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Quinta-feira, 28 de março de 2024

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SUIÁ MISSÚ

"Grampo" revela que ruralista pagaria R$ 30 mil a advogado da CNA fazer relatório da PEC 215

Foto: José Medeiros - Fotos da Terra

Conversas telefônicas interceptadas pela Polícia Federal com autorização judicial revelam a interferência de produtores rurais na tramitação do PEC 215, a Proposta de Emenda Constitucional que transfere do Poder Executivo ao Congresso Nacional a palavra final sobre a demarcação das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios.

Na gravação, cujo conteúdo transcrito foi divulgado pelo Ministério Público Federal, o presidente da Associação dos Produtores Rurais de Suiá Missú, Sebastião Prado, teria planejado, segundo o MPF, o pagamento de R$ 30 mil a advogado ligado às entidades do setor produtivo que, supostamente, seria o responsável pela elaboração, em parceria com o deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), do relatório da PEC 215, na Comissão Especial que aprecia a PEC na Câmara dos Deputados.

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De acordo com a Procuradoria Regional do MPF em Mato Grosso, no diálogo interceptado, Sebastião afirma que “o cara que é relator, o deputado federal que é o relator da PEC 215, quem tá fazendo pra ele a relatoria é o Rudy, advogado da CNA, que é amigo e companheiro nosso”.

A conversa foi gravada durante as investigações sobre a atuação de grupo de pequenos produtores rurais que foram retirados da Gleba Suiá Missú, no Araguaia, local transformado pela Funai na Terra Indígena Marãiwatsédé, da etnia Xavante, no nordeste de Mato Grosso.

Sebastião Prado foi preso dia 7 de agosto pela PF em sua residência, em Goiânia, acusado de roubo, formação de quadrilha, sequestro, cárcere privado, incêndio, entre outras acusações.

A operação foi deflagrada pela PF e pelo MPF por determinação da Justiça Federal de Barra do Garças. Na ocasião, outros líderes do movimento foram presos no município de Alto Boa Vista, entre eles o ex-presidente da associação, um ex-vereador e a vice-prefeita do município.

Segundo o MPF, o grupo recebia recursos de apoiadores de outros Estados para financiar suas atividades, inviabilizando a efetiva ocupação do território pelos índios. Ainda segundo o MPF, a influência do movimento de resistência extrapolava os limites de Mato Grosso e influenciava, também, conflitos na Bahia, Paraná, Maranhão e Mato Grosso do Sul.

Inicialmente, Sebastião Prado foi preso temporariamente, mas em requerimento apresentado à Justiça Federal no dia 11 de agosto, o MPF sustentou que a manutenção da prisão de Sebastião Prado tutela o “direito fundamental a um ordenamento jurídico constitucional estabelecido de modo legítimo, livre de interferências indevidas, segundo os princípios democráticos e republicanos que devem fundamentar a conformação ética, política e jurídica da sociedade brasileira”.

O MPF acrescentou que "o fato de a conduta da liderança ruralista direcionar-­se a corromper a edição de ato normativo destinado a transformar a própria ordem constitucional é circunstância sobremaneira gravosa, a exigir do Poder Judiciário medida capaz de obstar tal situação, ameaçadora do próprio estado de direito e da ordem republicana e democrática".

Ao apreciar o requerimento do MPF, a Justiça Federal entendeu que o lobby no âmbito do Congresso Nacional é um aspecto inerente ao próprio processo político, sendo que, a princípio, nada há de mais em se tentar influenciar o relator da PEC 215. Ainda assim, o juiz afirmou em seu despacho que “o problema reside exatamente no meio utilizado para se efetuar o lobby, no caso mediante pagamento ao advogado (ou assessor) responsável pela elaboração do parecer, envolvendo inclusive a Confederação Nacional da Agricultura – CNA”.

O magistrado federal acrescentou ainda que “o fato de o relatório da PEC 215/2000 ter sido, supostamente, 'terceirizado' para a Confederação Nacional da Agricultura (CNA), representa, a princípio, um desvirtuamento da conduta do parlamentar responsável pela elaboração da PEC, eis que a CNA é parte política diretamente interessada no resultado da mencionada PEC”.

Ao final da decisão que decretou a prisão preventiva de Sebastião Prado, a Justiça Federal ressaltou que “o objeto da PEC é exatamente poder rever a demarcação de terras indígenas já consumadas como é o caso de Marãiwatsédé, o que justifica a atitude do investigado e demais pessoas, ao tentarem a todo custo – segundo informações do MPF –, permanecer na área da reserva indígena, em total afronta a decisão judicial, transitada em julgado, na mais alta Corte deste País, no caso o Supremo Tribunal Federal”.

Diversas diligências investigatórias ainda estão em curso, sendo que os documentos relacionados à possível participação de parlamentares federais no caso foram remetidos à Procuradoria Geral da República. (Com informações do MPF/MT)

Atualizada e corrigida às 17:00

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