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Sexta-feira, 29 de março de 2024

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Iss- Cobrança do imposto no local do estabelecimento comercial ou no local da prestação de serviços?

Preliminarmente, cabe tecer algumas considerações sobre o imposto estudado. O ISS ou ISQN é o imposto que incide sobre serviço de qualquer natureza, e o ente público que tem a competência para a sua cobrança é o Município, de acordo com o artigo 156, III, da Constituição Federal de 1988.

Sua principal finalidade é arrecadamento fiscal, porém, por falta de estrutura e organização, muitos municípios o deixam de arrecadá-lo, fazendo com que algumas empresas localizem a sua sede nestes Municípios que não arrecadam o imposto ou o cobram a menor. Este é um dos pontos cruciais ao tema abordado, o qual será analisado posteriormente.

Para que incida o ISS são necessários dois requisitos: a habitualidade e a finalidade lucrativa no que tange aos serviços prestados. O seu fato gerador é a prestação dos serviços de qualquer natureza, realizados por empresa ou profissional autônomo, desde que tais serviços estejam compreendidos na lista anexa ao decreto-lei 406/68.

Isso ocorre, visto que o Supremo Tribunal Federal, em consonância com o entendimento majoritário dos juristas, já deliberou que a lista anexa ao decreto-lei 406/68, regulada pela lei complementar n. 56/87, é taxativa, ou seja, somente são tributáveis os serviços que estejam expressamente previstos na legislação pertinente e que não sejam compreendidos pelo ICMS.

Entretanto, o próprio Supremo reconheceu a interpretação analógica da lista, o que afronta os princípios da estrita legalidade e também o artigo 108, § 1º do CTN, que preceitua: “O emprego da analogia não poderá resultar na exigência de tributo não previsto em lei”. O Superior Tribunal de Justiça, em entendimento contrário, “admite a interpretação extensiva e analógica da lista de serviços, mas veda a aplicação da analogia. Aqueles respeitam os marcos normativos. A última acrescenta fatos novos”. (STJ, 2 Turma, Resp 1.837/SP, DJU 10/09/1990).

É importante ressaltar que atualmente o entendimento dos Tribunais é no sentido de ser possível a aplicação da analogia, visto que ao legislador não seria possível prever todas as hipóteses de incidência do imposto, devido a diversidade de serviços existentes.

COMPETÊNCIA PARA A COBRANÇA DO IMPOSTO

Aqui surge uma das questões que gerou muita polêmica entre os tributaristas, porém, na atualidade, resta mais pacífica a discussão doutrinária, devida a decisão recente do Superior Tribunal de Justiça, que unanimemente julgou os embargos infrigentes, no sentido de ser devido o ISS no local da prestação dos serviços, que mais adiante será estudado.

Nos termos do artigo 12 do Decreto-lei 406/68, “considera-se local da prestação do serviço: a) o estabelecimento prestador ou, na falta de estabelecimento, o do domicílio do prestador; b) no caso de construção civil, o local onde se efetuar a prestação”. Assim, o legislador excepcionou uma única hipótese da cobrança ser efetuada pelo Município no qual foi prestado o serviço.

Inúmeras questões se resolveram com a vigência do decreto-lei, porém outras tantas surgiram. Qual seria o Município competente para a cobrança do ISS, quando um serviço é iniciado em um Município e finalizado em outro? Seria no qual houve uma maior serviço ou seria dividido “pro rata”?

O ISS é um tributo incidente sobre fatos, cuja a natureza comporta desdobramentos que extravasam o âmbito municipal. Isto se dá porque o ISS é repartido não apenas em função de um critério material, mas também em razão de um critério territorial.

Quando se trata da União, a competência é unicamente material, diferentemente dos Estados-membros, Distrito Federal e Municípios, onde o critério que define a competência é o territorial, só podendo exigir a cobrança dos impostos nos limites dos seus respectivos territórios.

Por esse motivo, a unanimidade dos doutrinadores defendem a inconstitucionalidade do artigo 12, “a”, do Decreto-lei 406/68, em face ao princípio da territorialidade das leis tributárias, onde só pode ser realizada a cobrança no local em que efetivamente foram prestados os serviços.

Pensar de modo diverso, ressalte-se, implica atribuir à lei municipal eficácia extraterritorial, fazendo com que a lei de um município possa ter eficácia em outro, afastando a competência deste, no qual foram efetivamente prestados os serviços.

Assim, visando evitar que uma lei municipal afaste a eficácia da de outro, onde foram realizados na sua inteireza a prestação de serviços, resta definida a competência para a exigibilidade do imposto, que deve ser a do local da prestação de serviços, devido ao princípio da territorialidade. Do mesmo modo, a uníssona jurisprudência tem firmado ser legal a cobrança pelo Município onde prestado é o serviço, do imposto dele derivado. Neste sento, os excertos abaixo assim pontuam:

“TRIBUTÁRIO. ISS. sua exigência pelo município em cujo território se verificou o fato gerador. interpretação do artigo 12 do decreto-lei 406/68. embora a lei considere local da prestação de serviço o do estabelecimento prestador (art. 12 do decreto-lei n.406/68), ela pretende que o iss pertença ao município em cujo território se realizou o fato gerador. e o local da prestação do serviço que indica o município competente para a imposição do tributo(ISS), para que não se vulnere o princípio constitucional implícito que atribui àquele (município) o poder de tributar as prestações em seu território. a lei municipal não pode ser dotada de extraterritorialidade, de modo a irradiar efeitos sobre um fato ocorrido no território de município onde não se pode ter voga. recurso a que se nega provimento, indiscrepantemente”. (STJ, 1ª Turma, Resp 54.002-PE( 9400280017), Rel. Min. Demócrito Reinaldo. Decisão: por unanimidade, negar provimento ao recurso- j. de 5-4/1995).

