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HC DE PAULO TAQUES

Com tese 'nula' e 'desastrada', Perri não esconde ânimo de julgar investigados, avalia defesa de Taques

08 Ago 2017 - 10:28

Da Redação - Paulo Victor Fanaia Teixeira

Foto: Reprodução

Ilton Norberto Robl Filho, advogado de Taques esteve no CCC neste fim de semana

Ilton Norberto Robl Filho, advogado de Taques esteve no CCC neste fim de semana

Já se encontra concluso para julgamento do ministro Reynaldo Soares Da Fonseca, da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o habeas corpus impetrado nesta segunda-feira (07) pela equipe de defesa do ex-secretário chefe da Casa Civil Paulo Zamar Taques. Em pedido de 48 páginas, os advogados Luiz Grandinetti Carvalho, Ilton Norberto Filho e Camila Torres de Brito apontam para a ilegalidade da prisão decretada pelo desembargador do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) Orlando Perri, caracterizando-a como “nula”, "ilegal", “excêntrica” e “desastrada”. Paulo Taques é suspeito de participar do esquema de grampos operado no Estado por policiais militares, por meio da modalidade “barriga de aluguel”. Entenda abaixo os argumentos da defesa:
 
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A equipe de Paulo Taques inicia atacando a tese de que o TJMT fosse o órgão mais competente para a condução das investigações envolvendo os grampos telefônicos.

Conforme Orlando Perri, há "conexão" entre os diferentes inquéritos sobre o caso, dentre os quais haveria um suspeito que ostentaria foro especial por prerrogativa de função, razão pela qual o TJMT seria a instância competente para decretar a prisão. A tese chegou a ser combatida pelo próprio Ministério Público Estadual (MPE), mas sem sucesso.
 
Para a defesa, trata-se de um equívoco que precisa ser reparado. Chega a citar a posição do MPE, referindo-o pelo termo ‘dominus litis’ (do latim, que significa "dono do litígio"). “Não há razão qualquer para o parecer do dominus litis não ter sido acolhido. Desse modo, conclui-se que a decisão foi proferida por órgão absolutamente incompetente, sendo a decretação de prisão absolutamente nula e, por tal razão, devendo ser cassada nesta E. Corte Superior, com expedição de alvará de soltura para o Paciente”.
 
Adiante, combate a apresentação dos fatos que explicariam a "conexão" entre as investigações.

Em sua decisão, Perri explica que tramita perante o TJ, sob sua relatoria, dois inquéritos policiais objetivando a apuração dos grampos ilegais, sendo um na esfera militar e outro no âmbito civil. Paralelamente, acrescenta o magistrado, a Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Mato Grosso (OAB-MT) apresentou Notícia-Crime, postulando a abertura de investigação criminal para apuração do esquema de quebra de sigilo ilegal de pessoas e autoridades neste Estado.

Portanto, conclui o desembargador, contraditando o MPE, há “patente conexão entre os procedimentos deflagrados – isto é, os que tramitam neste Sodalício, sob minha Relatoria, para apuração de crimes militares e não militares de investigados que ostentam foro por prerrogativa de função, e apuração da suposta participação de magistrados, com aquele que tramita perante a Corregedoria-Geral da Polícia Judiciária Civil –, uma vez que todos eles objetivam averiguar, em tese, a prática do crime do art. 10 da Lei n. 9.296/96 e de eventual associação criminosa”.

Acrescenta que outro fator determinante nestes autos seria a pessoa de Tatiane Sangalli, suposta ex-amante do ex-secretário. Ela foi interceptada sucessivamente em dois procedimentos distintos, o que demonstra “claramente”, conclui Perri, “a conexão dos fatos”.

Para a defesa de Paulo Taques, entretanto, a conexão entre feitos apresentada pelo juízo “é absolutamente carente de fundamentação, razão porque a referida avocação deva ser anulada”.

E explica: “não há nela sequer referência aos números dos autos que supostamente fariam com que o inquérito que tramita na origem devesse ser remetido ao 2º Grau de Jurisdição. É elementar que o controle da legalidade de uma decisão, depende, inafastavelmente, da demonstração dos pressupostos fáticos e jurídicos que lhe dariam lastro. O que se inicia, convenha-se, citando-se os autos que formalizam as diferentes frentes de discussão para respaldar a pretensa conexão”.

Assevera a defesa que Orlando Perri sequer citou os números dos autos que demonstrariam os fatos que ensejariam conexão.

