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Sexta-feira, 19 de abril de 2024

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Judiciário: credibilidade e popularidade

Divulgação

Na net e em muitos jornais brasileiros, o jurista Luiz Flávio Gomes apresentou um pessimista panorama sobre as relações entre o Judiciário e a mídia. Com base em índices de credibilidade, o articulista traça uma inclinação negativa, resultado da pressão popularesca na opinião pública, segundo ele. Com a licença democrática que a própria mídia proporciona, vou me permitir discordar veementemente do emérito docente. Não consigo perceber uma crônica crise de credibilidade judiciária quando a população, cada vez mais, socorre-se dos tribunais.

As instituições republicanas não vivem e não devem viver pautadas pela imprensa. Muito ao contrário – devem pautar a mídia. Contudo, falta sensibilidade aos gestores judiciários para o trato com jornalistas. Ou desacreditam nas assessorias especializadas ou imaginam que o profissional da imprensa seja um inimigo a ser combatido. Dificilmente enxergam oportunidades para divulgar positivamente conquistas em benefício da cidadania brasileira e rebater a desinformação usando das mesmas armas. Erros de percepção na comunicação resultam em novas acusações à imprensa que acaba aumentando ainda mais o problema na convivência mutuamente ressentida.

Por outro lado, os casos de corrupção no Poder Judiciário, divulgados em tempos de proteção constitucional da livre expressão, agudizam o quadro negativo da mídia, dada a gravidade do fato e dimensão da divulgação. A revelação de escândalos não é demeritória a nenhuma instituição e sim às autoridades envolvidas e, antes de um sintoma negativo, é profundamente positiva porque não há qualquer imunidade ou blindagem a quem quer que seja. Noutras palavras – a percepção de que a corrupção aumenta é, na verdade, o resultado da liberdade da imprensa, porque nenhuma novidade há em casos pontuais de crimes funcionais na história da humanidade. O que há de novo é a divulgação sem peias.

Em termos de popularidade, a percepção popular não deve ser barômetro a desviar os rumos estratégicos traçados nos tribunais federais e estaduais. Até porque, fôssemos mensurar aprovação, as forças armadas brasileiras estavam no auge da fama quando do golpe militar que sofremos e, ainda nos momentos de maior recrudescimento do regime de exceção, não se ressentia de prestígio os ditadores de farda. Juiz não faz concurso de popularidade. Não é para isso que veste a toga. Já sabe, ademais, que enfrentará a resistência de, pelo menos, uma das partes em qualquer decisão onde uma delas se torne sucumbente.

Juiz não é artista de televisão, não é apresentador de programa, não deve usar suas decisões como plataforma política e nem tampouco a audiência como palco. Não entendo como impactante a falta de popularidade do Poder Judiciário. Por algumas razões: primeiro, porque tem enorme dificuldade em se comunicar com a sociedade; segundo, em função das próprias controvérsias nascidas do/no sistema de reapreciação colegiada de decisões; terceiro, em razão do tempo da mídia ser absolutamente diferente do tempo processual, um dilema insuperável em termos de comunicação social; quarto, pela linguagem técnica e díspar do coloquialismo inteligível pela maioria da população e, finalmente, pelo caráter formal inerente à atividade judicante. Se o Judiciário quiser ser mais popular, precisa urgentemente: 1) desburocratizar-se; 2) desritualizar-se; 3) transformar a linguagem e semiótica. Se quiser ser aplaudido, não precisa decidir como quer o povo. Basta decidir rapidamente. O que a sociedade não suporta é a demora.

Não confundamos credibilidade com popularidade. Talvez a pesquisa citada pelo emérito penalista não tenha realizado a distinção. O povo quer condenações exemplares e prisões espetaculares, tal como queria o cadafalso e a guilhotina noutras épocas. Em termos de pressão, atualmente a absolvição é um ato de coragem e independência judiciária, na certeza da crítica popular incisiva. Se foi possível julgar presidente e congressistas ao longo dessa breve trajetória democrática brasileira, não são críveis instabilidades e fraquezas institucionais. O Poder Judiciário pode não ser popular. Mas tem credibilidade suficiente para servir como última alternativa para quem quer ver defendido um direito.

Eduardo Mahon é advogado.

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