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Quarta-feira, 17 de abril de 2024

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Holding: Blindagem ou Planejamento Patrimonial?

Desmistificando o conto sobre a HOLDING: Blindagem ou Planejamento Patrimonial?

Há algum tempo tenho trabalhado com o Direito Empresarial e ministrado cursos sobre Holding com enfoque no Planejamento Patrimonial, Reorganização e Restruturação Societária, Planejamento Sucessório e Tributário. Em todos os lugares que estive, sempre me questionam se é possível blindar o patrimônio.

Percebo que muitos profissionais praticam um verdadeiro “estelionato”, vez que promete ao cliente que está blindando o patrimônio. O que é blindar o patrimônio? É lícito?

O tema parece ser espinhoso, mas faremos este enfrentamento, pois é preciso desmistificar o que se prega na sociedade, especialmente, no meio empresarial.

É nítido que a intenção de blindar o patrimônio é torná-lo inatingível, utilizando de práticas ilícitas para não expor os bens, diante de qualquer obrigação, especialmente trabalhistas, fiscais, societárias, ambientais, cíveis ou até mesmo na partilha do divórcio, dentre outras situações. O objetivo é esconder os bens de tudo e todos.

Para cometer este tipo de fraude, utilizam-se dos mais diversos procedimentos, como “criar um crédito” em favor de uma pessoa de confiança e ser executado judicialmente para ofertar determinado bem como pagamento, com a intenção de proteger este ativo, além de outras práticas que podem acontecer inclusive na Justiça do Trabalho através de eventual lide simulada para criar um crédito que em tese não existe como forma de retirar algum ativo e assim “blindá-lo”.

As práticas ilícitas e artesanais são inúmeras como: simulação, dilapidação patrimonial, liquidação precipitada, alienação irregular do estabelecimento empresarial, transferência dos bens para filhos, irmãos, terceiros, além de outras.

Por desconhecimento de muitos, infelizmente este procedimento “ilícito” é vendido como se fosse algo juridicamente possível, teoricamente legal, o que não é.

Uma prática ilícita mais refinada é a constituição de Offshore com a finalidade de blindagem. Empresa offshore é aquela situada no exterior, sujeita a regime legal e tributário diferentes do país de origem. Atualmente, a expressão é aplicada mais especificamente a sociedades constituídas em "paraísos fiscais", com impostos reduzidos ou até mesmo isenção de impostos.

O termo Offshore pertence a língua inglesa cujo significado é “afastado da costa”. Conforme ensina o Prof. Gladston Mamede, em termos financeiros é destinada por offshore uma empresa que tem sua contabilidade num país distinto daquele onde exerce a sua atividade.

Sem aprofundar no tema, é importante registrar que, inúmeras operações já foram deflagradas no Brasil por força deste esquema ilegal de proteção de patrimônio, que geralmente envolve os crimes de Sonegação Fiscal, Evasão de Divisas, Formação de Quadrilha, Lavagem de Dinheiro e outros que podem estar associados. A maior operação de todos os tempos que demonstra a má utilização da Offshore é a OPERAÇÃO LAVA JATO.

Na operação lava jato, conforme divulgado na mídia, extratos bancários enviados pelo Ministério Público da Suíça à Procuradoria Geral da República apontam que o presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), utilizou empresas "offshore" para movimentar supostas contas bancárias no país europeu. Cunha é investigado na Suíça por suspeita de lavagem de dinheiro e corrupção passiva.

Diante destas breves considerações, constatamos que “alguns” profissionais acabam por deturpar a finalidade dos institutos lícitos, constituindo na verdade uma proteção patrimonial ilícita, habitualmente através de offshore, em “zonas de paraíso fiscal”, o que implica inevitavelmente nos crimes já elencados, que atinge inclusive, os profissionais que participaram deste procedimento ilícito.

Para piorar a situação, alguns “profissionais” e/ou “vendedores de sonhos” por desconhecimento ou intencionalmente, utilizam de uma organização societária totalmente lícita chamada HOLDING para tentar convencer as pessoas que este instituto, “blindaria” o patrimônio.

