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Opinião

Respire e fique em casa

Enildes Corrêa

O período pandêmico exige da sociedade o distanciamento social como medida preventiva para conter a transmissão do coronavírus, até que a população esteja devidamente imunizada pela vacina contra a covid-19 e a pandemia seja estabilizada.
 
No mês de março, após um ano de pandemia, o Brasil registrou seguidamente a terrível marca de mais de 3.500 mortes em 24 horas. A média diária de mortes subiu para mais de 2.500. Ainda assim, infelizmente, parte da sociedade brasileira parece não dar importância nem se comover com essa tragédia, que tomou proporções de filme de terror em nosso país.
 
O negacionismo continua com muito espaço e, dessa forma, vidas e mais vidas são colocadas em risco todos os dias, uma vez que muitos seguem a desinformação das fake news que circulam em incontáveis grupos das redes sociais, como Whatsapp, com extrema rapidez.
 
Por outro lado, a comunidade científica e parte da população, conscientes do grande perigo que ronda a vida neste panorama pandêmico, clamam para que todos sigam as recomendações prescritas pela ciência –por amor à própria vida e à do próximo. A hashtag 'stayhome' ou 'ficaemcasa' ganhou força na web e o movimento de cuidar de si para refletir no coletivo cresceu: 'não é sobre si, é sobre todos'.
 
Enquanto a gravidade da infecção pelo coronavírus for negada e não houver uma unificação de forças em nível nacional para combater o avanço do vírus, este se propaga rapidamente com o movimento sem controle das pessoas, tornando-se um rio caudaloso, que draga vidas, deixa mortos, feridos e espalha intenso sofrimento dentro das famílias atingidas com vítimas fatais pela covid-19. O número de órfãos em consequência da pandemia é de sangrar o coração dos que se sensibilizam com a dor do próximo, dos que se colocam no lugar do outro.
 
Ficar em casa tornou-se uma escolha que salva vidas nestes tempos dolorosos. Quem tem condições, fica em casa e, assim, contribui com quem precisa sair todos os dias em função dos deveres profissionais. Esse entendimento deveria ser tão natural diante da ameaça à vida, não é mesmo? Na natureza, o animal, quando se sente acuado, o instinto de sobrevivência é ativado e o faz se proteger do perigo.
 
Todavia, para conseguir manter a maioria da população em casa, têm sido necessários decretos normativos do Poder Público com imposição de medidas de restrição de circulação e até lockdown. Ainda assim, há resistências impensáveis, infrações das mais diversas e nas várias esferas da sociedade.

 
A situação de negação às ações prescritas pela ciência assemelha-se a um hospital em que os médicos morrem e os pacientes ficam entregues nas mãos de pessoas despreparadas para cuidar da saúde de enfermos. O que acontecerá à vida dos pacientes nessa condição?
 
Entretanto, dizem os mestres da sabedoria universal que, atrás de cada desafio, de cada dor, existe o potencial de florescimento espiritual. Para as pessoas ancoradas no sensível e que enxergam a realidade tal como é, certamente, abre-se um portal de compreensão e sabedoria, que permitirá viver em estado de atenção plena e harmonia interior.
 
Atrás do chamado para ficar em casa, desconectar temporariamente do mundo externo, da velocidade da pressa, e conectar com o ambiente doméstico, há a possibilidade de muitos adentrarem também em sua casa interior, não raro, pouquíssimas vezes visitada, olhada, acolhida e transformada num lar onde reina o amor.
 
Para este momento que escolho denominar de recolhimento – e não de aprisionamento, conforme o definem alguns –, sinto soarem perfeitas as palavras do Mestre espiritual indiano Kiran Kanakia:
 
"Você precisa ir para si mesmo e não para alguém ou algum lugar. Você tem que somente encontrar a si próprio. Sente-se consigo mesmo. Somente relaxe, sem querer mudar nada, sem querer melhorar ou alcançar alguma coisa. Seja gentil consigo. Diga sim para si mesmo. Apenas tenha algum tempo para si".
 
E nesta Páscoa, em especial, assumamos o compromisso com a vida que nos habita e que ressuscita em cada respiração com atenção plena. Feliz Páscoa!


Enildes Corrêa é administradora, terapeuta, professora de Yoga e orientadora de meditação com formação na Índia. 
 
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