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JUIZES SOB AMEAÇA

TJ rebate AMAM, nega "esperar tragédia" e anuncia investimentos na segurança do Fórum

07 Mar 2017 - 17:08

Da Redação - Paulo Victor Fanaia Teixeira

Foto: Rogério Florentino Pereira/OD

Desembargador Rui Ramos

Desembargador Rui Ramos

O presidente do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), Rui Ramos Ribeiro, rebateu a crítica feita pelo presidente da Associação Mato-Grossense de Magistrados (AMAM), José Arimatéia Neves Costa, de que somente uma tragédia faria o Poder Judiciário tomar providências para a segurança dos juízes. Durante a cerimônia de posse da nova gestão do Ministério Público Estadual (MPE), nesta segunda-feira (06), Ramos negou haver qualquer notícia concreta de ameaça, mas admitiu que investimentos para o Fórum da Capital serão feitos em breve, com abertura de licitação.

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Em entrevista ao Olhar Jurídico, publicada no domingo (05), o presidente da AMAM, José Arimatéia, criticou a falta de investimentos para garantir maior rigor na entrada e saída de pessoas no Fórum da Capital. O tema foi levantado após reportagem nacional veiculada pela TV Record, que apresentou a juíza da Sétima Vara Criminal de Cuiabá, Selma Rosane Arruda, como uma profissional “marcada para morrer”.

Arimatéia questionou a ausência de “vontade política e a questão orçamentária” como fatores decisivos para a inércia. “Sempre se alega que não há orçamento, que o equipamento é caro e que instalar todos estes detectores no Estado custaria um valor muito alto. Não é prioridade, não há vontade política na administração do Tribunal”. Ao final de seu raciocínio, dispara a seguinte crítica: “acho que o Tribunal só vai adotar uma medida concreta quando acontecer uma tragédia. Essa é a verdade nua e crua”.

Incomodado, o presidente do TJ, Rui Ramos, negou a concretude das notícias que embasam a crítica da AMAM. “Você tem a seguinte situação: qual o nível de segurança ou insegurança que se tem na Sétima Vara Criminal? Nós temos serviços de inteligência trabalhando lá, isso é lógico. A juíza não está desacompanhada, em desatenção. Ela tem a atenção necessária, policiais que a acompanham diariamente. Não é algo aleatório, que qualquer um possa entrar e sair. Pode ocorrer, mas temos, efetivamente, a Inteligência trabalhando. Eu devolvo a pergunta: existe algum caso concreto de ameaça à juíza? A partir daí, há algo mais concreto? Algo extra? Ou parou nesse patamar que iniciou (da especulação)? A resposta é fácil”, disparou.

Questionado sobre as Comarcas que mais sofrem com a violência a magistrados, Rui Ramos avalia. “Normalmente as Varas criminais, hoje temos a questão da criminalidade organizada, mas toda notícia que venha ao nosso conhecimento, pelo menos ao meu e ao conhecimento da Comissão de Segurança, da desembargadora Maria Erotides, as medidas são tomadas. Não ficam ali engavetadas não, são tomadas as providências. Agora, da minha parte... eu não estou nem há três meses no Tribunal, o que tenho mandado fazer é promover apoio total ao magistrado que necessita (de segurança)”.

Sobre investimentos em segurança estrutural na entrada do Fórum da Capital, Ramos admite. “Nós não temos, realmente, estes detectores de metais, como está sendo pedido. Isto está em início de licitação, pois é preciso também encontrar profissionais que operem este sistema. Estamos agora em março e quando tive conhecimento de todos os problemas que temos e coloquei o pessoal para trabalhar. Estamos prestes a soltar uma licitação com pedido de extensão para contratação de pessoas para operação. Isso não é possível de ser feito de uma vez por todas, é algo feito em etapas. Porém, não é necessária uma tragédia para que o Tribunal providencie soluções às necessidades de segurança dos magistrados. É preciso ter notícia fundada, notícia concreta de ameaça, não apenas subjetivamente acharem que há uma ameaça. Magistrados sob ameaça recebem apoio da Coordenadoria Militar do Tribunal, com ajuda inclusive da Polícia Civil, para que observem o que está acontecendo e façam o trabalho de inteligência, como acontece no Brasil inteiro. São necessários aparelhagem e pessoal que saiba operá-lo. É preciso licitar, não posso simplesmente chegar e comprar os aparelhos”.

Pegos de Surpresa:
 
Ao Olhar Jurídico, Túlio Duailibi Alves Souza, que auxilia o presidente do TJ em questões de seguranças para magistrados, diz que a reportagem sobre a crítica da AMAM foi inesperada. “A notícia nos pegou de surpresa, em relação à falta de investimento do Poder Judiciário, pois aqueles casos que chegam, sobre segurança pessoal, quando um magistrado sente-se vulnerável na segurança de sua família, estes casos são encaminhados para a Comissão de Segurança que, junto com a equipe técnica, analisa com a Coordenadoria Militar, de acordo com os parâmetros técnicos e diretrizes de segurança a concessão ou não da proteção”.

Já em relação ao aspecto estrutural do Fórum da Capital, Túlio Duailibi adianta que procurará a Coordenadoria Militar para entender “o que de fato está acontecendo, pois nós não temos notícias de ameaça à invasão de prédio, informações de que pessoas que transitam nos fóruns tenham sua segurança comprometida. Vamos de todo modo levantar como andam os processos de aquisições para equipamentos de segurança para raios-X e detectores de metal”.

