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PUNIÇÃO A JUÍZES E MP

Câmara aproveitou comoção por acidente da Chapecoense para aprovar lei imoral contra juízes e MP, diz Selma

30 Nov 2016 - 11:07

Da Redação - Paulo Victor Fanaia Teixeira

Foto: Rogério Florentino Pereira/OD

Selma Rosane Arruda

Selma Rosane Arruda

“É um desrespeito contra a vontade da população”, comentou a juíza da Sétima Vara Criminal, Selma Rosane Arruda, sobre a aprovação, na Câmara dos Deputados, na madrugada desta quarta-feira (30), de emendas ao pacote de medidas anticorrupção. Especialmente uma delas: a que prevê punição a juízes e membros do Ministério Público (MP) por abuso de autoridade. A magistrada concedeu nova entrevista ao Olhar Jurídico, na manhã desta quarta-feira (30), para avaliar as mudanças trazidas na calada da noite ao texto original do projeto e adianta: Deputados “aproveitaram a comoção por conta do acidente aéreo (com o time do Chapecoense nesta terça-feira (29)” para aprovarem o texto “imoral”.

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A proposta de emenda, feita pela bancada do PDT, foi aprovada já madrugada de hoje, por 313 votos favoráveis, 132 contrários e 05 abstenções. A alteração inclui possibilidades de punição especificamente voltadas a magistrados e promotores do MP. Por exemplo, passaria a ser crime qualquer ação do juízo que seja interpretada como abuso de autoridade, com penas que poderão variar entre 06 meses e 02 anos de prisão, além da possibilidade de réus processarem juízes e promotores por danos materiais, morais ou à imagem.

“Estou furiosa”, não esconde a magistrada Selma Arruda, "essas medidas foram aprovadas na calada da madrugada, quando o povo e a imprensa voltaram foco ao acidente aéreo (tragédia com o time do Chapecoense, quando o avião se acidentou em Medelin, na Colômbia, vitimando 76 pessoas, incluindo 21 jornalistas). Eles aproveitaram esta cortina que se formou, quando eles deixaram de ser o foco. Aproveitaram o momento para inserir essa regra de criminalização de juízes e promotores. É como você chegar a um restaurante e pedir arroz, feijão, bife e batata frita, mas o cara te trás um prato de jiló, você terá que comer e ainda pagar pelo jiló!”, critica. 

Mudanças:

“Eles não aprovaram as medidas que combatem a prescrição”, disse. Adiante criticou algumas situações que a emenda aprovada poderá trazer. “A mudança dificultará o sequestro judicial de bens do réu”, medida que garante o ressarcimento do erário, em casos de desvio; “Conseguiram neutralizar o projeto das ’10 medidas contra a corrupção’, do MP. Das 10 medidas, restaram apenas 04 intactas”, exclama. “Também querem impedir que a imprensa acompanhe o andamento dos processos, através destas alterações”, adianta.

“Eles usaram o véu dos ‘supersalários’ e dos ‘juízes corruptos’ para forjar essa ideia e mascarar o projeto. Ora, já existe lei para abuso de autoridade e ela vale para todos, incluindo juízes e promotores”, explica Selma.

"Aprovaram que juízes e promotores deverão pagar indenização ao réu caso ele seja absolvido, dano moral. Aprovaram a criminalização, ou seja, será crime se eu receber uma denúncia sem indícios suficientes. Agora, qual é o seu conceito de indício suficiente? Qual o seu conceito de indício suficiente? A ideia é inserir muito subjetivismo, para ter espaço para inserir malícias e você conseguir seu intento criminoso por trás disso. Agora, se o promotor oferecer uma denúncia com indícios suficientes do crime e o juiz aceitar essa denúncia e vai ser processado e ainda vai ter que pagar indenização para o sujeito no final. Está bom para você? Eu não estou brava à toa, não estou brava mais ou menos, estou furiosa”.

“É um prejuízo tão grande que não tem como mensurar”: 

“A verdade” - prossegue Selma em seu desabafo - “é que eles (os deputados) estão morrendo de medo da delação premiada da Odebrecht. Que quando vier será um tsunami. Mas com essa emenda Sérgio Moro (juiz do Paraná) vai virar réu em 5 segundos!”.

A juíza, por fim, não vislumbra esperança. “O projeto vai ainda para o senado, o que é pior. As chances de aprovarem são ainda maiores”.

Sobre os deputados mato-grossenses envolvidos na aprovação da emenda, promete “por a boca no trombone”. “Eu tenho aqui a lista de todos que votaram a favor e eu vou jogar na rede. Porque isso não é coisa que se faz. Eles iludiram o povo, legislaram em causa própria e com interesses não republicanos”.

A possibilidade de ação contra TJ e MP foi incluída no parecer do relator Onyx Lorenzoni (DEM-RS), dentro da tipificação do crime de responsabilidade, que hoje atinge apenas membros do Supremo Tribunal Federal (STF), ao procurador-geral da República, além do presidente, ministros, governadores e secretários de Estado.

Os partidos DEM, PSDB, PROS e PHS liberaram suas bancadas para voto livre. Já PPS, Rede, PV e PSOL orientaram pela aprovação da emenda. Apenas um deputado criticou a ocasião da aprovação do projeto. “É um erro, é inoportuno”, disse Carlos Sampaio (PSDB-SP), criticando a votação na “calada da noite”.

A força-tarefa da Lava Jato compartilha da magistrada Selma Arruda, e divulgou nota condenando a possibilidade de a Câmara "atentar contra a independência do Ministério Público e do Poder Judiciário". Eventual punição a membros do jurídico foi avaliada como "tentativa de aterrorizar procuradores, promotores e juízes em seu legítimo exercício da atividade de investigação, processamento e julgamento de crimes, especialmente daqueles praticados nas mais altas esferas de poder".
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