Quando os dançarinos fantasiados de personagens como Fofão, Kiko e Chiquinha passam pelas ruas de bairros periféricos de Cuiabá e Várzea Grande, crianças e adultos gritam enlouquecidas a cada mortal ou passo de dança executado. Em algumas situações, os moradores se emocionam com o ônibus cheio de luzes e o sentimento de alegria que se espalha com a passagem do Trenzinho Tsunami, que nasceu no bairro Novo Mundo, em Várzea Grande.
“As crianças se divertem demais, porque é algo que não é da realidade da periferia, não há tanto contato com coisas culturais. Então é algo mágico, tem crianças que choram e adultos que se sentem realizados. Não tem briga, é uma coisa segura para se divertir, você pode pular e gritar para os dançarinos. O pessoal gosta bastante”, conta Ana Beatriz da Silva, filha dos proprietários do Trenzinho Tsunami.
O "trenzinho da alegria” várzea-grandense é um dos que surgiram Brasil afora com o sucesso da Carreta Furacão, criada em Ribeirão Preto (SP). A premissa é a mesma: ao som de batidas extremamente animadas, os dançarinos fazem piruetas, dão “sarradas no ar” e levam o público à loucura.
Quando Ana Beatriz viu um trenzinho do tipo pela primeira vez passando no bairro Novo Mundo, em Várzea Grande, onde mora com os pais, viu a possibilidade de mudar a realidade financeira da família. Antes do Trenzinho Tsunami, ela e os pais trabalhavam vendendo açaí e espetinho na região.
“Dei a ideia para os meus pais, mas de início eles não gostaram muito, falaram que não tinham dinheiro. Duas semanas depois eles me contaram que tinham comprado um ônibus, porque não tinha condições de comprar uma carreta. Demoramos uns cinco meses para deixar ele pronto e começar o serviço”.
A primeira vez que o Trenzinho Tsunami rodou foi no bairro onde foi criada. Ana Beatriz lembra que, até ela e os pais adquirirem experiência no novo ramo de trabalho, passaram algumas dificuldades como falta de público ou dificuldade para achar dançarinos que soubessem fazer as piruetas características da Carreta Furacão.
No início, a própria jovem se arriscou nas apresentações. Mesmo sem conseguir dar um moral ou outras estripulias, Ana Beatriz brinca que se garantia no quesito dança. No entanto, ela exalta a importância do trabalho dos quatro dançarinos que trabalham de quinta-feira a domingo correndo e dançando pelas ruas de Várzea Grande ou Cuiabá.
“A gente não sabia nada. Nunca conseguimos dar mortal, nunca tentei também, porque sei que não teria capacidade nessa parte dos mortais e piruetas. Eu usava muito a fantasia de Fofão e Chiquinha. Na parte da dança eu conseguia me virar. Foi uma experiência legal”.
Na primeira vez que o ônibus iluminado e com músicas animadas rodou pelo bairro Novo Mundo, em Várzea Grande, dezenas de pessoas saíram das casas para acompanhar. Como fazia muito tempo que algo do tipo não acontecia na região, todos ficaram extasiados.
Iago decidiu trabalhar no Trenzinho Tsunami depois de ver dançarinos passando pelo seu bairro em VG. (Foto: Arquivo pessoal)
“Foi assustador, porque a gente ainda não sabia nada, mas o Trenzinho Tsunami mudou a realidade da minha família, como sempre trabalhamos no setor alimentício, começamos a lidar com coisas novas. Foi um processo difícil, porque não é sempre que os bairros tem público e que vai render o suficiente”.
Além de rodar pelos bairros, a equipe do Trenzinho Tsunami atende eventos particulares, como aniversários, confraternizações e despedidas de solteiro. Ana Beatriz conta sobre a surpresa de uma noiva ao ser buscada pelos dançarinos fantasiados e da animação de uma criança que, apaixonada pela Carreta Furacão, fez uma festa de aniversário com o tema.
“O pessoal gosta bastante, porque é algo muito diferente para se ter em uma festa. É uma surpresa para os convidados. Já fizemos um aniversário que a criança era apaixonada por esses trenzinhos, chegamos lá e ela estava fantasiada de Fofão. As crianças gostam muito e nem sabem da onde vem o personagem. Para eles, o Fofão é da Carreta Furacão”.
Capoeira e Carreta Furacão
Em uma das vezes em que o Trenzinho Tsunami passou pelo bairro Parque do Lago, em Várzea Grande, a animação dos dançarinos e o brilho das luzes coloridas do ônibus arrebataram Iago Costa, de 17 anos. Ele conta que estava na academia, mas tomou coragem e saiu para perguntar sobre o trabalho para um dos dançarinos.
Na época, o Trenzinho Tsunami precisava especificamente de pessoas que soubessem dar moral, algo que é essencial na Carreta Furacão. Iago tira de letra as piruetas do tipo, já que tem experiência com capoeira. Depois de passar pelo teste, recebeu a notícia de que tinha sido aprovado.
Dançarinos fantasiados fazem alegria de crianças e adultos em Cuiabá e Várzea Grande. (Foto: Reprodução)
“Acho que tinha uns 14 anos quando vi um vídeo do Fofão dançando, pensei: deve ser top trabalhar com isso. É uma experiência ‘daora’. Na primeira vez, ainda não sabia dançar, mas comecei a assistir vários vídeos para aprender e agora sei todos os passos”.
Há dois meses, Iago perdeu a mãe e ainda enfrenta o luto, mas se lembra que, depois de ouvi-lo falar com animação sobre o novo trabalho, concordou em deixar o filho dançar no Trenzinho Tsunami.
“Ela queria que eu arrumasse um emprego de carteira assinada, mas eu queria saber como era trabalhar com isso e ela concordou. Quero continuar no ramo, esse ano estava querendo viajar para Minas Gerais, porque lá tem várias. É uma possibilidade de poder trabalhar em outros lugares”.
Iago é um adolescente doce e extremamente educado, que sorri quando fala que sua fantasia favorita no momento é a do Kiko ou sobre a possibilidade de viajar para trabalhar em outros trenzinhos da alegria enquanto conhece lugares novos. “Pedi muito para comparem essa, mas antes usava muito a da Chiquinha”.
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