“O máximo que se tem no caso em tela é a abstrata referência a outros casos que girariam em torno do tema dos grampos ilegais. Discussão que se torna inteligível sem a referência do número dos autos, e dos objetos específicos de cada um dos procedimentos. Novamente: sem que haja referência sequer aos autos, não se pode verificar se as assertivas correspondem à realidade, e se existem, nos autos em referência, elementos outros através dos quais se poderia infirmar as ponderações trazidas na decisão atacada”, consta do pedido.

Desmembramento da ação:

Atacando por outro flanco, o trio de defesa de Taques aponta que a jurisprudência usada por Orlando Perri para justificar a unificação das ações sob seu poder baseia-se em voto vencido do ministro Gilmar Mendes, em decisão colegiada do Supremo Tribunal Federal (STF). Lembra que, na ocasião, o mato-grossense defendeu que é justa a conexão quando “a prova de um crime tenha capacidade de influir na prova de outro delito”.

O que ficou pacificado para esta questão, entretanto, teria sido o oposto, alega a defesa, que cita questão de ordem do ministro Dias Toffoli, que em julgamento no Tribunal Pleno em 23/09/2015, assentou a seguinte diretriz: “O desmembramento do feito em relação a imputados que não possuam prerrogativa de foro deve ser a regra”.

Comparando este entendimento ao caso dos grampos para Paulo Taques, conclui a defesa, com boa dose de ironia: “Ora, não seria equivocado dizer que, mesmo sem a realização de uma pesquisa exaustiva sobre o tema, seria o primeiro caso no Brasil de um acusado responder a processo em foro privilegiado pelo fato de que, em autos apartados, supostamente conexos, e mesmo sem que tenha se demonstrado a prejudicialidade do desmembramento, haja autoridade com tal prerrogativa, que não foi denunciada ou sequer indiciada nesses autos paralelos. Trata-se de hipótese, no mínimo, excêntrica e, mais do que isso, absolutamente ilegal, no que diz respeito à avocação do inquérito e principalmente no que se refere à decretação da preventiva”.

A exceção para conexão entre investigações seria, citando autor estrangeiro, caso de “prejudicialidade lógica”, que só ocorre, explica a defesa, “quando a definição jurídica de uma infração depende da definição de outra. O critério é técnico. Não é uma carta branca ao julgador”, dispara.

Sem foro na denúncia:

A terceira ilegalidade apontada pela defesa de Taques diz respeito ao Coronel da Polícia Militar Airton Benedito de Siqueira Junior, Secretário de Estado de Justiça e Direitos Humanos na denúncia. Conforme explica a tese, seria exclusivamente ele o sujeito com foro por prerrogativa de função, e por tanto, o responsável por levar investigação para o TJMT e consequentemente, a ação que envolve Paulo Taques.

Entretanto, constata a defesa. O procedimento investigatório prévio “redundou em ação penal inaugurada por denúncia, que contemplou o Cel. PM Evandro Alexandre Ferraz Lesco, que depois disso, pediu exoneração, e não contemplou o Cel. PM Airton Benedito de Siqueira Junior”.

Conclui assim “que a autoridade com foro por prerrogativa de função não está mais sendo investigada na situação indicada pela decisão atacada, porque a denúncia já foi oferecida e não está sendo processada, pois a denúncia a ela não se refere!!”.

Conforme a defesa, a fundamentação utilizada por Orlando Perri para “driblar essa primária constatação é a de que, segundo se verifica na f. 33 da decisão atacada, apesar de ter sido oferecida denúncia contra réus preventivamente presos, as investigações continuam em face do Cel. Siqueira Júnior, que também seria autoridade com foro por prerrogativa de função”.

Sobre isso, a defesa de Taques se questiona: “Siqueira Júnior sequer foi indiciado nesse novo inquérito ‘pós-denúncia’. Assim, como se afirmar que está sendo investigado? Data vênia, não se pode emprestar efeito jurídico ao sentimento subjetivo do prolator da decisão de que ‘O Cel. Siqueira será responsabilizado por algo’ e, assim, poder se entender que está sendo investigado. Ora, o mínimo que se exige, para que possa afirmar que continua sendo investigado, é um indiciamento. O que inexiste na espécie”.

Sobre o termo “inquérito pós-denúncia”, a defesa define. “Não existe em nosso sistema processual penal” e ironiza. “Seria enfadonho se enfatizar a doutrina e a jurisprudência, que em uníssono, nos escudariam na questão”.

