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DECISÃO INÉDITA

Para fugir de criminoso, Unemat transfere sem provas ao IFMT aluna vítima de estupro

16 Ago 2018 - 16:16

Da Redação - Paulo Victor Fanaia Teixeira

Foto: TJMT

Defensora Rosana Leite

Defensora Rosana Leite

O Instituto Federal de Mato Grosso (IFMT), provocado pela Defensoria Pública, quebrou o protocolo e tomou decisão administrativa inédita no Estado. À pedido do Núcleo de Defesa da Mulher Vítima de Violência de Cuiabá (Nudem), o Instituto permitirá que uma estudante de engenharia florestal da Universidade de Mato Grosso (Unemat), violentada sexualmente, termine a graduação longe de onde o crime foi registrado.

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Abalada pelo abuso, a acadêmica deixou a cidade de Alta Floresta, onde vivia para estudar, em maio deste ano, após o estupro. Ela voltou para a casa da família e seus pais procuraram ajuda da Defensoria para que ela não perca a única coisa pela qual ela ainda teria interesse, a faculdade.

"Ela ficou em estado de choque desde o crime e não voltou para a cidade. O acusado da violência é conhecido em Alta Floresta, e ela que é a vítima, teve mudar toda a dinâmica de sua vida, deixar para trás o sonho, para garantir sua integridade física, moral, emocional. Ela não tem condições de voltar. O IFMT foi sensível ao caso, percebeu que estaria perpetuando a violência, caso negasse apoio à garota", disse a coordenadora do Nudem, defensora pública Rosana Leite.

A diretora de graduação do IFMT, Marilane Alves Costa, informa que logo que tomou conhecimento da solicitação de Rosana, abriu um processo administrativo para identificar vagas no curso de engenharia florestal. O campi de Cáceres indicou a disponibilidade e a diretora conta que pela gravidade e complexidade da situação, o pedido da Defensoria foi avaliado pela reitoria com base em preceitos legais humanitários, considerando o extraordinário da situação.

"Ficamos muito sensibilizados com essa história e fizemos o que podíamos para ajudar a estudante. A nossa preocupação, como uma instituição pública de ensino que tem um protocolo de seleção tradicional para admitir seus alunos, foi a de não criar um precedente para aqueles que desejam o menor esforço. Este caso é ímpar e a gravidade dele, coloca em risco a vida de uma pessoa. E foi isso que levamos em consideração para tomar a decisão", explicou Marilane.

Rosana afirma que a solução relativamente rápida para o problema, sem que a Defensoria tivesse que entrar com ações na Justiça é um dos elementos no processo que merecem ser festejados. "A possibilidade de resolvermos problemas graves, de forma legal, é infinita e percebemos neste caso que a vontade de ajudar uma pessoa, um mulher, em situação de vulnerabilidade, fez toda a diferença no processo", explica a defensora.

Um inquérito foi instaurado em Alta Floresta para apurar o caso e está na fase final. A defesa da estudante é feita pelo defensor público que atua na comarca, Paulo Marquezini. O laudo de lesão corporal, que indicaria se ela sofreu violência, já estaria pronto.

Fato:

A estudante teria sido abusada na madrugada de 08 de maio, ao deixar uma festa em que estaria com colegas da faculdade. Ela foi encontrada em estado de choque, por pessoas que passavam próximas a um matagal, no final da tarde de domingo (09). O IFMT, além da vaga no curso de graduação, também fará o acompanhamento psicológico e social da estudante.

A coordenadora do Nudem, Rosana Leite, afirma que casos como o da estudante não são raros, mesmo 12 anos após a publicação da Lei 11.340/2006, criada para punir com maior rigor o agressor de mulher em ambientes domésticos, familiares e sociais.

"É triste verificar que o Atlas da Violência de 2018 traz números alarmantes de estupros no Brasil, registrados em 2016. Naquele ano as polícias dos estados receberam registros de 49.497 casos e o mais chocante, em metade deles, as vítimas são crianças. A lei está em vigor, mas a realidade não acompanha as regras. Por isso, precisamos falar sobre esse assunto", afirma a defensora.

Desde o dia 7/8, quando a lei completou 12 anos, até hoje, Rosana fez três palestras e concedeu 13 entrevistas para tratar do assunto. "Além do trabalho rotineiro, fazemos essas intervenções para alertar a população de que estamos muito longe de respeitar os direitos humanos e os direitos de mulheres na infância, adolescência e idade adulta. E isso é grave e deve ser considerado", afirma.

O segundo subdefensor público-geral de Mato Grosso, Caio Zumioti, afirma que a iniciativa da defensora está alinhada com as atribuições da Defensoria Pública no país, ampliadas com a Emenda Constitucional número 80/2014, com a Lei Complementar 80/1994 e com a Lei Complementar 132/2009.

"Desde de 2014, cabe a nós fazer a defesa dos direitos humanos de pessoas carentes, em situação de vulnerabilidade social. E se fazemos isso de forma extrajudicial, a experiência indica que é a melhor forma, pois a solução é alcançada em menor tempo, evitando que novos danos sejam causados. Se a defensora entrasse na Justiça, com uma ação solicitando essa vaga, a estudante teria que esperar mais, o que poderia agravar seu estado emocional. Precisamos atuar dessa forma cada vez mais", avalia.
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