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Sábado, 08 de novembro de 2025

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Com documentário, bióloga que monitora araras em áreas urbanas há anos chama atenção para perda de habitat em Cuiabá

Foto: Luciana Pinheiro Ferreira

Com documentário, bióloga que monitora araras em áreas urbanas há anos chama atenção para perda de habitat em Cuiabá
A concentração de araras no Centro de Cuiabá reflete perda de habitat natural, explica a bióloga Luciana Pinheiro Ferreira, que há quase uma década acompanha o comportamento das aves na cidade. O fenômeno, que desperta tanto encantamento quanto preocupação ambiental, é agora registrado em um documentário produzido em parceria com o fotógrafo e documentarista José Medeiros.


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Ao Olhar Conceito, a pesquisadora explica que em quase uma década de acompanhamento, foi possível mapear áreas verdes ainda preservadas em Cuiabá, locais com vegetação nativa e quintais residenciais que ainda mantêm árvores típicas da cidade. O monitoramento também chamou atenção para a forma como o crescimento urbano acelerado e sem planejamento impactou diretamente a arborização das ruas, avenidas, praças, parques e terrenos particulares não edificados.

“Uma das causas da presença das araras na cidade é porque elas perderam seu habitat, através do desmatamento, degradação ambiental onde se aproximassem da cidade, foram se adaptando aqui, se fixando na cidade. Apesar das identificações dos ambientes em que estamos encontrando as araras, elas têm nos mostrado que precisamos de um planejamento urbano, arborização urbana para mantermos o ambiente urbano”. 

Em um dos estudos que encontrou durante a pesquisa, Luciana se deparou com um dado importante: Cuiabá já perdeu 17% das áreas verdes nas últimas três décadas. “Essa redução impacta negativamente as araras, diminuindo a disponibilidade de alimento e locais de reprodução”, explica Luciana.

Além do Centro de Cuiabá, Praça da Mandioca e bairros como Goiabeiras, Quilombo, Araés, Santa Helena, Alto da Boa Vista e Despraiado estão sendo monitorados. Além disso, a região do Coxipó, Coophema, Boa Esperança, Jardim Imperial, Pedra 90, Parque Ohara, Baú, Consil, Bosque da Saúde, Jardim Aclimação, Alvorada, Centro Político Administrativo e Morada da Serra (CPA) também estão na lista de acompanhamento. 

Durante os trabalhos de pesquisa, a bióloga percebeu que, apesar da presença constante das araras vocalizando e pousadas em árvores e prédios, poucas pessoas realmente as observavam. Quando alguém parava para olhar e sorria diante das aves, a pesquisadora sentia que estava no caminho certo, valorizando a importância de perceber a relação entre o homem e o meio urbano em que vivem.

“Vi o quanto era necessário compreender a relação do homem com o ambiente e o meio urbano que vivem. Levantei várias questões como: será que o homem percebe que ambos estão inseridos no mesmo ambiente? Como entender a arara em um ambiente urbano? Porque as araras estão presentes na cidade? Será que sempre estiveram em Cuiabá? Qual a sensação em ver uma arara na cidade?”.  

Para fazer os registros, Luciana inicia suas manhãs muito cedo, saindo ainda de madrugada, por volta das 4h, para chegar aos locais de monitoramento até 5h30, acompanhando o amanhecer com as araras e a cidade.
 
No local, observa detalhadamente o comportamento das aves, registrando movimentos, alimentação e interações em diferentes horários. Durante as observações, conversa com pessoas que passam pelo local, coletando novas informações sobre avistamentos e mapeando a presença das araras em diferentes áreas verdes de Cuiabá.

Para a pesquisadora, o comportamento das araras revela a saúde das áreas verdes da cidade e indica quais ambientes ainda oferecem alimento, locais de nidificação e cursos d’água. Elas mostram os impactos da urbanização acelerada e da degradação ambiental, reforçando a importância da arborização urbana e da criação de parques e áreas verdes, essenciais para a manutenção da fauna urbana e o bem-estar humano.

O documentário que registra essa convivência entre cidade e natureza, realizado em parceria com José Medeiros, destaca o lado poético da relação das araras com o meio urbano. A obra mostra como elas interagem com a cidade, enfrentando ruídos, movimentação e eventos cotidianos, e questiona se essas aves realmente pertencem ao ambiente urbano.  

Um dos momentos mais marcantes para Luciana, era flagrar alguém parando para observar uma arara. “A sensação de bem estar é incrível, depois entendem que ela e a arara fazem parte desse ambiente urbano e que na cidade podemos ter um ambiente de qualidade. Claro que tem muitos momentos marcantes, as araras do centro já têm nome, uma senhora que está lá todos os dias, sabe até os horários da casa. Feliz porque sabemos que estamos fazendo um trabalho, pesquisa incrível”.

Paixão antiga 

Antes mesmo de se formar em biologia, Luciana Pinheiro Ferreira já demonstrava interesse pelas aves. “Tinha um amor e um encantamento sobre as araras e curiosidade da sua relação com os povos originários”, relata. No final da graduação, em 2005, começou a estudar as três espécies — arara-azul, arara vermelha e arara-canindé — e, no ano seguinte, foi convidada a integrar como bióloga e pesquisadora o Projeto Ecologia e Biologia Básica das Espécies de Araras da RPPN SESC Pantanal.

Na iniciativa, trabalhou com “mapeamento das áreas de alimentação e nidificação, monitoramento do sucesso reprodutivo, avaliação da população de araras e manejo ambiental para a melhoria da sustentabilidade ambiental das araras da RPPN no Pantanal de Barão de Melgaço, MT”.

Foi em 2016, ainda atuando no Pantanal, que percebeu algo diferente em Cuiabá. "Observei algumas araras na região do Coxipó, a partir desse dia comecei a perguntar para alguns amigos, pesquisadores da região se também já haviam avistado araras nessa região. Sabemos que esta região é bem arborizada, com parque estadual, horto florestal, rio Coxipó, mais que teve um crescimento muito rápido e sem um planejamento urbano".

No entanto, foi em 2025 que ela começou a receber informações sobre avistamento das araras. "[Eram de] amigos, conhecidos, amigos dos conhecidos". Luciana não parou mais de fazer as observações e passou a observar e anotar os locais em que as aves apareciam. 

"Quis entender melhor se elas já estavam aqui, se eram residentes (moravam em Cuiabá), se estavam de passagem ou migrando. E sabendo um pouco da história da nossa cidade, comecei a pesquisar outros locais da nossa memória, nossa história da nossa cidade. E entender quais informações as araras poderiam estar nos trazendo. Muitos questionamentos surgiram". 
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