“Se estamos diante de investigação de novos fatos, que recairiam sobre a autoridade com prerrogativa de foro, deveria a autoridade coatora ter explicitado quais são esses fatos, qual relação eles tem com as demais investigações e por que não podem ser os demais julgados separadamente. Repita-se: algo fora desses parâmetros viola os limites legais”, avalia a defesa.

Ilegalidade na Prisão:

No aspecto da prisão, a defesa de Taques alega que ela foi decretada ilegalmente por ainda não haver qualquer ação penal em andamento, mas mera investigação. Explica:

“A reforma de 2008 do Código de Processo Penal introduziu regra que permite a decretação da prisão preventiva, no artigo 311. No entanto, a redação do dispositivo só o permite no curso de ação penal. Não havendo ação penal, é intuitivo que o Juiz não deva substituir os órgãos de segurança pública e de persecução penal, pois esta função não foi cometida ao Judiciário pela Constituição (artigo 144). No caso dos autos, a fase é de investigação. Não houve, nem se sabe se haverá ação penal, pelo menos no que toca ao paciente. Portanto, a prisão é ilegal e afrontosa ao sistema acusatório adotado pela Constituição, no artigo 129”.
 
Ausência de elementos:

Alegam os advogados que a prisão decretada por Perri contra Paulo Taques é ilegal, “pela absoluta ausência de elementos que possam indicar fundamentação concreta e suficiente que justifique a prisão cautelar”.
 
A defesa ainda lança uma pergunta: “Por que é que as únicas acusadas confessas das práticas ilegais que a todos são apontadas, além de não terem tido prisão decretadas, sequer foram indiciadas??”.
 
E, em outro quesito, lança dúvidas sobre os fundamentos da prisão de Taques, insinuando que o desembargador Orlando Perri já possuiria juízo formado sobre o caso em questão.
 
“Para dar fundamento concreto a tanto, ou seja, para demonstrar que o Paciente, em liberdade, voltaria a delinqüir e que sua prisão deveria ser decretada para evitar a prática de infrações penais, na f. 76 da decisão combatida, passa o Exmo. Des. prolator a tecer considerações a respeito do mérito da imputação. Como se verifica, sustenta a decisão no ponto de que é possível afirmar o elo entre Paulo Taques e o Escritório de Inteligência pela interceptação clandestina da Senhora Tatiane – a quem o Relator imputa o fato de ser sua ex-amante e de dois advogados, que seriam contendores do Paciente. O ponto só nos demonstra que o Relator já tem uma posição bem clara a respeito do mérito das acusações, e como não tem isenção de ânimo para processar e julgar o presente feito, com a máxima vênia”.
 
Cita trechos da decisão de Perri que comprovaria seu “ânimo” em processar e julgar Paulo Taques. “Alta probabilidade da existência de uma organização criminosa, que operacionalizou o simulado Núcleo de Inteligência da Polícia Militar para o cometimento de crimes”; “isso se compravaria através dos fortes laços que o irmana ao Cel. Zaqueu e ao Cel. Siqueira, de sabença pública e notória”.
 
Combate a defesa: “tais argumentações demonstram o pré-julgamento do Prolator da decisão. Contudo, entre estes elementos e a probabilidade de cometer novos crimes, não há, data vênia, qualquer nexo”.
 
E insiste no argumento: “É o que se vê do final das fls. 77 da decisão, quando assevera a decisão que d) “o grupo criminoso trabalhou incisivamente em prol dos interesses de Paulo Taques, sobretudo no que tange à interceptação telefônica clandestina”. Ainda afirma a decisão combatida que e) “o sistema sentinela (utilizado para a prática dos grampos ilegais) até o momento não foi apreendido, havendo a probabilidade de estar operando, a pleno vapor”. O afã do Prolator da decisão de pré-condenar o Paciente chega ao ponto de obnubilar a própria acusação: não se tratam de interceptações ilegais escondidas, mas interceptações supostamente inseridas em procedimentos judiciais em trâmite, as barrigas de aluguel. É disso que se acusa o paciente e os demais envolvidos nos procedimentos correlatos. O que a não apreensão do sistema sentinela tem a ver com isso? E mais: o que tem a ver estes pontos com a probabilidade de delinqüir, se posto em liberdade?”.
 
