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Terça-feira, 16 de abril de 2024

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“Meu filho queria salvar vidas e teve o sonho roubado”, diz mãe de jovem morto após treinamento com Ledur

Foto: Rogério Florentino / Olhar Direto

“Meu filho queria salvar vidas e teve o sonho roubado”, diz mãe de jovem morto após treinamento com Ledur
Jane Patrícia Lima, mãe do soldado Rodrigo Claro, morto em 2016 após participar do curso de formação do Corpo de Bombeiros, foi ouvida nesta sexta-feira (14) na Décima Primeira Vara Criminal Militar no Fórum de Cuiabá e, emocionada, narrou o que sua família passou.

O processo é contra a tenente Isadora Ledur, acusada de torturar e causar a morte de Rodrigo Claro. No mesmo dia também foram ouvidos o pai de Rodrigo, Antônio Claro, e Maurício Júnior dos Santos, um ex-aluno que também teria sido torturado por Ledur.
 
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A última ouvida no dia foi a mãe de Rodrigo. Jane narrou o dia em que seu filho foi parar no hospital após passar pelo treinamento de Ledur. “Eu não conseguia ver meu filho. A enfermeira me perguntava ‘vc quer ver o Rodrigo?’, e eu não tinha forças. Não conseguia me mover”, disse.

Jane disse que ficou por cinco dias ao lado do filho e que tentava conversar com ele, mas Rodrigo estava inconsciente. O jovem deu entrada no hospital no dia 10 de novembro e no dia 15 de novembro, no fim da manhã, ele morreu. Ele teria passado por uma sessão de “caldos” aplicados por Ledur no dia do treinamento de travessia a nado, na Lagoa Trevisan.

Maurício, um ex-aluno que também teria sido torturado pela tenente, narrou o que sofreu ao juiz e ao Ministério Público.

“No dia, na lagoa, ela pediu para gente fazer o 'corridão'. Aí teve punição porque não conseguimos fazer no tempo que ela pediu. Nos puniu com polichinelo e etc, e todos ficaram exaustos, aí ela pediu para iniciar a prova. A gente começou a travessia e começou a me dar câimbra, eu não aguentava mais, aí meu parceiro começou a me ajudar", relatou Maurício.

Na sequência, ele diz: "Aí me trouxeram uma bóia, para facilitar minha travessia. Num determinado momento ela falou que era para todo mundo sair de perto e parar de me ajudar, aí ela me chamou até ela. Eu já sabia o que iria acontecer, porque já tinha acontecido antes, eu já estava ‘prometido’ que seria pego por ela. Ali todos sabem quem tem dificuldade, ela já fazia estes procedimentos. Chegando até ela, ela mandou eu passar a corda da bóia debaixo do meu pescoço e segurar a bóia embaixo do meu braço, e foi então que ela começou a me afogar. Ela me puxava na corda, o que ela fez com o Rodrigo fez a mesma coisa comigo. Eu falei ‘pelo amor de Deus para porque tu vai me matar’ me segurei nela, aí ela: ‘cê tá louco aluno, você está encostando em mim, aí ela voltou a me afogar’".

Depois desta sessão Maurício foi parar no hospital. A mãe dele, Terezinha Cervo, disse que se assustou ao ver o estado do filho.

“É complicado tu ver o teu filho no estado em que eu vi o meu, o que ela fez com ele não se faz. Eu ver ele com o pescoço marcado, porque foi estrangulado, do jeito que eu vi, o branco do olho dele era sangue quando chegou em casa, não conseguia segurar um copo d’água na mão. Eu acho muito doloroso, porque acabou com o sonho dele e estamos sofrendo até hoje por causa disso”.

Jane Patrícia Lima, mãe de Rodrigo, em seu depoimento ainda disse que o que seu filho passou afetou a toda a família. O pai do jovem também é tenente dos bombeiros. Jane diz que seus outros filhos agora têm medo de militares por causa do que aconteceu com Rodrigo.

“Meu filho tinha o sonho de salvar vidas e teve o sonho roubado. Não só os dele, mas dos irmãos. Hoje meus filhos vêem uma viatura e saem correndo. Eles olham a farda do pai e dizem ‘papai eu não quero mais o senhor usando isso’. Eles viram o irmão, que brincava e ensinava, ser morto por maldade”.

Jane disse que durante os 25 anos em que seu marido atuou como bombeiro ele nunca contou alguma situação semelhante à que Rodrigo passou. Ela ainda disse que ouviu dos médicos que se seu filho sobrevivesse seria com sequelas.

“No sábado, eu conversei com um médico que estava na UTI e ele me disse ‘se o Rodrigo sair dessa situação ele vai ficar totalmente dependente, ele não vai mais movimentar parte nenhuma do corpo, ele não vai ouvir, falar. Se ele tiver a sorte de sair, ele vai ficar vegetando’”.

Emocionada Jane ainda lembrou a última coisa que ouviu do filho no dia do treinamento. “Sabe a última palavra que ele me disse? Mãe, eu te amo”.

“Eu não consigo entender. Eu peço a Deus que me de essa resposta. Pra que eu possa viver. Até hoje, já vai fazer dois anos, eu não sei o que é mais viver”, disse Jane.

 
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