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Quinta-feira, 28 de março de 2024

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Futuro da conciliação e mediação no Brasil é promissor, avalia especialista

Há cinco anos, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) instituiu a Resolução CNJ n. 125, que dispõe sobre a política nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesse no âmbito do Poder Judiciário. Entre outras medidas, o ato determinou a criação dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos (Cejusc) e as diretrizes de capacitação de conciliadores e mediadores em todo o país.

A doutora em Ciências Jurídicas e Sociais e professora dos cursos de Mestrado e Doutorado da Universidade de São Paulo Ada Pellegrini Grinover foi uma das protagonistas na implantação da Resolução. Em entrevista à Agência CNJ de Notícias, ela faz uma avaliação da política nacional de solução de conflitos no Judiciário e fala sobre o consensualismo processual no Brasil.

Na sua avaliação, existe Justiça consensual no Brasil?

Certamente. Entendida a Justiça consensual como o conjunto de métodos consensuais de solução de conflitos aplicados à Justiça, conciliação e mediação judiciais (pré-processuais ou processuais) integra o amplo quadro de política judiciária. A conciliação judicial, que já existia no Código de Processo Civil de 1973, foi revigorada com a Lei de Pequenas Causas de 1984 e, sobretudo, pela Lei dos Juizados Especiais (Lei n. 9.099/1995). Em áreas específicas, também foi importante a Lei do Divórcio (Lei n. 6.515/1977). A mediação judicial é mais recente, sendo seu marco regulatório inicial a Resolução n. 125 do CNJ e é hoje praticada sobretudo pelos Cejuscs, instituídos pela mencionada Resolução. A conciliação e a mediação judiciais estão hoje previstas também pelo CPC de 2015 e pela Lei de Mediação (Lei n. 13.140/2015). Juntamente com a Resolução CNJ n. 125, o novo CPC e a Lei de Mediação formam o minissistema brasileiro de métodos consensuais de solução de conflitos, sendo suas normas complementares naquilo em que não conflitarem. Se houver conflito, as normas da Lei Mediação prevalecem por se tratar de lei posterior e específica.

O chamado consensualismo processual seria causa ou efeito do movimento pela conciliação?

Efeito. O Brasil, na Constituição Imperial, já estabelecia que nenhuma causa seria submetida ao Poder Judiciário se antes não se tentasse a conciliação. Os meios consensuais existem desde os tempos das sociedades primitivas e antecederam o surgimento do processo estatal. Com o tempo, percebeu-se que o processo estatal não era o meio mais adequado ou suficiente para a solução de todos os conflitos e ressurgiu o interesse pelas vias consensuais, juntamente com movimentos para implantá-los e reforçá-los em todo o mundo.

O que mais marcou a sua atuação profissional nesses cinco anos de Resolução CNJ n. 125?

Antes mesmo da Resolução, presidi a Comissão do Instituto Brasileiro de Direito Processual que apresentou o substitutivo ao projeto de Lei sobre Mediação da deputada Zulaiê Cobra, instituindo a mediação paraprocessual, em 2002. Colaborei com o professor Kazuo Watanabe para a elaboração e implantação da Resolução CNJ n. 125. Depois da Resolução, apresentei sugestões, acolhidas, à Comissão de Juristas encarregada pelo Senado da apresentação do projeto de novo Código de Processo Civil, em matéria de conciliação e mediação. Apresentei, com Kazuo Watanabe, sugestões de harmonização do Projeto de Lei de Mediação com o novo CPC, que também foram acolhidas. Também com Kazuo Watanabe, criei e coordeno uma coleção de livros sobre métodos alternativos de solução de conflito, com vários volumes publicados. Coordenei e participei de eventos para a divulgação e o debate sobre os métodos consensuais. Organizei e coordenei diversos cursos de capacitação de conciliadores e mediadores. Introduzi, com Kazuo Watanabe e Carlos Alberto de Salles, a disciplina sobre a matéria na graduação da Faculdade de Direito da USP. Fui cocoordenadora de pesquisa do Ministério da Justiça, executada pelo Cebepej e pela FGV, sobre “Análise Qualitativa da Mediação no Brasil”. Integrei a Comissão do CNJ para a elaboração de parâmetros curriculares para a capacitação de mediadores, cujas conclusões foram encaminhadas a seu presidente, ministro Ricardo Lewandowski, pelo presidente da referida Comissão, ministro Marco Aurélio Buzzi.

Como a senhora visualiza o futuro da conciliação no país?

O futuro da conciliação e da mediação é muito promissor. Mas depende de uma séria vontade política, da disseminação e institucionalização dos Cejuscs pelos tribunais, da capacitação rigorosa e da reciclagem constante de conciliadores e mediadores, de sua profissionalização (que inclui a remuneração) e do abandono de técnicas que, embora adotem o rótulo de conciliação, nada mais são do que métodos de cobrança de dívidas, em que inexistem o verdadeiro diálogo e a decisão informada.

Há algum outro ponto que a senhora ache importante ressaltar sobre a Resolução CNJ n. 125?

O que me preocupa hoje é sua plena implementação, juntamente com as normas dos demais marcos regulatórios da Justiça conciliativa (CPC de 2015 e Lei de Mediação). No Brasil, as instituições são avançadas e muito bem delineadas, mas em geral faltam planejamento, execução e acompanhamento para sua concretização, bem como avaliação para correção de rumos e melhoras. A institucionalização não se faz só pela previsão normativa.
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