As empresas consideradas holding são aquelas que controlam e participam de determinadas empresas que constituem um grupo empresarial ou mesmo uma empresa familiar. Efetivamente o conceito de holding vem do verbo de língua inglês “to hold”, que quer dizer, guardar, segurar, manter, controlar.

Se a Holding for constituída com objetivo de não pagar credores ou até mesmo de tornar o patrimônio inatingível, antecipo que não funcionará. Caracterizará fraude e dependendo das ações empregadas, constituirá crime.

A holding como forma de proteção ou planejamento patrimonial pode diminuir os riscos e custos elevados de se ter um patrimônio substancial em nome de pessoas físicas em diversas situações como locações, alienações de imóveis, inventário, dentre outros benefícios a exemplo do planejamento sucessório, oportunidade que se doa aos filhos com condições seguras e restritivas. Em linhas gerais, cria-se uma pessoa jurídica controladora de patrimônio e denominada holding para se atenuar estes impactos financeiros e fiscais. Esta empresa recebe todos os bens de seus sócios, os quais passam a deter apenas quotas da empresa, sendo ela geralmente constituída sob a forma de uma sociedade limitada ou anônima.

Esta estrutura empresarial é considerada uma excelente oportunidade para otimizar a administração corporativa do negócio. Ainda que não seja a única alternativa, a partir da criação de uma holding para controlar patrimônio, um grupo empresarial, filiais e suas unidades estratégicas de negócios, pode-se, de forma segura e econômica, viabilizar a gestão do negócio de forma corporativa e profissional.

Cabe mencionar que a Holding se apresenta extremamente eficiente diante da sucessão familiar ou profissional. Ela representa a história de vida e a estruturação sucessória, societária e patrimonial ao longo das gerações que se sucedem. O planejamento sucessório está umbilicalmente ligado ao planejamento patrimonial, dada a preocupação de muitos patriarcas, matriarcas e executivos em manter o patrimônio constituído e até mesmo suas empresas, em poder de seus descendentes, evitando assim que os filhos dilapidem os bens herdados, oportunidade em que trabalha-se com a doação com cláusulas restritivas como incomunicabilidade, inalienabilidade, reversibilidade, impenhorabilidade, indisponibilidade e usufruto vitalício, patrimonial e político.

Considerando que boa parte das empresas no Brasil são familiares, é de bom alvitre registrar que no direito civil brasileiro, especialmente no direito de família, tomou-se o cuidado de criar regras detalhadas para definir o relacionamento entre irmãos, pais e filhos etc., o que seria um equívoco, considerando a carga eminentemente afetiva dessas relações pessoais.
Todavia, o Direito Empresarial e, mais especificamente, o Direito Societário, constituíram-se como disciplinas jurídicas que não estão atreladas às limitações emotivas e, justamente por isso, puderam sobejar normas para a convivência entre os sócios, razão pela qual a Holding se apresenta como um dos melhores institutos jurídicos, inclusive de solução de conflito.

Portanto, diante destas considerações superficiais, não vislumbro nenhuma possibilidade de blindagem patrimonial “lícita” com a utilização de Holding´s, cujo propósito é muito maior e mais profundo, considerando que, busca-se cuidar de forma eficiente do planejamento sucessório visando desonerar, simplificar e facilitar a sucessão, o inventário e a transferência de bens para os descendentes, com menor custo de impostos, não podendo esquecer o planejamento societário, patrimonial e tributário, além da possibilidade de se implementar a governança coorporativa e inclusive o compliance empresarial para garantir a segurança da informação, a continuidade dos negócios, a gestão de riscos e de pessoas dentre outras atividades de prevenção à fraudes.

Bruno Oliveira Castro, Advogado, Professor de Direito Empresarial da Unic (licenciado), Univag, EMAM e Pós-Graduações, Especialista em Direito Empresarial pela UFMT, Doutorando em Ciência Jurídica e Social pela Universidad Del Museo Social Argentino, membro do IBRADEMP – Instituto Brasileiro de Direito Empresarial, Professor/Instrutor de Direito Empresarial da Lex nos cursos de Holding e Recuperação de Empresas em todo Brasil, Professor Convidado da Especialização de Direito Empresarial e Tributário do Mackenzie/SP e Professor Convidado da AASP - Associação dos Advogados de São Paulo.
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