Olhar Jurídico

Sexta-feira, 19 de abril de 2024

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O mensalão: Fatos e versões

Às vésperas do divulgadíssimo julgamento do Mensalão, a atenção do Brasil – como não poderia deixar de ser - se concentra na Praça dos Três Poderes em Brasília, mas especificamente no Supremo Tribunal Federal. Como em outros momentos sensíveis da Suprema Corte brasileira, apesar do julgamento jurídico ainda nem ter se iniciado, já há quem arrisque palpites sobre o resultado. Definitivamente, esse não é o cerne desse artigo. Até porque, qualquer que seja o resultado, as circunstâncias fáticas e os valores jurídicos envolvidos possuem maior importância histórica do que o simples deslinde do julgamento.

Digo isso porque ninguém em sã consciência, com o mínimo de inteligência e imbuído do sentimento de neutralidade, distante pois da discussão acerca da gravidade, (i)legalidade ou (i)moralidade das condutas perpetradas pelos réus, pode afirmar que ao menos a maioria dos réus já não foi condenada pela imprensa e segregada da sociedade. A imprensa é essencial para qualquer Estado Democrático de Direito, mas muitas vezes – bem ou mau intencionada -distorce os fatos noticiados, carregando na tinta ou dando destaque somente para a versão de um dos lados envolvidos.

A liberdade de imprensa não somente é necessária, mas vital para qualquer sociedade civilizada. Todavia, essa liberdade somente encontra amparo jurídico em havendo responsabilidade. Liberdade não é libertinagem! Quando a imprensa noticia “fatos” pela fumaça que enxerga, ela mesma se encarrega de fazer o fogo, mesmo que inexistente. Admitir a “barriga” é responsabilidade que desapareceu há tempos, sobrando poucos, honrados e responsáveis, jornalistas que reconhecem o erro cometido.

Não pretendo, portanto, fazer a defesa de nenhum dos réus. Longe de mim tal pretensão. Muito menos indicar erros ou acertos da Procuradoria Geral da República. O julgamento do “mensalão” é tarefa exclusiva da Corte Constitucional. Essa hercúlea missão compete unicamente às respectivas consciências dos Ministros do Supremo Tribunal Federal. E a imprensa responsável deveria fazer o mesmo.

Com a proximidade do julgamento, a imprensa bombardeou os noticiários com a mais “ampla e irrestrita” cobertura. Não faltaram juristas-videntes de plantão para fornecerem o resultado do jogo antes de sua realização. Pior: houve até quem se arvorasse “ministro ad hoc” e defendesse a suspeição ou impedimento desse ou daquele Ministro.

Esqueceram que TODOS que lá estão foram ungidos pela simpatia e reconhecimento técnico do Presidente da República? Ninguém se torna Ministro somente por um dos lados desse binômio “simpatia e tecnicidade”. Há de se ter os dois para ser Ministro do Supremo Tribunal Federal. E TODOS que lá estão apresentaram ambos requisitos quando da respectiva escolha.

Em algum momento da vida desses Ministros, mais próximo ou mais remoto, o envolvimento com o Chefe do Poder Executivo foi tanto que angariou a simpatia para a análise de sua técnica jurídica. Não há falar-se, pois, em independência ou distanciamento nessa fase “pré-ministro”.

Nenhum Ministro que lá chegou, repito, seja os de hoje ou os de ontem, se tornou independente e distanteantes da posse. Há de se analisar, portanto, as condutas desses Ministros somente após a posse e o exercício da nobre função de dar a última palavra em matéria jurídico-constitucional.

A preocupação da imprensa, isso sim, deveria recair sobre os preconceitos ou “pré-conceitos” desse ou daquele Ministro. Nunca a quem o Ministro serviu ou deixou de servir, antes de sê-lo. Inadmissível seria um Ministro afirmar e reafirmar, mesmo aos mais próximos e privadamente, que determinado réu fosse um “bandido inveterado”, “larápio quadrilheiro”, “surrupiador do erário”, um “Hitler do cerrado”, sem que antes tivesse posto as mãos numa única página do processo, baseando sua convicção (pré-concebida, portanto) unicamente no que a imprensa diz ou deixa de dizer.

Esse julgador, esse Ministro, eu não quero! Nem para o maior criminoso de todos os tempos. O país não precisa!! O sistema jurídico abomina!!! Mesmo que recheado de boas intenções. Há de se julgar os fatos, nunca as notícias. Para o nosso bem e do Estado Democrático de Direito, é o que devemos esperar e exigir dos Ministros do Supremo Tribunal Federal. O resto, o resto são versões.

Adriano José Borges Silva
Advogado
Sitevip Internet