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Terceirização: bom para os grandes melhor para os pequenos

Otávio Celidonio

 Nossa sociedade ignora pequenas contravenções e, por isso, frequentemente criamos leis que não podem ser cumpridas na prática.

O Projeto Lei da Terceirização (4.330/2.004) pode ser um desses exemplos, caso as atividades fins das empresas não sejam consideradas passíveis de serem terceirizadas, como defendem abertamente partidos da base governista e a Central Única dos Trabalhadores.

Sim, a Lei da Terceirização pode ser um avanço para grandes empresas e, certamente, dará mais flexibilidade para a nossa economia em momentos de crise. Mas os maiores beneficiados da liberalização total da terceirização seriam os micro e pequenos empresários.

Na agricultura isso fica evidente. Hoje, milhares de pequenos agricultores não têm condições de ter empregados e máquinas agrícolas. Quando chega a época de colheita e o volume de trabalho aumenta, boa parte precisa recorrer a contratações de serviços terceirizando a atividade fim.

Para muitos é isso o que precisa ser feito ou arrendar suas áreas para alguém que possa fazer todas as operações.

Um estudo realizado recentemente pelo Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea) apontou que um produtor de soja, que utiliza um parque de máquinas padrão, teria que cultivar ao menos 272 hectares para não ter prejuízo com os custos operacionais.

Mesmo assim existem outros custos e, ao colocarmos na ponta do lápis, para ser competitiva, individualmente, a escala de produção tem que ser muito maior. É claro que o ganho de escala não é algo infinito, mas para a soja, por exemplo, os cálculos apontam que a partir de 6 mil a 7 mil hectares o aumento da área já não traria uma redução significativa dos custos fixos.

Ainda assim, é possível fugir da lei da escala de produção e ser competitivo, mas não sozinho.

Pensando nisso, há mais de dois anos entreguei – como conclusão do curso do MBA em Administração com ênfase em Cooperativismo pela FGV/OCB-MT – um plano de negócios sobre uma cooperativa de operações agrícolas mecanizadas.

O plano passou e até atraiu a atenção de potenciais cooperados, mas naquela data descobri que a nossa legislação não permitiria construir uma empresa com o fim de executar serviços que poderiam ser a atividade fim dos cooperados. Uma pena.

Segundo o Incra, o Brasil possui 3,81 milhões de propriedades rurais, sendo que 74% dessas têm menos de 50 hectares. Quando falamos de empresas, os números do Sebrae apontam que 99% das 6,4 milhões de empresas são consideradas micro ou pequenas.

Apesar de a lei garantir o direito amplo dos trabalhadores, permitindo que eles recorram à empresa terceirizadora, caso a terceirizada não cumpra com suas obrigações, a aprovação ampla da lei está sendo claramente barrada pelo medo de que as grandes empresas abusem dos direitos dos trabalhadores, justamente aquelas que estão na mira da fiscalização do Ministério do Trabalho.

Na prática, quem é contra a Lei da Terceirização não confia na capacidade do governo em fiscalizar e punir exemplarmente quem comete irregularidades e, por isso, prefere o risco de manter pequenos empresários e produtores rurais no limbo da lei.

Bonito na teoria, mas impossível na vida real. Já vimos esse filme milhares de vezes no Brasil e ainda insistem em nos colocar nesse caminho.



*Otávio Celidonio é superintendente do Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea) – otavio@imea.com.br
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