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Quinta-feira, 28 de março de 2024

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entrevista

Ex-juiz do TRE critica pontos da reforma política e pede fiscalização severa de "caixa 2"

Foto: Arthur Santos da Silva - Olhar Direto

Ex-juiz do TRE critica pontos da reforma política e pede fiscalização severa de
O ex-juiz do Tribunal Regional Eleitoral (TRE), advogado José Juiz Blaszak, especializado em direito eleitoral, fez críticas ao projeto que prevê a reforma política no país. O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, marcou nova reunião de líderes para a próxima segunda-feira (25), às 18 horas. Na pauta, está a confirmação dos procedimentos para a votação da reforma política. A semana será dedicada exclusivamente à apreciação da matéria.

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Para Blaszak, no entanto, o projeto apresenta diversos pontos que precisam ser debatidos com maior intensidade, especialmente em audiências públicas com a sociedade.

Conforme o jurista, o principal ponto que torna inviável a aprovação do projeto ainda este ano refere-se às eleições de 2016, quando prefeitos e vereadores serão escolhidos pela sociedade. “Mais uma vez, as eleições municipais serão palco de experimentação”.

Olhar JurídicoComo o senhor avalia a votação do projeto que prevê a reforma política ainda neste ano para que tenha validade já no pleito de 2016?

José Luiz Blaszak - Novamente as eleições estão prestes a acontecer. Um ano e quatro meses das eleições municipais e novamente temos uma reforma batendo à porta. Novamente as eleições municipais serão palco de experimentação.

OJQuais medidas deveriam ser tomadas para evitar questionamentos?

JLB – Quando se fala em uma reforma política ou ainda uma reforma política com reflexos no processo eleitoral, ela deveria ter um tempo maior de discussão, um tempo maior de estudo do texto do projeto, com diversas representatividades. O Congresso Nacional vai dizer, especialmente o presidente da Câmara, que houve várias audiências públicas para essa discussão, mas as audiências públicas, eu participei de algumas, são direcionadas. A audiência pública que realmente vai trazer uma conseqüência positiva é aquela que permite a representatividades da sociedade trazer seus textos de proposições.

OJ Como o senhor observa todo o contexto da reforma política?

JLB – Vejo com bastante medo essa reforma novamente em véspera de eleição e novamente em véspera de eleição municipal, carregando nos candidatos o peso de ser um palco experimental das reformas que o Congresso Nacional nos propõe.

OJ Um dos principais pontos do projeto diz respeito ao fim da reeleição.

JLB - Nós temos no texto a proposta que é a vedação da reeleição para os cargos do Poder Executivo, porém fixando mandato de cinco anos, e os mandatos de cinco anos são para todos os cargos, Executivo e Legislativo, inclusive para o Senado.

OJEssa proposta é plausível?

JLB - Isso merece uma crítica, porque quando o (ex-presidente) Fernando Henrique Cardoso trouxe a ideia da reeleição, se falou em uma ideia casuística, ou seja, Fernando Henrique Cardoso está propondo a reeleição para se beneficiar. Ficou essa imagem para a nação. Mas aí, todos se beneficiaram da reeleição. Agora, novamente, parece que a proposta da proibição da reeleição é casuística, pelo momento político que se atravessa, pelo desgaste da figura da presidente da República.

OJ Então a reforma pode ser considerada um pretexto para beneficiar quem está no poder?

JLB - A minha crítica é severa no seguinte sentido: um país do tamanho do nosso não pode servir de pretexto para o casuísmo de um governo. Porque um governo não vai bem, temos que mudar a Constituição para proibir a reeleição. Agora o próximo que entra acerta o pé, vamos mudar a Constituição de novo para permitir a reeleição porque o governo é bom. Os casuísmos têm que ser banidos do processo institucional eleitoral, político. Se me perguntar fora dos casuísmos, eu acho que de fato o melhor são cinco anos mesmo, sem reeleição. Precisamos amadurecer a ponto de saber do que realmente o nosso país precisa doa a quem doer, com situação que precisa de uma mudança imediata ou em médio prazo, nós temos uma Constituição que não se modifique conforme o governo que está a frente.

OJ A reforma vai atender os “clamores” da sociedade, que saiu às ruas?

JLB - O Congresso está com um olho no parlamento e um olho na sua base. Então, aquilo que ele está ouvindo em cada Estado, é realmente o maior ponto de relevância para o congressista. E eu acho que as vozes das ruas, e a sociedade é essa voz, grita por um momento de mudança na questão da reeleição. E a questão do mandato do parlamentar, eu tenho a impressão que a sociedade ainda não entendeu suficientemente o que é um voto distrital, o que é o distritão, se ele é misto, e isso é algo que pode ser um ponto cego na discussão e o resultado disso na discussão do Parlamento pode não representar de fato o que a sociedade espera.

OJ O que diz o projeto sobre as coligações?

