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Quinta-feira, 28 de março de 2024

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ENTREVISTA

"Todos são iguais perante a lei", avalia Rabaneda sobre ações penais contra governadores; veja entrevista

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu, na sessão do dia 4 de maio, o julgamento de uma ação e confirmou o entendimento de que as unidades federativas não têm competência para editar normas que exijam autorização da Assembleia Legislativa para que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) instaure ação penal contra governador e nem para legislar sobre crimes de responsabilidade. Também foi confirmado que, no caso de abertura de ação penal, o afastamento do cargo não acontece automaticamente.
 
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Ao pacificar esse entendimento, os ministros aprovaram, por unanimidade, uma tese segundo a qual “é vedado às unidades federativas instituírem normas que condicionem a instauração de ação penal contra governador, por crime comum, à previa autorização da casa legislativa, cabendo ao Superior Tribunal de Justiça dispor, fundamentadamente, sobre a aplicação de medidas cautelares penais, inclusive afastamento do cargo”.
 
De acordo com os ministros, o texto será usado como base para a propositura de uma Súmula Vinculante sobre a matéria.
 
Quanto aos crimes de responsabilidade, os ministros mantiveram entendimento já resumido na Súmula Vinculante 46, segundo a qual a definição dos crimes de responsabilidade e o estabelecimento das respectivas normas de processo e julgamento são da competência legislativa privativa da União.

Buscando elucidar a questão, o Olhar Jurídico ouviu o advogado e juiz membro do Tribunal Regional Eleitoral, Ulisses Rabaneda. Confira:
 
Olhar Jurídico - Qual o benefício social de não haver necessidade de autorização prévia para STJ julgar governador?

Rabaneda - O Supremo, com esta decisão, modificou sua jurisprudência tradicional, que era no sentido de que a necessidade de autorização da Assembléia Legislativa, quando prevista nos textos Estaduais, possuía respaldo na Constituição Federal.
 
Esta visão, a meu sentir, violava frontalmente o Art. 22 I da Constituição Federal, já que estas normas, claramente, tratam de questões de natureza processual, ou seja, somente o Congresso Nacional pode legiferar.
 
Os benefícios que esta decisão traz são de ordem moral e processual. Moral pois o Supremo demonstra que efetivamente todos são iguais perante a lei, independente da condição de exercer o cargo de Governador. Processual em razão da celeridade que trará para esses processos, contribuindo significativamente para uma melhor produção de provas, inclusive em favor da defesa. As testemunhas, por exemplo, quanto mais passa o tempo, maior a possibilidade de esquecerem fatos relevantes, não é mesmo?
 
Olhar Jurídico - Também foi confirmado que, no caso de abertura de ação penal, o afastamento do cargo não acontece automaticamente. Qual a sua opinião sobre isso?
 
Rabaneda - Mais uma decisão acertada. Não há na Constituição Federal nada que autorize este afastamento automático, exceto quanto ao Presidente da República. No caso dos Governadores, eventual afastamento se daria a título de medida cautelar, que, como sabemos, precisa ser concretamente fundamentada objetivando proteger o bom andamento processual. Inexistindo os requisitos de cautelaridade, o afastamento não se impõem.
 
Olhar Direto - Você acredita que as assembléias legislativas não teriam isenção política para decidir sobre a autorização necessária para a abertura de processo por crime comum contra governador no STJ?
 
Rabaneda - O processo penal não deve se submeter a nenhuma interferência política em sua tramitação. A Assembléia Legislativa é uma casa eminentemente política. Não há qualquer razão de ser nesta previsão, se não oferecer tratamento claramente privilegiado ao chefe do Poder Executivo Estadual. De todo modo, o ponto relevante é se a previsão tem ou não respaldo na Constituição Federal. O Supremo disse que não!
 
Olhar Jurídico - Quanto aos crimes de responsabilidade, os ministros mantiveram entendimento já resumido na Súmula Vinculante 46, segundo a qual a definição dos crimes de responsabilidade e o estabelecimento das respectivas normas de processo e julgamento são da competência legislativa privativa da União. O impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff influenciou no julgamento da matéria?
 
Rabaneda - Esta súmula nada mais fez do que reafirmar o que está na Constituição Federal. Não há nenhuma novidade nela. Sua edição decorre da necessidade de controle direto pela Suprema Corte dos atos que a violem.

Não! O impeachment de sua Excelência, a ex-Presidente da República, não influenciou de qualquer maneira no julgamento deste tema. O Supremo decide desta forma, quanto a este assunto, há anos.
 
Olhar Jurídico
- Em seu voto, o ministro Luís Roberto Barroso, destacou que existe uma “imensa demanda da sociedade por um pouco mais de decência no mundo político”.  Saindo da esfera das ações penais, Como o Tribunal Regional vem buscando suprir essa demanda pela decência no mundo Político.
 
Rabaneda - Eu acredito na política como meio capaz de mudar positivamente a sociedade. Sempre que vejo alguém criminalizar a atividade política, lembro-se de Pierre-Joseph Proudhon, filósofo Francês, para quem "a política é a ciência da liberdade".  Sem política não há progresso, seja ele social, cultural ou econômico. Portanto, o problema não está na política. Está nas pessoas que colocamos lá para fazer política. Esta responsabilidade é nossa, de cada cidadão. A Justiça Eleitoral tem feito um importante papel neste processo, que é o de barrar a candidatura de quem não preenche os requisitos legais. Agora, se cada cidadão não se conscientizar e procurar participar com responsabilidade da escolha dos nossos representantes, vamos ficar lamentando a falta de políticos decentes por toda eternidade. Quer ver um exemplo? Façamos uma pesquisa para saber quem se lembra o deputado estadual que votou na ultima eleição para este cargo. Tenho certeza que a grande maioria não se recorda, lamentavelmente.
 
Olhar Jurídico -  Indo além, considerando seu posto de membro do Tribunal Regional Eleitoral, explique qual é o procedimento (e diferenças para uma ação penal) para abertura de uma ação na Justiça Eleitoral contra governadores.
 
Rabaneda - A Justiça Eleitoral não detém competência para processar e julgar criminalmente Governador do Estado. Esta competência é do Superior Tribunal de Justiça, mesmo se tratando de crime eleitoral. Tem o Tribunal Eleitoral, isso sim, competência para processar e julgar as ações eleitorais.
 
Olhar Jurídico - Avalie, como membro do TRE, a decisão do Plenário do Supremo Tribunal Federal do último dia 4 de maio.

Rabaneda - Creio que a decisão do Supremo trará celeridade a esses processos que estão no STJ. Isso, do ponto de vista eleitoral, é positivo, pois quem merece ser absolvido deixa de ter essa suspeita incômoda, bem como aquele que merece ser condenado, sobrevindo decisão neste sentido, fica inelegível, restando afastado do processo eleitoral, pelo menos temporariamente.

Ulisses Rabaneda dos Santos é graduado em Direito pela Universidade de Cuiabá (UNIC) em 2004, especializou-se em Ciências Criminais, Criminologia e Política Criminal, pela Escola Superior de Direito de Mato Grosso - Instituto Professor Luiz Flávio Gomes (2005/2006) e atualmente está em fase de conclusão da nova especialização em Direito Processual Penal, com tese já apresentada em 2016, pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra - Portugal. 
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