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POLÊMICA

Com aval de juíza, Gaeco gravou ilegalmente conversa de desembargador com Silval, diz defesa

31 Mai 2017 - 16:10

Da Redação - Paulo Victor Fanaia Teixeira

Foto: Ass. TJMT

Marcos Machado

Marcos Machado

Fatos levantados pelas investigações do suposto esquema de grampos da Polícia Militar de Mato Grosso (PM-MT), entre 2015 e 2016, reacenderam um antigo mal estar jurídico. O Cabo Gerson Ferreira Gouveia Júnior, preso no último dia 23, acusado de atuar neste esquema, pode ser a peça-chave que faltava para o quebra cabeça do desembargador do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) Marcos Machado. Segundo apurações de sua defesa, pode ter sido este militar quem realizou pessoalmente o grampo de uma conversa telefônica feita entre o desembargador e o então governador do Estado, Silval da Cunha Barbosa, em 2015.

Esta conversa, revelada pela TV Centro América em setembro daquele ano, levou à uma série de investigações contra a conduta do magistrado, que supostamente agiria para beneficiar Roseli Barbosa, esposa de Silval, em um pedido de liberdade. 

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A polêmica veio à tona no dia 25 deste mês, quando durante sessão do Pleno do TJ, Machado declarou-se suspeito para conduzir a queixa-crime apresentada pela Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Mato Grosso (OAB-MT) para que seja apurada a suposta rede de grampos ilegais instalada na PM.

Segundo Machado declarou naquela sessão, desde quando arquivado o Procedimento Administrativo Disciplinar instaurado contra ele (PAD) procura elementos para acionar a justiça. “Agora consegui, finalmente. Um desses presos, o cabo (Gerson), era um dos responsáveis pelas interceptações também do Gaeco. Não se enganem vossas excelências. Agora o Gaeco está procurando dizer que o problema não é dele: ‘nós não temos nada com isso’. Esta pessoa (Gerson) estava ali presente e foi responsável por gravar, em um pen-drive, à pedido do chefe do Gaeco, justamente selecionando aquele trecho da então operação da esposa do governador”, afirmou.
 
“O áudio que estava lá foi captado de maneira absolutamente ilegal pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), por meio de barriga de aluguel”, declarou o advogado do desembargador, Joaquim Spadoni.

Ao Olhar Jurídico, ele evita garantir que moverá ação contra o então chefe do Gaeco, Marco Aurélio Castro, e a juíza da Sétima Vara Criminal, Selma Rosane Arruda, que segundo Spadoni, “autorizou o grampo”, mas garante estudar a possibilidade.

A defesa evita polêmica sobre o feito. “Vamos apurar esse caso com bastante cuidado, querendo ou não temos de um lado o desembargador e do outro um promotor e um juiz que podem ter cometidos faltas funcionais bastante graves”. Veja a entrevista abaixo, realizada na tarde desta quarta-feira (31).

De que modo a declaração de suspeição para julgar a queixa-crime da OAB-MT se relaciona com o grampo a que o desembargador foi vítima em 2015?

“Uma coisa está relacionada à outra, pois o desembargador foi vítima de uma barriga de aluguel, quando a imprensa publicou, logo após a prisão da Roseli Barbosa, em 2015, a conversa dele com Silval Barbosa, essa intercepção telefônica, que estava em segredo de justiça, era ilegal, ou seja, já era uma barriga de aluguel. O desembargador estava sofrendo sindicância no Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) e no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), sendo inocentado nas duas. Mais recentemente ele nos procurou para que estudássemos o caso dele”.

Por qual razão?

“Em razão de que o processo estava em segredo de justiça e qualquer áudio que estivesse lá não poderia ter sido vazado. Segundo, o áudio que estava lá foi captado de maneira absolutamente ilegal pelo Gaeco, por meio de barriga de aluguel. Na verdade ocorreu o seguinte: existia um pedido para grampear telefones de Roseli, mas também pediram para grampear outros quatro terminais (números telefônicos) que não era dela, sendo de seus três filhos e do então governador. Com isso, grampearam clandestinamente o governador e tiveram acesso àquela conversa que acabou sendo divulgada depois, entre o desembargador e o governador, gerando isso tudo. O que queremos agora é analisar os fatos, os documentos, as provas, para ver a viabilidade de uma ação, enfim, vermos a possibilidade de responsabilização tanto do promotor (Marco Aurélio) quanto da juíza (Selma Rosane Arruda)”.

Mas, qual é efetivamente a relação entre a declaração de suspeição para julgar a queixa-crime da OAB-MT e o grampo que o desembargador sofreu em 2015?

“Na realidade a OAB-MT fez uma queixa-crime para a apuração dos fatos noticiados, ninguém sabe, entretanto, até onde estas investigações irão chegar. Nesses fatos, por exemplo, existiam essas práticas de barriga de aluguel. Para evitar qualquer constrangimento ou mal entendido, assim como qualquer falta de parcialidade, o desembargador desde logo se manifestou suspeito. [Também para que não se alegue que ele é vítima dos grampos] e por isso conduz a ação de uma forma tendenciosa. O fato dele já ter sido vítima de uma prática lá atrás, que pode estar envolvido em um contexto maior, ele já se declarou suspeito”.

O Cabo Gerson, que se encontra preso, seria o responsável pelo grampo do Gaeco contra o desembargador?

“Essas são as informações que a gente tem, não conseguimos confirmar isso ainda. Mas a informação que nos chega por enquanto são essas, que ele parece ter admitido que realizasse esse grampo, são essas as avaliações que fazemos por enquanto. Vamos apurar esse caso com bastante cuidado, querendo ou não temos de um lado o desembargador e do outro um promotor e um juiz que podem ter cometidos faltas funcionais bastante graves”.