Mesmo admitindo que investimentos na segurança sejam necessários, o magistrado nega notícia sobre ameaça à vida de quem transita no Fórum de Cuiabá. “Nas diversas audiências que já aconteceram desde a inauguração do Fórum, pelo menos eu não me recordo de ter havido relato de magistrados com sensação de segurança abalada na questão da realização de audiências ou no transito interno. Nunca registramos incidentes neste sentido, mas no momento em que o país vive o caso chama atenção e temos que ver o que está acontecendo”.

Segurança em debate:

Ainda na entrevista ao Olhar Jurídico, José Arimatéia confirmou que a AMAM recebeu queixas sobre a segurança particular de Selma Rosane Arruda. “Ela fez uma solicitação e nós encaminhamos direto para a Comissão de Segurança, uma solicitação de que ela estava sofrendo ameaças há cerca de dois anos”.

Adiante, cita outros casos de notícias concretas. “Não somente ela, nesta semana mesmo eu recebi uma solicitação, uma reclamação, de um colega que estava sofrendo ameaças. Um colega que atua na Vara Cível de Várzea Grande. Eu li os e-mails que ele recebeu, um cidadão dizendo: ‘olha, o endereço do seu pai é tal, mora no interior, na rua tal, tal bairro, tal cidade, o nome de seu pai e de sua mãe é tal, seu filho estuda na escola tal’. Ameaçando a vida do colega mesmo, a dele e de sua família. A AMAM repassou isso para a Comissão de Segurança”.

Câmera Record:

O caso de Selma Rosane Arruda recebeu destaque. Com boa dose de espetacularização, a reportagem da Record introduz Selma como uma “mulher vaidosa e uma juíza marcada para morrer”. A matéria foi entitulada “sem medo dos poderosos”. Narra o especial que há 01 ano e meio a magistrada recebe proteção da Policia Civil de Mato Grosso. “A minha equipe, eu tive sorte, pois são todos ótimos”, declarou Selma.

Adiante, a juíza ironiza a impossibilidade de viver seguindo todas as regras impostas pela segurança. “Se a gente for levar à risca questões de segurança, não vai a lugar nenhum”, afirmou.

Não nega que as ações penais que julga são históricas. “É uma situação emblemática, vai deixar cicatriz eterna na história de Mato Grosso”, diz se referindo às ações da Sodoma e às que envolvem o ex-deputado José Geraldo Riva e o ex-vereador João Emanuel Moreira Lima.

“Selma virou celebridade no Estado e todos os dias nas ruas e nas redes sociais recebe cumprimentos por ter tido coragem de enfrentar políticos poderosos”, destacou a TV Record. Momento seguinte, a juíza refletiu. “A gente tem que crescer mais, e todas as instituições crescerem, para não termos mais que cumprimentar um político simplesmente porque ele não rouba”, queixou-se, “isso é um absurdo”.

Rapidamente, a reportagem rememorou o histórico profissional da juíza, destacando que “ameaças não são novidade na vida dela”. Antes de assumir a Sétima Vara Criminal, em Cuiabá, passou por diversas Varas Criminais pelo interior de Mato Grosso, com destaque para a cidade de Cáceres, na fronteira com a Bolívia (240 km de Cuiabá).

Na beira do Rio Paraguai, em uma cidade de 90 mil habitantes e altíssimos índices de criminalidade, Selma enfrentou traficantes perigosos e passou por momentos difíceis. “Noite em claro sentada na cama com arma no colo, filhos à volta, e não vou dizer que senti medo porque não tem como”, declarou.

À família, resta entender e apoiar seu trabalho. Em depoimento à reportagem, o Policial Rodoviário Federal aposentado Norberto Arruda, com quem Selma é casada há 31 anos, lamenta ter que voltar a andar armado, diz que não é algo que gostaria, “andei por 32 anos armado”.

Mostrando um pouco do dia a dia da magistrada, a reportagem mostra imagens de Selma logo pela manhã em uma visita a um salão de beleza de Cuiabá. Escoltada por três seguranças, nunca abandona o celular e mantém olhos atentos a eventuais ataques.

Lamentando já ter sido desrespeitada por ser mulher, a juíza Selma Rosane Arruda encerra sua participação com discurso de igualdade entre os sexos. “A caneta não é pesada, para a gente tomar uma decisão não importa se é homem ou mulher”.

Olhar Jurídico:

O questionamento sobre a segurança de Selma Rosane Arruda já fora feito em outras ocasiões por Olhar Jurídico. Em entrevista exclusiva veiculada na virada de 2015 para 2016, a magistrada negou temer represálias. “Eu não temo. Não temo nenhum tipo de represália. Até porque, o que se fizer contra um magistrado, vai estar se fazendo contra toda a magistratura. Como lhe disse, se amanhã eu tiver que sair por algum motivo, seja por aposentaria ou por algum outro motivo desses que você tocou, certamente virá outro tão ou mais rigoroso do que eu. Portanto, não vejo risco”.

Em maio de 2016, Olhar Jurídico também problematizou a questão com a então Corregedora do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), desembargadora Maria Erotides Kneip Baranjak. Ela também teme a insegurança na justiça local. "TJMT está entre os que mais exigem segurança para juízes”, declarou.
 
Destacou na época que o TJMT havia promovido “treinamento para magistrados que estão sob ameaça, que envolve direção defensiva, direção evasiva, tiro, etc. Fizemos esse treinamento em um Núcleo do Exército Brasileiro, em Brasília. Mas, o que acontece é que, infelizmente, quando um juiz precisa contrariar interesses de organizações criminosas ou mesmo políticos, ele fica realmente sob ameaça. Temos no Estado casos graves de juízes que precisam inclusive de escolta policial. Temos casos na capital e na fronteira”, destacou. 

Somente em Mato Grosso, além de Selma Arruda, outros três magistrados dependem de escolta policial.
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