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Sábado, 27 de abril de 2024

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Mercearia Tokyo foi referência e japonês trazia novidades como Coca-Cola de SP para Cuiabá

Mercearia Tokyo foi referência e japonês trazia novidades como Coca-Cola de SP para Cuiabá
Ainda na adolescência, o japonês Naomichi Izawa começou a aprender sobre as técnicas necessárias para se tornar um bom comerciante em uma mercearia de Kawasaki, no Japão. Depois de muito trabalho braçal em lavoura de café e de desbravar “na base do facão” uma área de mata em Barra do Bugres (165 km de Cuiabá), Izawa encontrou na capital de Mato Grosso a chance de ter a própria mercearia, algo que já sonhava enquanto estava no Japão. 

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As consequências da Segunda Guerra fizeram com que Izawa, os pais e quatro irmãos embarcassem no navio Brasil-Maru para uma longa viagem com destino ao Brasil, em busca de condições melhores de sobrevivência. 

Um dos seis filhos do japonês, Roberto Izawa, de 57 anos, que é cuiabano, conta que ele e a mãe, Youko Oota, que fazia parte de uma das famílias de imigrantes que desbravaram Barra do Bugres, decidiram se mudar para Cuiabá no início dos anos 60. Foi quando Izawa investiu na compra de um box no antigo Mercado Municipal, no Centro da Capital, onde abriu a Mercearia Tokyo. 

“Primeiro ele começou com uma barraca de verduras que ficava no corredor do Mercado Municipal. Depois foi melhorando e crescendo, ele comprou um espaço para abrir a mercearia. Lá ele começou a vender mais produtos”. 

Amigo de longa data do japonês que fixou residência em Mato Grosso, Léo Medeiros costumava pescar com Izawa e conhecia com precisão a trajetória de vida dele. Em uma das conversas que tiveram, Izawa relatou que viajava para São Paulo (SP), trecho que demorava cinco dias para ser feito na época, para trazer novidades como Coca-Cola para Cuiabá. 

A Mercearia Tokyo ficou famosa entre os cuiabanos, que iam ao local para comprar os produtos de Izawa. O filho explica que moradores do distrito Nossa Senhora da Guia, por exemplo, desembarcaram de ônibus na Igreja Matriz, no Centro de Cuiabá, para poderem fazer as compras mensais com o japonês. 

Izawa em convenção de varejistas. (Foto: Arquivo pessoal)

“Meu pai tinha duas kombis para fazer as entregas e levava os caixotes com as compras todos os meses até a Igreja Matriz, onde eles embarcavam de volta para a Guia. Depois começaram a surgir muitos mercados grandes aqui, daí não foi dando mais para manter, começou a regredir. Era mais o povo antigo do centro mesmo que continuou comprando”. 

Durante muito tempo, Izawa também foi o principal fornecedor de presunto e queijo, como conta o filho, para os principais hotéis cuiabanos da época. Ele precisava acordar antes do Sol nascer para conseguir laminar manualmente os embutidos e garantir a entrega para o café da manhã dos hotéis. 

“Ele descia para abrir o mercado às 5h e ficava laminando presunto e queijo para fornecer para os cafés das manhãs dos hotéis. Depois, minha mãe ia para a mercearia e ele saía, a pé mesmo, para distribuir. Ele tinha que levar tudo bem cedo e antigamente não tinham máquinas automáticas para fatiar, ele fazia tudo no braço mesmo”. 

A Casa na Barão de Melgaço 

Em 1968, Izawa conseguiu comprar uma casa própria para a família na rua Barão de Melgaço, em Cuiabá, perto do Mercado Municipal. De mudança para o Japão nos próximos meses, onde vai trabalhar em uma fábrica de escapamentos, Roberto conta que a casa da família ainda permanece intacta. O antigo casarão cuiabano tem as paredes de adobe e outros detalhes do século 19. 

Foi na casa que Izawa criou os filhos e a esposa criava plantas, que também eram vendidas na mercearia, como conta Roberto. Com a morte de Youko, em 2014, ele viveu mais dois anos na casa antes de voltar para o Japão. 

“Todos os dias ele e minha mãe saiam para caminhar, cada um ia para um lado. Quando minha mãe faleceu, fiquei quase dois anos sozinho com ele aqui, meu irmão mais novo chamou ele para voltar para o Japão”. 

Em Cuiabá, ele e a esposa conseguiram comprar casa, além de estabelecerem a Mercearia Tokyo. (Foto: Arquivo pessoal)

Roberto conta que depois de deixar a Mercearia Tokyo sendo administrada por um dos filhos, Izawa começou a trabalhar em uma lanchonete nas quadras de tênis da AABB. Foi lá que fez bons amigos como Leo Medeiros, com quem costumava pescar no Pantanal anualmente. 

“Ele gostava de pescar com os amigos dele, acho que ele ficou oito anos trabalhando no bar da AABB. Ele tinha passado a mercearia para o meu irmão mais velho e não conseguia ficar parado ou sem trabalhar. Sempre trabalhou muito. Eles pescavam juntos em uma chalana, sempre faziam esses programas. 

Foi em um dos passeios que Izawa se sentiu mal e depois de alguns diagnósticos desencontrados, ele retornou ao Japão, onde descobriu que estava com câncer. Izawa faleceu em 2019, aos 83 anos. 

Roberto conta, no entanto, que o pai e a mãe tiveram uma boa vida juntos. Ele lembra que os dois costumavam ir visitar o Japão com frequência, com ajuda do dinheiro que era arrecadado pelos filhos. Além de conhecer diversas regiões do país em viagens de trem, fotos guardadas por Roberto mostram os pais em hotéis térmicos japoneses. 

“Tem muitos hotéis térmicos lá, meus irmãos pagavam o pacote e eles iam direto. É tudo muito tradicional. Meu pai e minha mãe aproveitaram bastante a vida depois”. 
 
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