Artigos
A OAB como instrumento de conscientização e garantia da democracia
Autor: Fabio Arthur da Rocha Capilé
08 Jul 2015 - 07:00
Certa feita quando circulava nos corredores de uma biblioteca de aeroporto, aguardando o horário para o meu embarque, viajava pelas diversas temáticas e ilustrações, revistas e periódicos expostos de forma estratégica para os leitores. Quando então, percorria a ala das histórias infantis, em meio aquelas inúmeras variações de cores, pude perceber a existência de um livro espremido entre outros que me chamou a atenção, principalmente pelo seu nome “ A águia que não queria voar”.
Carinhosamente o retirei da prateleira e passei a análise do seu conteúdo. Verifiquei então que era um livro brilhante, no mínimo, por duas razões básicas. A primeira é porque esta parábola ali lançada de autoria de um educador de nome James Aggrey ganhou o mundo, sendo traduzido em inúmeros idiomas e versões desde a sua publicação acerca de um século atrás. A segunda pela alta relevância do conteúdo destinado a crianças visando, em linhas subliminares, uma conscientização acerca de um bem muito maior do que as cores e ilustrações que integravam o seu contexto. Narra a pequena história sobre uma águia que, criada entre as galinhas, não queria voar como um lembrete aos povos africanos, então sob dominação européia.
Queria assim mostrar a eles o quanto a riqueza das tradições e cultura daquele povo estava viva, embora houvesse a opressão, pretendendo assim despertá-los para sua real condição de grandeza esquecida. Seu majestoso destino de águias, e não de submissas galinhas, uma lição muito bem vinda, a todos os povos, de todas as épocas. Passei então a viajar sozinho num mundo de intensa reflexão sobre a atual situação vivenciada por nós nestes últimos anos, onde o povo é vítima de uma opressão velada decorrente da mentira, corrupção e de verdadeiras milícias dispostas a negociar o próprio estado, pela ânsia e apego ao poder.
Tudo está ai e está posto, sem qualquer vergonha ou ressentimento, onde as dissimulações e negativas de práticas ilícitas nos salta os olhos, ao ponto de não focarmos mais na gravidade dos atos praticados, mas sim no descaramento, da insistência desmedida em negá-los. E quem por sua essência deve sempre despertar a águia existente em cada um de nós? A OAB é a instituição prevista constitucionalmente para velar a constituição e defender a democracia, os interesses da sociedade, e o exercício de profissão que pela sua essência consiste na administração da justiça. É ela quem pode fazer a diferença no seio social, levantar bandeiras e buscar rumos para o restabelecimento da moralidade e do bem comum.
Qualquer comportamento de dirigente da instituição contrário a tais diretrizes desfigura o seu papel social de fomentar e difundir o direito do cidadão, como meio de fazê-lo despertar para a sua verdadeira condição, tal qual a citação do livro infantil, preparando-o para voar alto em prol de um sistema mais probo e justo. Vivemos atualmente uma crise moral dos governantes que insiste em nos tratar como verdadeiras galinhas, desconsiderando por completo a nossa verdadeira essência, onde a falta de caráter nos dá uma lembrança saudosa do que não vivemos. Hoje vemos um o presidente da câmara, em sinal de total desrespeito e despreparo aviltando a figura da instituição, e, no momento que mais se espera um posicionamento e uma reação, sinto que a voz da OAB nacional está embargada diante dos vínculos políticos e interesses pessoais. A sensação é de revolta e de saudade de um tempo em que enfrentava-se sem medo as forças do mau! Nosso sábio Rui Barbosa expressou precisamente tal sentimento, quando disse que:
"Eu tenho saudade do que não vivi. Tenho saudade de lugares onde não fui e de pessoas que não conheci. Tenho saudade de uma época que não vivenciei, lembranças de um tempo que mesmo sem fazer parte do meu passado, marcou presença e deixou legado. Esse tempo, onde a palavra valia mais do que um contrato, onde a decência era reconhecida pelo olhar, onde as pessoas não tinham vergonha da honestidade, onde a justiça cega não se vendia nem esmolava, onde rir não era apenas um direito do rei..." . Paira no meu peito esta saudade e a certeza de que necessitamos de um mundo melhor, e com pessoas melhores no poder.
Por isso, temos que ser pró ativos para o fortalecimento cada vez maior da OAB, enquanto instituição, coibindo distorções, para que esta possa lutar por cada um de nós, na busca de uma sociedade cada vez mais digna e justa.
*Fabio Arthur da Rocha Capilé, é Advogado, Professor Universitário, Presidente do Instituto dos Advogados Mato-grossenses, Conselheiro Estadual e Presidente da Comissão de Saúde da OAB/MT