Sempre”, diz, enchendo as xícaras até a boca de café. “Está muito? É que eu sempre tomo muito assim mesmo”. Já passava das cinco da tarde quando Matheus tomou um gole da sua xícara transbordando de cafeína.

O hábito de escrever poesia veio na adolescência, enquanto ainda era estudante do Colégio Maxi, em Cuiabá. Nas aulas de literatura, a primeira pessoa adulta que viu seus poemas e o incentivou a seguir com a escrita foi a professora Ana Helena. O primeiro poema ritmado veio com a leitura em voz alta de I-Juca Pirama, de Gonçalves Dias, em uma destas aulas.

Naquela tarde, Matheus ficou com o ritmo de Pirama na cabeça. Pegou uma caderneta e escreveu o primeiro poema marcante em suas lembranças, que mais tarde percebeu, tinha o mesmo ritmo do épico de Dias.

Mas antes mesmo de pensar em escrever poesia, já rascunhava histórias para os amigos. Esta era a diversão que criou para si e os colegas aos 10 anos de idade. Por isto, considera a literatura infanto-juvenil a mais importante que podemos ter e fazer. Ao começar, junto com crianças do mundo todo, a ler Harry Potter, adquiriu o gosto pela leitura.

No entanto, por ser uma série com sete livros, aquele gosto pela leitura não foi algo passageiro. De Harry Potter, passou para outras séries, até chegar aos clássicos. “Cada livro tem a idade certa, e isso é algo pessoal, para ser lido”. Matheus é enfático ao recomendar que as pessoas não estraguem sua leitura por obrigação.

Na adolescência, queria, por vaidade, ler a “Divina Comédia”. Não passou das primeiras páginas e desistiu. Mais tarde, um pouco mais maduro, pegou o livro para tentar mais uma vez. E se arrepia ao lembrar da leitura, que considera a melhor que já fez até agora. “Se eu tivesse insistido naquela época, talvez ainda tivesse a imagem de um livro chato e difícil de entender. Quando as pessoas são obrigadas a ler algo, podem estar perdendo a oportunidade de ler um grande livro por causa de uma prova. Pega um resumo na internet, mas não estrague a leitura do que pode vir a ser um grande livro”, disse, bebericando o café e comendo um biscoito doce.

Lembrando de como os livros certos foram essenciais na sua infância, Matheus já idealiza projetos voltados para o público em fase de alfabetização. Pensa em fazer um livro nos moldes de “Ou isto ou aquilo”, de Cecília Meireles. Mas por enquanto, a atenção volta para os 13 cadernos de rascunho que tem de organizar enquanto está de férias.

A vida agitada em São Paulo traz a inspiração necessária para abordar temas extremamente humanos, as delicadezas do cotidiano e a grandiosidade das coisas pequenas. É sobre isto que os poemas do livro “É” tratam. Mas dos três anos que passou na capital paulista, nos momentos em que voltava para passar as férias com os pais, percebeu uma Cuiabá diferente.

Na verdade, notou uma Cuiabá renascendo das cinzas. Esta geração de crianças contempladas com o amor pela leitura logo cedo está fazendo coisas, fomentando o cenário cultural de uma capital que é considerada culturalmente estagnada. Os amigos de Matheus estão, como ele, escrevendo, dando nova cara à moda, cantando, tocando, fazendo filmes. Uma nova geração de artistas toma as rédeas do cenário cultural da capital mato-grossense, imprimindo nela suas características peculiares e únicas.

Ao pensar nisso, o olhar de Matheus ganhou um novo brilho. Era o reflexo da excitação de fazer parte de uma nova era. Pensou na geração Harry Potter, em literatura infanto-juvenil, no desespero inocente de se tornar um leitor importante quando pegou a “Divina comédia” na adolescência. E, tomando o último gole da segunda xícara de café, pensou no que os seus dois primeiros livros poderiam ter sido e no que o terceiro “É”.

Serviço:

O livro "É" pode ser adquirido na Livraria Cultura ou no site oficial da Editora Scortecci.
Para acompanhar o trabalho de Matheus, acesse o blog do poeta clicando aqui.

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