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Sexta-feira, 29 de março de 2024

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Tramitação recorde

Procuradores acusam deputado Valtenir de manobrar para acabar com as Procuradorias dos Estados

Foto: Rogério Florentino Pereira/OD

Procuradores acusam deputado Valtenir de manobrar para acabar com as Procuradorias dos Estados
A presidente da Associação dos Procuradores do Estado de Mato Grosso (Apromat), Glaucia Amaral, acusa o deputado federal Valtenir Pereira (PROS-MT) de manobrar para obter a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 80/2015, que trata das atribuições das Procuradorias Gerais dos Estados (PGE) em todo o país. Menos de uma semana após ser apresentada, a PEC já está na pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara Federal desta terça-feira (7).

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A procuradora destaca que o texto proposto por Valtenir tira das PGEs a exclusividade para dar consultoria jurídica aos Estados, e pode até mesmo impedir as procuradorias de fazer a defesa de autarquias estaduais. “A Constituição Federal prevê duas funções paras as PGEs: dar orientação jurídica e exercer a representação judicial do Estado. A Assembleia Constituinte de 1988 entendeu que é preciso ter unicidade, ou seja, a orientação jurídica tem que casar com a defesa. Por isso um único órgão, a PGE, é responsável por fazer as duas coisas na esfera estadual”, explicou Glaucia.

“A PEC 80 enfraquece e reduz as atribuições da PGE, pois permite que advogados, que não tenham passado em concurso para procurador, possam emitir pareceres para o Estado. Na verdade, ela também retira da PGE a atribuição de defender as autarquias, pois o texto diz que essa atribuição será ‘privativa de advogados organizados em carreira’, ou seja, os procuradores não poderão mais fazer isso. Essa PEC é muito mal escrita. Além de não ter clareza, ignora completamente os princípios que regem o interesse público e a defesa do interesse público”, completou.

“Manobra”

A procuradora se mostrou indignada com a forma com que o deputado colocou a PEC em tramitação, e classificou o ato como “manobra”. Isso porque ele prometeu à categoria que votaria contra a PEC 373/2013 na CCJ, que trata da transposição de cargos da administração pública para as procuradorias, com equiparação salarial. De fato, Valtenir votou contra essa proposta, porém, em seguida, apresentou a PEC 80/2015, que altera as atribuições dos procuradores.

“Ele apresentou a PEC 80 no dia 1º de julho, e aproveitou o plenário cheio para votação da redução da maioridade penal para recolher assinaturas de apoio. Depois, ele apensou esse texto à PEC 373, que já estava pautada para entrar na CCJ, de modo que uma semana depois de apresentada a PEC 80 já está na pauta da CCJ, na sessão das 14h desta terça. E pior, ele colocou na justificativa da PEC e disse aos deputados que a Anape (Associação Nacional dos Procuradores dos Estados e do Distrito Federal) era favorável à proposta. Mas isso é mentira”, afirmou Glaucia.

Em nota, a Anape negou concordar com as PECs 373 e 80, e defendeu a exclusividade das atribuições das PGEs. “A Anape [...] torna público que também empenhará todas as forças pela inadmissibilidade e rejeição da novel PEC 80/2015”, diz trecho da nota. A categoria está mobilizada em Brasília, nesta terça-feira (7), para acompanhar a votação na CCJ e tentar convencer os deputados a rejeitarem a proposta.

Mudança de carreira

A presidente da Apromat destacou, ainda, que em Mato Grosso existe uma carreira da área meio do Estado, a de Técnico da Área Instrumental do Governo (TAIG) com perfil advogado, que exige inscrição na OAB. Porém, Glaucia lembrou que as outras carreiras da área meio também exigem inscrição no conselho de classe, como contador, psicólogo, entre outras. Se a PEC for aprovada, eles passariam a ter a atribuição de dar consultoria jurídica ao Estado, hoje exclusiva dos procuradores.

“Esses advogados têm a pretensão de se tornar advogados públicos, porém a prova deles é muito diferente da prova do concurso para procurador, e no edital estava especificado que eles trabalhariam na área meio. Com todo o respeito a essa carreira, essa mudança não é justa com a população, porque o cargo é diferente”, disse. O salário inicial de TAIG é de R$ 4,7 mil e pode chegar a R$ 15,3 mil no final da carreira. Já o salário dos procuradores varia entre R$ 24,8 mil no estágio probatório até R$ 30,4 mil no final da carreira.

Glaucia Amaral ainda citou um texto do Antigo Testamento para explicar a ação de Valtenir. “Ele arranjou uma solução salomônica para a questão. Assim como o Rei Salomão, ele decidiu partir a criança ao meio. E o que acontece? A criança morre. O deputado Valtenir tentou negociar os princípios das PGEs, mas só piorou a situação. O texto que ele apresentou é muito pior que a PEC 373”, afirmou.

Texto da PEC

A PEC 80 acrescenta o artigo 132-A à Constituição Federal, e os parágrafos 1º, 2º e 3º ao artigo 69 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT). Além de Valtenir, assinam a autoria da PEC 80 os deputados Márcio Marinho (PRB/BA), Sérgio Souza (PMDB/PR) e João Campos (PSDB/GO). Clique para acessar o texto da PEC 80/2015 na íntegra.

O artigo 132-A proposto pela PEC tem a seguinte redação: “No âmbito das autarquias e fundações públicas, dos Estados, Distrito Federal e Municípios, os cargos efetivos de assistência, assessoramento, consultoria jurídica e de representação judicial e extrajudicial, serão privativos de advogados, organizados em carreira, cujo ingresso dependerá de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases”. Já as alterações nas disposições transitórias preveem a transposição desses funcionários que prestarem assistência, assessoramento e consultoria jurídica para as procuradorias, sendo proibido que eles exerçam a representação judicial.

Outro lado

A reportagem tentou contato por diversas vezes com o deputado federal Valtenir Pereira, porém, ele não atendeu nem retornou as ligações.

Na justificativa da PEC, Valtenir afirmou que o texto “é fruto de amplo acordo e discussão tida com os representantes das associações nacionais dos Procuradores (ANAPE) e dos Advogados Públicos (ABRAP), quando da análise da PEC 373, de 2013, na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC)”.

Ele afirma, ainda, que “o dispositivo deixa claro que nas autarquias e fundações públicas, dos Estados, Distrito Federal e Municípios, em face da autonomia funcional dessas entidades”. Ele diz, ainda, que “o dispositivo confirma os servidores que exercem essas atividades como verdadeiros ‘advogados públicos’, tornando o cargo ‘exclusivo de advogados’, o que pressupõe prévia inscrição na OAB”.

Atualizada às 14h45.

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