Como a defesa do desembargador avalia a possibilidade de um grampo ilegal realizado pelo Gaeco?

“Se confirmado, é decepcionante e escandaloso. Se o Gaeco, que deve fazer cumprir a lei, está violando a lei passa a se tornar tão bandido quanto o bandido”.

Qual seria o papel da juíza Selma neste grampo?

“Ela foi a juíza que autorizou o grampo, o MPE pediu e ela autorizou”.

Ela estava ciente que se trata de grampo ilegal?

“Essa questão a gente tem que avaliar com mais cuidado, não podemos fazer juízo de valor agora”.

Já há provas suficientes contra ela e o Promotor Marco Aurélio?

“Eu não disse de forma concludente que já temos provas para acionar um ou outro...”.

No discurso do desembargador, no Pleno, dá a entender que já há prova suficiente para acionar o promotor...

“Já temos provas que indicam fortemente a possibilidade de ajuizarmos ação contra todas estas autoridades envolvidas”.

O Cabo Gerson também será processado pelo Desembargador?

“A gente está analisando, mas no caso dos militares é mais difícil, pois eles cumprem ordens e a discricionariedade deles é bem pequena. Eles obedecem a uma hierarquia muito rígida. Precisamos avaliar essas situações com muito cuidado e só vamos dar um passo à frente, ajuizando a ação, quando estivermos plenamente convictos da atuação de cada um”.

De que modo a publicação do diálogo entre o desembargador e o então governador Silval Barbosa afetou sua carreira jurídica?

“Publicar na televisão uma ligação telefônica que está sob segredo de justiça é uma violação do direito constitucional. Outra coisa, a divulgação foi feita com a nítida intenção de violar a imagem do desembargador, da honra, de sua qualidade de homem honesto perante pares no TJ e gerar essa suspeição”.

O Grampo:

Reportagem veiculada pela TVCA em setembro de 2015 apresentou áudios interceptados mediante autorização judicial durante a “Operação Ouro de Tolo”. Nos áudios, o MPE viu indícios de tráfico de influência do ex-governador para tentar conseguir na Justiça a liberdade de Roseli (que permaneceu seis dias encarcerada) acusado de liderar um esquema quando exercia a função de gestora da Secretaria de Trabalho e Assistência Social (Setas) que resultou em prejuízo da ordem de R$ 8 mi aos cofres públicos. 

Ao ser questionado sobre a possível irregularidade pela emissora, Machado, negou qualquer ação ilícita, justificando o contato como algo pessoal, fruto de amizade. Um advogado de defesa da ex-primeira-dama também foi flagrado em uma suposta tentativa de articulação com o judiciário.

Ouro de Tolo: 

Roseli foi presa em 20 de agosto de 2015 e solta por decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em 26 de agosto. No entanto, no TJMT, durante distribuição do habeas corpus que buscava pela liberdade, o processo ficou sob relatoria do desembargador Rondon Bassil, que negou o pedido de soltura.

Marcos Machado:

Marcos Machado foi nomeado desembargador em abril de 2011, após ser escolhido pelo então governador Silval Barbosa em uma lista tríplice composta por membros do Ministério Público. Antes de ser nomeado para o Tribunal de Justiça, ele foi secretário de Meio Ambiente, Administração e Saúde do governo Blairo Maggi (PR), além de ter sido secretário de Justiça e Segurança Pública no governo de Rogério Salles (PSDB).

Grampos Ilegais:

A Justiça de Mato Grosso determinou a prisão do ex-comandante geral da Polícia Militar, coronel Zaqueu Barbosa e do cabo Gerson Luiz Ferreira Golveia Júnior, suspeitos de participação no esquema de escutas ilegais nos últimos anos. 
 
Conforme os autos, as prisões foram medidas necessárias para garantia da ordem pública, visto que ambos possuem laços sociais que facilitariam a destruição de provas.
 
Reportagem do programa Fantástico, da Rede Globo, revelou na noite do dia 14 de maio, que a Polícia Militar em Mato Grosso “grampeou” de maneira irregular uma lista de pessoas que não eram investigadas por crime nenhum no Estado. A matéria destaca como vítimas a deputada estadual Janaína Riva (PMDB), o advogado José do Patrocínio e o jornalista José Marcondes, conhecido como Muvuca. Eles são apenas alguns dos “monitorados”, dentre medicos, empresários, funcionários públicos etc.

Os grampos foram conseguidos na modalidade “barriga de aluguel”, quando investigadores solicitam à Justiça acesso aos telefonemas de determinadas pessoas envolvidas em crimes e no meio dos nomes inserem contatos de não investigados. Neste caso específico, as vítimas foram inseridas em uma apuração sobre tráfico de drogas.
 
A decisão pela prisão, do juiz da Vara de Crimes Militares, Marcos Faleiros, salienta ainda que a interceptações clandestinas geram intraquilidade por violação dos princípios básicos.

Coronel Zaqueu:

Era o comandante Geral da Polícia Militar de Mato Grosso em outubro de 2015, quando o então secretário de Estado de Segurança Mauro Zaque denunciou o esquema de interceptações telefônicas ilegais. Em dezembro de 2015, Zaque deixou a SESP e boatos davam conta de um desentendimento com o cel Zaqueu. Em maio de 2017, foi decretada prisão preventiva de Zaqueu como um dos mandantes do esquema de grampos.
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