Ademais, já encontra-se pacificada pelo Egrégio STJ a questão aqui levantada, eis que, recentemente, julgando embargos divergentes ( Embargos de divergência em Resp nº 130.792- Ceará), decidindo de modo em que a cobrança do ISS deve incidir no local da respectiva prestação de serviços, sendo deste Município o direito de exclusivamente efetivar sua cobrança, independentemente de restar configurada a hipótese de construção civil.

O entendimento do STJ, deu correta interpretação ao Dec-Lei nº 406/68, evitando beneficiar aqueles contribuintes que costumam migrar para municípios que praticam alíquotas de ISS mais atraentes, bem assim, pondo termo final prático ao leilão de alíquotas diferenciadas, praticadas pelos municípios contíguos entre si. Veja-se (arrestos compilados do site do STJ, com grifos aduzidos):

“Embargos de Divergência em Resp nº 130.792- Ceará.
Relator: Min. Ari Pargendler
Embargos de divergência. ISS. Competência. Local da prestação de serviços. Precedentes.
I- Para fins de incidência do ISS- Imposto sobre Serviços- importa o local onde foi concretizado o fato gerador, como critério de fixação de competência do município arrecadador e exigibilidade do crédito tributário, ainda que se releve o teor do art. 12, alínea “a” do Decreto-lei nº 406/68.
II- Embargos rejeitados.
Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por maioria.” Brasília, 07 de abril de 2000( data do julgamento). ( STJ 12/06/2000- data do DJ).


“ PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO ISS - SERVIÇOS DE CONSTRUÇÃO CIVIL - LOCAL DO RECOLHIMENTO -INTERPRETAÇÃO DO ART. 12 DO D.L. 406/68 - NEGATIVA DE VIGÊNCIA DE LEI FEDERAL NÃO CONFIGURADA - DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADA - PRECEDENTES. O Município competente para a cobrança do ISS é aquele em cujo território se realizou o fato gerador, em atendimento ao princípio constitucional implícito que atribui àquele Município, o poder de tributar os serviços ocorridos em seu território. Na comprovação da divergência jurisprudencial impõe-se que os paradigmas colacionados e o acórdão recorrido tenham enfrentado tema idêntico, à luz da mesma legislação federal, porém dando-lhes soluções distintas. A lei federal (art. 12, D.L. 406/68) pretende que o ISS pertença ao Município que recebe a prestação do serviço, fato gerador do tributo. Violação à lei federal não configurada. Recurso não conhecido.” (STJ, Resp 115279/RJ, 2ª T, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, pub. 01/07/1999)

“TRIBUTÁRIO - ISSQN - FATO GERADOR - LOCAL - PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. O fato gerador do ISSQN é a prestação, por empresa ou profissional autônomo, de serviço constante da lista anexa ao Decreto-lei nº 406/68. Embora o art. 12, letra "a" considere como local da prestação do serviço o do estabelecimento prestador, pretende o legislador que o referido imposto pertença ao município, em cujo território se realizou o fato gerador. Embargos rejeitados.” ( STJ, Edresp 115338/ES, 1ª Turma, Rel. Min. Garcia Viera, pub. 08/09/1998)

“TRIBUTÁRIO ISS. Embora a lei considere local da prestação de serviços, o do estabelecimento prestador (art. 12 do decreto-lei n. 406/68), ela pretende que o ISS pertença ao município em cujo território se realizou o fato gerador. e o local da prestação de serviços que indica o município competente para a imposição do tributo (ISS), para que se não vulnere o principio constitucional implícito que atribui aquele o poder de tributar as prestações ocorridas em seu território. precedentes do STJ. por unanimidade, não conhecer o recurso. ( STJ, Resp 61615/RN, 1ª Turma, Rel. Min. Demócrito Reinaldo, pub.25/10/1995)


Essa possibilidade de conseguir alíquotas mais vantajosas se deve ao fato dos Municípios gozarem de autonomia para fixar as alíquotas do ISS, embora a União possa fixar alíquotas máximas para a cobrança de tal imposto, como preceitua o art. 156, § 4º, item I da CF/88.

Ex positis, a fim de evitar conflitos de competência entre os Municípios, entendo inaplicável o artigo 12 do Decreto-lei n. 406/68, em consonância com o entendimento dos Tribunais, visto que a competência em matéria de ISS, deva ser qualificada por um critério territorial. Logo, o município competente para tributar essa prestação será sempre e exclusivamente aquele em cujo território foram executados os serviços prestados.

Gustavo Augusto Ferraz Rodrigues é advogado em Cuiabá graduado em Direito pela Universidade da Região da Campanha (URCAMP/Bagé – RS)
Ernesto Vagner Ferraz Rodrigues é advogado draduado pela Universidade Católica de Pelotas/RS



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