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Terça-feira, 23 de abril de 2024

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JUSTIÇA RESTAURATIVA

Juiz defende Justiça "humanizada" para diminuir reincidências em casos de violência doméstica

Foto: Rogério Florentino Pereira/ Olhar Direto

Juiz defende Justiça
O juiz Jamilson Haddad Campos, da 1ª Vara Especializada de Violencia Doméstica e Familiar Contra a Mulher de Cuiabá, lida diariamente com casos de famílias destruídas. Já com muitos anos de experiência na magistratura, ele observa que o atual sistema adotado pelo Estado para o combate à violência não tem atendido os anseios da sociedade. O magistrado defende a ampliação da Justiça Restaurativa, que possui uma abordagem mais humanizada e visa a reparação do dano à vítima, bem como a recuperação e reinserção do réu na sociedade.
 
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De acordo com o juiz, em 2018 o Estado de Mato Grosso foi o segundo mais violento para as mulheres no Brasil. Ele atribui este cenário a vários fatores, mas o principal deles é a cultura machista.
 
“É a visão que o homem tem, como se ele fosse dono da mulher, impondo as suas regras, limitando inclusive a liberdade, dificultando a convivência, às vezes, das mulheres com seus familiares. Mas também não podemos desconsiderar fatores de elevado índice de desemprego, um elevado consumo de substancia entorpecente, que tem atingido todas as classes sociais no Brasil e infelizmente em Mato Grosso também. Mas o Brasil registra essa base patriarcal onde o homem se considera superior as mulheres dentro do próprio convívio”, disse o juiz.
 
Este é um problema, segundo o magistrado, que atinge todas as camadas da sociedade. Ele avalia que existem alguns fatores que fazem com que os dados apontem uma predominância de casos de violência doméstica em famílias mais humildes, apesar de que na realidade mulheres de todas as classes sofrem.
 
“A violência doméstica não tem classe social, afeta todas as camadas da sociedade. Evidentemente que você vê uma estatística que aponta mais casos em classes mais humildes. Mas isso é porque por vezes as pessoas de classe média alta, de padrão alto, por questões patrimoniais não registram essa violência e mantém a família, com muito sofrimento, com muita violência, com muita dor. Por questões patrimoniais elas por vezes seguram até quando dá para depois levar ao conhecimento do Judiciário. Mas nós temos tido vários casos de famílias abastadas, pessoas de alto padrão, que incorrem na pratica de violência doméstica”.
 
Segundo o magistrado, o Poder Judiciário de Mato Grosso tem investido em métodos para aprimorar a resolução de conflitos, como na promoção de cursos de capacitação, projetos de conscientização, entre outras medidas. O juiz defende a Justiça Restaurativa, pois busca a não reincidência e a possibilidade de reintegração social.
 
“A Justiça Restaurativa olha de maneira diferente o atual sistema penitenciário. O sistema que rege vigente hoje é o sistema primitivo, onde o transgressor é visto como inimigo do Estado, e o Estado pune esse agressor e manda para o sistema penitenciário, com raras exceções, sem programas de reinserção social no interior desses presídios. Ele vê a vitima apenas como informante, a vítima não tem fala, não participa da relação processual e não tem como objeto principal a reparação do dano”, explicou.
 
O juiz entende que o atual sistema penitenciário não atende os anseios da sociedade, que atualmente funcionam como instituições de “profissionalização do crime”, tendo um efeito contrário ao objetivo inicial, que é a ressocialização.
 
“No sistema penitenciário tradicional o Estado vê o agressor como se fosse inimigo, e o trata como inimigo. Inimigo geralmente você abate. As pessoas precisam ser vistas como pessoas, porque esse transgressor depois que sair ele vai voltar a ser seu vizinho, vai voltar a frequentar a mesma calçada que o seu filho, vai poder estar no mesmo shopping ou até pedindo esmola na porta da sua casa”.
 
“Eles precisam sair com uma transformação, melhor do que quando entraram no sistema penitenciário, porque senão é uma incoerência, uma falta de inteligência do próprio Estado que pune. Manda para a cadeia e ele vai sair de lá mais violento, ou seja, você paga caríssimo para manter um preso, porque o sistema penitenciário é caro, você tem a sociedade pagando um elevado valor e quando ele estiver em liberdade vai voltar mais especializado nas práticas delituosas. A sociedade não quer que haja pessoas presas e nem que haja criminosos nas ruas, ela não quer ser vítima da violência”.
 
Uma alternativa eficiente, segundo ele, é justamente a Justiça Restaurativa. O objeto principal dela é a reparação do dano e o foco é fazer com que a sentença seja dialogal, de acordo entre as duas partes.
 
“A Justiça Restaurativa olha o transgressor como um agente que tem participação no processo de sentença e ela traz como fator principal a vítima, ela é personagem principal nessa composição da sentença. A vítima geralmente entra em depressão, fica com medo de sair às ruas quando ela passa por violência, tem dificuldade de romper esse padrão. Na Justiça Restaurativa ela é chamada e ela pode falar diretamente para o transgressor toda aquela dor que ele causou em sua vida, que implicou na vida dos filhos dela, se fez com que ela fosse para os hospitais, de que forma ela sentiu dor. Isso é extremamente importante para a construção dessa sentença, dessa composição penal”.
 
“Eu acho a Justiça Reparativa uma ferramenta moderna extraordinária pela potencialidade de permitir que os transgressores saiam com reinserção social, saiam preparados, conscientes, rompendo o padrão inconsciente de violência tomando uma posição de uma personagem, produzindo, reparando o dano e saindo de maneira transformada. O que é mais importante para a sociedade é que a pessoa encaminhada para o sistema penitenciário saia transformado”, finalizou o juiz.
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