Opinião
Provando que o RGA não é aumento
André Yonezawa Fernandes
Ano após ano, a discussão sobre o Reajuste Geral Anual (RGA) dos servidores públicos reaparece no noticiário e nos corredores da administração. O governo costumeiramente trata a questão como se fosse um “aumento de salário” capaz de desestabilizar as contas públicas, e parte da sociedade passa a enxergar no instituto um privilégio indevido.
Previsto no inciso X do artigo 37 da Constituição Federal, o RGA é um direito assegurado a todos os servidores públicos. Consiste em um mecanismo de recomposição do poder de compra, e não em sinônimo de aumento salarial. A palavra-chave é revisão: uma atualização que impede que os salários de hoje se transformem em vencimentos minguados amanhã. Um exemplo prático ajuda a ilustrar:
O subsídio de um professor na classe A, nível 1 (o de ingresso na carreira), em 2015 era de R$ 1.958,50 para 30 horas semanais de trabalho. Hoje, o subsídio de um professor na mesma posição de carreira, com a mesma carga horária, é de R$ 3.671,84. Um “aumento” de aproximadamente 87% em dez anos. À primeira vista, não parece tão ruim. Entretanto, o ponto central é: qual foi a inflação acumulada entre 2015 e 2025?
Para apurar isso, podemos utilizar o índice IPCA, que aponta aproximadamente 75%. Para chegar a esse número, utilizamos a calculadora disponibilizada pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso, popularmente conhecida como “Siscalc”, no meio jurídico.
E qual o resultado de aplicar a correção monetária pelo índice acima ao subsídio inicial de um professor de 2015 até hoje? Aproximadamente R$ 3.425,00. Ou seja, na prática, os professores tiveram um aumento real quase inexpressivo ao longo da última década.
Não se trata de mera questão contábil: é o carrinho de supermercado mais vazio, o remédio mais caro, o lazer que deixa de caber no orçamento familiar. O debate, no entanto, costuma se perder no terreno da política, e quando sindicatos e associações de servidores públicos lutam pela implementação do RGA, frequentemente enfrentam críticas infundadas da opinião pública.
Essas críticas nascem da incompreensão, alimentada pelo desconhecimento técnico e pela falta de transparência nas discussões sobre política remuneratória. Nessa toada, governos pintam o RGA como ameaça às finanças e o transformam em moeda de troca com os servidores: ora o concedem sob um discurso amistoso, ora o negam sob o pretexto de crise.
A realidade é que o reajuste anual é uma questão de justiça e respeito ao texto constitucional, não de privilégio, e garantir a sua implantação significa valorizar profissionais essenciais para o funcionamento do Estado e para a prestação de serviços públicos de qualidade à população.
André Yonezawa Fernandes de Souza é advogado em Cuiabá.