Direito de defesa:
 
Por fim, a defesa lança luz sobre o trecho em que Perri faz a seguinte constatação:
 
“Estou a me referir ao inquérito policial instaurado para apuração da prática do crime de interceptação telefônica clandestina, supostamente ocorrida na eleição municipal de 2016, em Lucas do Rio Verde, onde o então Chefe da Casa Civil, ao tomar conhecimento de acusações contra sua pessoa, ao invés de aguardar sua intimação para ser ouvido e apresentar sua versão sobre os fatos, resolveu, por bem, e, a meu entender, de maneira completamente abusiva, contra-argumentar os fatos que aportaram aos autos, passando de suspeito para vítima, com a inconcussa intenção de desviar o foco das investigações”.
 
A fundamentação apresentada acima foi caracterizada como “desastrada” por lançar “da argumentação de que o Paciente não poderia se valer do seu direito de defesa para, nitidamente e inequivocamente, embaraçar as investigações”.
 
Acrescenta problematização à temática do Estado Democrático de Direito: “Causa-nos constrangimento afirmar, mas deve ser dito: determinar a prisão de alguém porque contra-argumentou os “fatos que aportaram aos autos” é uma afirmação tão perigosa para o Estado Democrático de Direito, que, na hipótese desta Corte Superior não declarar a ilegalidade de tal assertiva, teríamos a porta para se cassar o direito de defesa em inquéritos policiais no Estado do Mato Grosso. No entender da decisão, deveria o Paciente aguardar, resignadamente, ser chamado ao inquérito. E se o chamamento fosse uma prisão preventiva, como essa que ora se combate, fazer o que...”.
 
Pedido:
 
A defesa pede o reconhecimento e a decretação da nulidade do feito, desde a sua origem, por ofensa ao princípio do Juiz Natural, a fim de confirmar a liberdade do Paciente, assim como declarar nulos todos os demais os atos praticados pela autoridade coatora.
 
Também, o reconhecimento da incompetência do TJMT, “tendo em vista que este Egrégio Superior Tribunal de Justiça deveria analisar a existência eventual de conexão”. Em último caso, o “reconhecimento da falta de fundamentação dos elementos utilizados para se invocar o periculum libertatis na decisão combatida, confirmando assim a liberdade do Paciente”.
 
Entenda o Caso:
 
Paulo Taques deixou o cargo de chefe da Casa Civil em 11 de maio de 2017, quando já se ventilava a informação de que o programa Fantástico, da Rede Globo, estava em Cuiabá para fazer uma matéria, que veio a ser publicada três dias depois, sobre o esquema de grampos ilegais operados por PMs em Mato Grosso. Paulo Taques sempre afirmou que já havia pedido para sair do governo e que a proximidade das datas era mera coincidência.
 
Paulo estava no cargo desde o início do governo, em janeiro de 2015, e anunciou na ocasião que voltaria a se dedicar à sua atividade profissional na advocacia, inclusive reassumindo o papel de advogado pessoal do governador Pedro Taques (PSDB). Paulo Taques foi coordenador jurídico da coligação ‘Coragem e Atitude Para Mudar’, liderada por PSDB, PDT e PSB, em 2014, que elegeu o seu primo para a chefia do Poder Executivo, no primeiro turno.

Oficialmente, o Paiaguás anunciou na ocasião que Paulo havia concluído sua missão no governo, de organizar as rotinas e articulação internas e criar canais permanentes de amplo diálogo do Executivo Estadual com os demais poderes e a sociedade.
 
A reportagem do Fantástico do dia 14 de maio revelou que a Polícia Militar em Mato Grosso “grampeou” de maneira irregular uma lista de pessoas que não eram investigadas por crime nenhum no Estado. A matéria destaca como vítimas a deputada estadual Janaína Riva (PMDB), o advogado José do Patrocínio e o jornalista José Marcondes, conhecido como Muvuca. Eles são apenas alguns dos “monitorados”, dentre medicos, empresários, funcionários públicos etc.
 
Os grampos foram conseguidos na modalidade “barriga de aluguel”, quando investigadores solicitam à Justiça acesso aos telefonemas de determinadas pessoas envolvidas em crimes e no meio dos nomes inserem contatos de não investigados para serem monitorados irregularmente. Fantástico voltou a trazer matéria sobre os grampos em 23 de julho, apontando informações trazidas por Mauro Zaque, ex-secretário de Segurança Pública do Estado e promotor de Justiça, autor da denúncia sobre os grampos.
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