JLB – Há a possibilidade de acabar com as coligações, só permitindo a coligação na majoritária, ou seja, prefeito, governador e presidente. Para o parlamento não haveria mais coligações, seria exatamente na ordem dos mais votados. Aí vem a dúvida. Se ela vai ser um distrital puro, e aí é a lista dos mais votados mesmo, ou se vai ser algo misto. Porque de repente pelo fato de ainda não termos tido essa experiência do distrital, poder votar uma proposta do misto, ou seja, uma parte é nesse sentido dos mais votados, e uma parte no sistema antigo. O confuso é essa administração. Por exemplo, quem seriam os suplentes? Ou mesmo no distrital, quem é o suplente? Porque senão eu tenho uma lista dos mais votados, mas aí como é que eu faço isso na proporção do distrito?

OJ Por qual motivo o Judiciário entra no processo eleitoral?

JLB – O TSE, a cada eleição, baixa uma resolução. O Judiciário não tem que ter força legislativa. Mas o parlamento, muitas vezes, não se encarrega de apresentar para a sociedade e para os candidatos uma legislação forte, clara, objetiva e que dê segurança. Então acontece que cada caso, dependendo da repercussão que tem, o Judiciário acaba dando maior atenção ou menor atenção. Muitas vezes vemos uma interpretação de um caso não fundamentada na legislação e sim na jurisprudência, porque a cada dois anos muda a composição dos tribunais e muda a forma de olhar a legislação precária que nós temos. Temos uma legislação fraca, capenga e realmente arcaica, e muitas vezes mal feita. Assim, damos a oportunidade para o Judiciário fazer a interpretação conforme a sua convicção daquele texto mal feito. Por isso, muitas vezes vamos ter discussões homéricas, a partir da jurisprudência.

OJ O senhor poderia dar um exemplo?

JLB - O maior exemplo da legislação mal feita é a questão da improbidade administrativa, com dolo, na lei da Ficha Limpa. Ninguém sabe com certeza como se deve julgar a inelegibilidade fundamentada na improbidade. Porque improbidade administrativa só tem uma esfera, que pode julgar na essência, que é a Justiça comum. A Justiça eleitoral, o Tribunal de Contas, muito menos, têm competência para avançar no mérito da improbidade. Só podem fazer uma análise dos enquadramentos. Mas às vezes isso já é um adiantamento como se fosse um julgamento de mérito daquilo que não é de sua competência.

OJ E sobre a redução da idade mínima para ocupar o cargo de senador da República?

JLB – No texto vamos ter também a redução da idade mínima exigida para o cargo de senador, que cai de 35 para 30 anos. Não tenho nenhuma crítica, nem positiva, nem negativa, porque é um cargo sim da alta câmara, talvez quase na ideia da equiparação ao presidente da República, mas a gente já viu jovens parlamentares ocupando a Câmara dos Deputados e mesmo chegando ao Senado com muita propriedade, inteligência.

OJComo fica a questão dos financiamentos de campanha?

JLB - Sobre os financiamentos de campanha, a proposta é uma limitação dos valores e ainda permitindo a participação da pessoa jurídica, mas com uma limitação. E também com uma participação dessas contribuições exclusivamente para os partidos e os partidos fariam as divisões. Não permitiria a doação para candidatos diretamente.

OJ O que muda na prática?

JLB - As contribuições vão para os partidos e claro que o que muda na prática é que os partidos ganham mais força na prestação de contas e na distribuição dessas cotas. Quando você tem a contribuição direta para o candidato, o candidato tem a maior força de negociação em busca do recurso. Então se o candidato tem um bom relacionamento com o partido, o partido recebe e pode repassar para ele dentro daquela cota.

OJEm sua opinião, como deveria ser a proposta?

JLB - A proposta deveria ser no sentido de proibir a doação de pessoas jurídicas, até pelo texto constitucional que fala que o voto é do cidadão. Então tem aquela história, empresa não vota. Ainda que pudesse votar pelo seu representante, o interesse dela seria exatamente o que nós vemos há muito tempo no processo licitatório. Mas nada disso eu vejo que pode se transformar no melhor método de financiamento de campanha, que seja só privado, somente público, ou que seja misto.

OJ Qual a medida correta então?

JLB – Você pode criar qualquer modo de financiamento de campanha. Se você não tiver um país com uma fiscalização rígida do caixa dois, nada disso adianta. Então, a transparência, o equilíbrio, a igualdade que o texto da proposta da emenda constitucional quer, ela não vai ser alcançada pelo financiamento de A, B ou C. Ela vai ser alcançada quando tiver uma fiscalização eficiente do caixa dois. É o caixa dois que desequilibra a eleição. O caixa um, o legal, ele desequilibra porque, por exemplo, eu tenho uma captação de recurso de R$ 5 milhões para uma eleição de vereador e meu adversário tem R$ 100 mil. Ainda que eu crie um sistema legal que diminua essa desigualdade, limitando, por exemplo, que uma eleição a vereador possa ter um caixa de R$ 500 mil, se não tiver fiscalização severa do caixa dois, nada disso adianta.
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