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Opinião

A imprescindível palavra Pessoa

Paulo Wagner

Durante nossa caminhada nessa dobra cósmica de existência muitas pessoas entram e saem de nossas vidas, da mesma maneira que entramos e saímos da vida delas, num processo mútuo e imprescindível de interação. Dependendo do nível de relação que soubermos construir, podemos ficar juntos com outras pessoas até o apagar da chama que nos mantém biologicamente vivos. Há quem diga que esses encontros não são obra do acaso, possuem um porquê, uma razão subjetiva que muitas vezes não sabemos dimensionar. Há quem diga até que são reencontros.

Cada pessoa que encontramos tem características próprias, escolhas próprias, uma maneira singular de sentir e reagir frente à vida e às circunstâncias do mundo que encontram. E apesar das afinidades e semelhanças, as pessoas nunca são iguais. Por termos uma sensação intuitiva de incompletude podemos descobrir no outro aquilo que falta em nós. A alteridade nos faz mais inteiros e o modo de ser do outro pode nos ensinar a sermos pessoas melhores, só precisamos ter humildade para perceber em nossos semelhantes as competências, qualidades e virtudes que ainda não temos, humildade para aprendermos com o outro aquilo que ainda não sabemos.

Pessoas também nos ensinam a ver além de nós mesmos, nos ensinam a ter empatia, que é a capacidade de nos colocarmos no lugar do outro, percebendo seus anseios, suas tristezas e alegrias, suas limitações e potencialidades, sua humanidade. A empatia é sempre uma oportunidade de aprendizagem, de diálogo, autoconhecimento e valorização das diferenças. Com ela podemos descobrir que precisamos das pessoas bem mais do que imaginamos. Por mais paradoxal que possa parecer nosso mundo individual só existe diante do contraste com o mundo do outro.

Um pensador russo de nome Bakhtin disse que o uso da palavra como meio de interação humana traz em sua essencial o dialogismo, ou seja, nossos discursos só fazem sentido em diálogo com outros discursos, sejam eles afinados ou não com nossa maneira de pensar e de dar sentido ao mundo. Fora do diálogo social o sentido, e o estilo de cada tipo de discurso seriam imperceptíveis.

Nesta travessia de aprendizado, diálogo e convivência com as pessoas que encontramos em nossa vida, é bom que não tenhamos sentimentos extremados de apego, aversão ou indiferença, uma vez que tudo é transitório e o caminho do meio é o caminho da sabedoria. É importante não esquecermos que todos somos impermanentes e já não somos a mesma pessoa, o mesmo eu que éramos há décadas, horas e minutos. Nossas células já não são as mesmas, nossa maneira de agir, sentir e pensar já se transformou consideravelmente.

Por isso, não devemos ter uma imagem preconcebida e estanque das pessoas que nos cercam, pois tudo está em constante transição, todas as pessoas são passageiras do tempo e a vida é professora. Todos temos um caminho grande pela frente para superar os condicionamentos de uma mente sofredora, as limitações de um eu que não se enxerga, ainda, além de si mesmo. Um eu que ainda não descobriu os vínculos de interrelação fundamentais que precisamos ter para garantir nossa sobrevivência em comunhão com os outros e a natureza, os vínculos de nossa condição humana a nos unir de alguma maneira, mesmo que esta maneira ainda não seja igualitária, respeitosa, solidária e verdadeiramente fraterna como precisa ser.

Precisamos mais que nunca olhar para as pessoas ao nosso redor com compreensão e amorosidade, ter atenção plena para perceber que pessoas são milagres vivos, acontecendo sob o nosso olhar. Precisamos estar com as pessoas sabendo que de uma hora para outra elas podem transpor o espelho, deixando guardada em nós apenas a lembrança de seu sorriso. Precisamos saber que pessoas são únicas e que o mundo seria estranho, repetitivo e enfadonho se todas as pessoas fossem iguais.


Paulo Wagner é Escritor, Jornalista e Mestre em Estudos de Linguagem e Literatura
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