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Terça-feira, 19 de março de 2024

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A lei Maria Da Penha e as mudanças que dependem de todos nós, todos os dias

Autor: Ana Lúcia Ricarte e Flávio Marcos Ricarte

10 Nov 2017 - 08:00

A Lei n. 11.340/2006, conhecida como “Maria Da Penha” completou 11 anos, e até o momento o Estado brasileiro tem dificuldade em cumprir suas regras pela falta de politicas públicas direcionadas a esse mister e de investimentos para atender as vítimas.
 
No Brasil temos cerca de 397 Delegacias Especializadas da Mulher, enquanto contamos com 5.570 municípios.Nos municípios em que há delegacia especializada da mulher, a prestação de serviços deixa muito a desejar, pois a vítima não tem um tratamento humanizado e eficaz, uma vez que a violência causa danos irreversíveis à saúde das vítimas. Muitas vezes essas mulheres são desestimuladas a procurar ajuda, quer por sentirem vergonha consigo mesmas quer por não receberem um olhar mais sensível diante da situação em que se encontram.
 
Somos um país desprovido de cultura e políticas públicas voltadas para o combate à violência doméstica. Basta notar a extensão do problema em contrapartida com as ações que visem o seu combate.
 
Apesar de na última década este assunto estar em discussão no meio jurídico e o poder judiciário trabalhar em prol do combate a esse tema, mantemos viva em nossa sociedade uma triste e doente realidade.Sem políticas públicas apropriadas, de prevenção e punição aos infratores, seguimos na contramão de grandes países desenvolvidos, que compreendem a luta contra a violência doméstica  algo de extrema importância.
 
Dessa forma continuamos a apresentar números alarmantes: sete mulheres são mortas por dia no Brasil vítimas de violência doméstica; nosso país é o 5º no ranking do feminicídio (número que faz comparação com dados de 83 países); em Mato Grosso tivemos em 2016 o alarmante número de 91 casos de feminicídio e mais de 40 mil ocorrências de violência contra a mulher foram registrados de janeiro a dezembro de 2016, de acordo com a defensoria pública do Estado.
 
Não podemos aceitar a simplista e irresponsável proposta de que basta alterar a lei para que as vítimas recebam tratamento adequado. O problema vai além dos danos físicos e psicológicos causados à mulher que sofreu violência. A economia do Brasil perde cerca de R$ 1 bilhão devido às consequências da agressão sofrida pelas trabalhadoras dentro de suas casas. Para piorar, mulheres vítimas de violência doméstica chegam a ficar 50% menos tempo empregadas em comparação com as mulheres que não sofrem tal agressão.
 
Quando se fala em legislação apontamos que no Senado o Projeto de Lei (PLC 7/2016) propôs alterações a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), para permitir ao delegado de polícia conceder medidas protetivas de urgência a mulheres vítimas de violência doméstica e a seus dependentes.
 
Essa atuação do delegado só seria admitida, segundo o projeto, em caso de risco real ou iminente à vida ou à integridade física e psicológica da mulher e de seus dependentes.

Nessa hipótese, a autoridade policial poderá aplicar essas medidas protetivas, mas assumindo a responsabilidade de comunicar a decisão ao juiz em até 24 horas, para que ele mantenha ou reveja essa intervenção. 
 
O Ministério Público também deverá ser consultado sobre a questão no mesmo prazo. Providências complementares para proteção da vítima - chegando até mesmo à prisão do suposto agressor – também poderiam ser pedidas pelo delegado ao juiz.
 
Outro aspecto previsto no Projeto - PLC 7/2016 - é o direito a atendimento policial especializado e ininterrupto, realizado preferencialmente por profissionais do sexo feminino, o que demostra a sensibilidade normativa ao tratar do assunto.
 
De fato o projeto foi aprovado essa semana pelo presidente Michel Temer, mas foi vetada a permissão para delegados aplicarem medidas protetivas. Segundo as justificativas do texto sancionado, o artigo 12-B e seus parágrafos 1º e 2º foram vetados porque "incide em inconstitucionalidade material, por violação aos artigos 2º e 144, § 4º da Constituição, ao invadirem competência afeta ao Poder Judiciário e buscarem estabelecer competência não prevista para as polícias civis".
 
É importante entender que leis punitivas fazem parte da luta, mas a melhor forma proposta de diminuir e combater a criminalidade é alcançando o crime em suas causas, suas raízes, não suas consequências, como o Estado tem praticado. Precisamos combater determinados comportamentos no futuro. Temos urgência em substituir os valores sociais que sustentamos. A criminalidade dos jovens e crianças é um exemplo, pois o crime é aprendido, segundo a teoria do Aprendizado Social (ou da Associação Diferencial). Faz-se necessário a revisão de atitudes, de valores e de pautas de comportamento.
 
Antes de tudo isso precisamos exercer o respeito mútuo entre os gêneros. Homens e mulheres que lutem por uma sociedade mais justa, fortalecendo um grupo que deve se manter unido em prol de apoio a mudanças reais, caso contrário, o combate à violência se tornará mera ilusão.
 
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Ana Lúcia Ricarte é Advogada e associada ao IBDFAM (Instituto Brasileiro de Direito de Família) e Diretora de eventos e projetos no IAMAT (Instituto dos Advogados Mato-Grossenses)

Flávio Marcos Ricarte é estudante de direito
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