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Sexta-feira, 26 de abril de 2024

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sem deixar a orquestra

Buscando novos caminhos, Fabrício Carvalho promove discussão sobre a Lei Kandir e pleiteia vaga no Senado

Foto: Rogério Florentino Pereira / Olhar Direto

Fabrício Carvalho em entrevista no Olhar Direto

Fabrício Carvalho em entrevista no Olhar Direto

Com trinta anos dedicados à música – vinte deles à frente da Orquestra Sinfônica da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) – Fabrício Carvalho quer mais. Aos 41, acredita que pode conversar e lutar por diversas outras causas sem, é claro, deixar a cultura de lado. Um caminho para isso seria se candidatar ao senado, mas isso para ele é detalhe. No próximo dia 19 de maio, ele organiza na UFMT um debate intitulado ‘Lei Kandir: Hora da Mudança?’, para discutir a tributação das commodities.

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Nascido em São Paulo, o maestro veio para Cuiabá aos dez anos de idade, quando seu pai, engenheiro, saiu da capital já ‘saturada’ para descobrir o novo Brasil e construir silos para armazenar os produtos do agronegócio. Chegando aqui, já começou seus estudos na Escola de música da Orquestra da UFMT.

Aos dezessete, passou no vestibular e começou a estudar para ser engenheiro, mas não se encontrou: “Cheguei a ser aluno por quatro anos de engenharia, mas fui um péssimo aluno, um cara totalmente fora, porque é uma área muito técnica, muito racional, e eu sempre gostei de ouvir, falar, dialogar sobre assuntos um pouco mais macros. Nada contra engenharia, tenho grandes amigos, mas eu era um aluno não muito profissional”, conta.

Quatro anos depois, contra a vontade de toda a família, abandonou o curso e foi estudar regência no Conservatório Brasileiro de Música, escola ligada à Universidade Federal do Rio de Janeiro. Assim que terminou, voltou para Mato Grosso e assumiu a regência da Orquestra, aos 22 anos.

“Ser maestro no Brasil é igual ser astronauta, é lindo, fantástico, maravilhoso, mas não tem emprego. Você não tem uma nave te esperando. Então você tem que formar sua Orquestra, criar uma estética, e então nesse sentido eu dei muita sorte. Eu tava no lugar certo, na hora certa”, afirma. Como um dos mais novos maestros do Brasil, o garoto teve que se adaptar, por meio do convencimento, ‘ganhar’ os músicos. E foi ficando. Há oito anos, assumiu também a Pró-Reitoria de Cultura, Esporte e Lazer da Universidade.


Maestro Fabrício Carvalho à frente da Orquestra da UFMT (Foto: Luzo Reis)

Dentro da UFMT, além de investir no crescimento da Orquestra, Fabrício trabalhou com extensão e com a integração dos estudantes. “Eu trabalhei nesses anos com muita gente bacana, tive a chance de ser coordenador nacional de um Fórum de pró-reitores que justamente ligava à Universidade com a sociedade, principalmente àqueles alunos que mais tinham necessidades sócio-econômicas”, conta. A experiência com esta realidade fez com que uma pulguinha pulasse atrás de sua orelha. A indignação com a péssima distribuição de renda em Mato Grosso.

A Lei Kandir


A famosa ‘Lei Kandir’, instituída em 1996, pressupõe a isenção de imposto sobre as commodities que serão exportadas. Para Fabrício, ela foi importantíssima quando foi criada, mas é necessário uma ‘rediscussão sobre o assunto. “Nos últimos 20 anos, você tem a vinda pra cá de uma leva de produtores do agronegócio que foram fundamentais para o desenvolvimento de Mato Grosso. Que vieram do Sul plantar, sem muitas posses, acreditaram em Mato Grosso e hoje têm um trabalho muito importante, que ajudaram e ajudam fortemente no desenvolvimento, que mantém o saldo da balança comercial, inclusive o PIB brasileiro, fortemente, e ótimo, ninguém tira esse mérito. Porém, essa isenção traz pro estado algumas questões que precisam ser discutidas e a UFMT vai discutir isso. Não seria a hora de a gente permitir que esses grandes produtores do agronegócio, que estão bilionários hoje, são cinco famílias bilionárias em Mato Grosso, não pudessem participar nesse momento de crise, em que o estado tem muita dificuldade no seu saldo, até em pagamento de salário, não seria hora de discutir um olhar do agronegócio para o estado? Por exemplo, trabalhando o ICMS sobre a soja exportada?”, questiona.

Como para ele não existem ‘achismos’, a proposta do próximo dia 19 é unir todos os setores responsáveis e afetados, junto a economistas e estudantes, e propor um estudo profundo sobre a realidade do agronegócio em Mato Grosso. “Se no debate chegar-se à conclusão de que a gente tem que fazer uma pesquisa pra entender essa lógica da Lei Kandir, se ela precisa de mais um tempo ainda pra equalizar, ou não, ou se já está na hora de taxar as commodities exportadas de Mato Grosso em função de uma mudança desse cenário”, afirma, “Quem vai dizer isso é uma pesquisa muito séria”. Para isso, foram convidados para o debate a Aprosoja, a Ampla, o Imea e o Governo de Mato Grosso, coordenados pela Faculdade de Economia.

Para além do debate, Fabrício tem se encontrado frequentemente com os secretários do governo Taques, e discutido questões como o novo FETAB (Fundo Estadual de Transporte e Habitação) e a construção de novos teatros e espaços culturais no estado. “Está em estudo agora o novo FETHAB, esse imposto importante que basicamente taxa o combustível que gira nas estradas e taxa a commoditie transportada. Esse combustível, essa commoditie é dividida com as prefeituras. A taxa da commoditie do FETAB é só do estado. A proposta é dobrar a taxação sobre este modelo da commoditie”, explica. “Somando isso, a capacidade de arrecadação do estado aumenta em 5.4 bilhões nos próximos sete anos. Dá pra você pavimentar algo em torno de quatro mil quilômetros de estradas nos próximos sete anos, isso é fundamental. Porém essa taxação é só pra estradas. Óbvio, desafogando o caixa do estado, que hoje tem que investir em estradas, você criando dinheiro novo, sobra pra outras coisas”. E para essas ‘outras coisas’, ele pensa – além dos teatros e circuitos culturais – em mandar dinheiro para a educação, saúde e segurança pública.

Com todas essas ideias políticas borbulhando na cabeça, Fabrício pensa em se candidatar ao senado em 2018. Ainda não tem partido, mas tem muitos convites e, segundo ele, muitos amigos que tem a mesma linha de pensamento. “Porque no senado você fala pra República. No senado você fala pra todos”, justifica. Apesar da vontade, ele sabe que suas ideias não são as mais ‘atrativas’ para voto. “Eu não tenho outra estratégia. Eu não tenho outro caminho. Meu caminho é do diálogo, é do convencimento, é da estratégia, é de mostrar dados, de pesquisar. Eu não vou convencer, certamente, a turma do agronegócio – fundamental pro país, de novo – que eles precisam cobrar. Eles precisam se convencer. E são pessoas inteligentes”.

A ideia de Fabrício é não desanimar. Não desanimar com a Sinfônica, com os novos projetos, e muito menos com os sonhos. Traçando novos caminhos, ele traz de volta o garoto de 22 anos que assumia uma Orquestra com medo, mas com certeza de sua capacidade. “Aos 41 anos ou a gente se reinventa ou a gente continua no mais do mesmo. E eu quero tentar uma reinvenção”, finaliza.
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