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Arcanjo e Julier: coincidências
Antero Paes de Barros
O juiz Julier Sebastião da Silva já prestou serviços elogiáveis à população mato-grossense. Sua coragem em receber a denúncia elaborada pelo Ministério Público, através do procurador Pedro Taques, no episódio que ficou conhecido como Arca de Noé ajudou em muito a sociedade mato-grossense. Nunca ninguém lhe negou esses méritos. Apesar de todo o trabalho de investigação ter sido realizado pelo procurador Pedro Taques, não se deve deixar de reconhecer e elogiar a coragem do juiz em condenar João Arcanjo Ribeiro, inicialmente pelos crimes contra a administração pública, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. Posteriormente, Arcanjo foi condenado em júri popular, como mandante do assassinato de Sávio Brandão.
Mesmo na época em que o juiz estava no auge de popularidade por ter tomado a difícil decisão de condenar um cidadão considerado poderoso, tive oportunidade de demonstrar em debate com ele realizado no Senado que Julier usava indevidamente a toga da magistratura em benefício de alguns de seus amigos de infância e do seu partido, o PT. Da tribuna do Senado disse que Julier desonrava a toga, pois a utilizava politicamente em benefício dos seus amigos do PT e em desfavor da verdade.
Nada mais elucidativo sobre isso foi a invasão ao escritório e residência de Dante de Oliveira e à sede do PSDB, para tentar levar seu amigo Alexandre César ao segundo turno, nas eleições de 2004. Tive também oportunidade de provar alguns deslizes éticos do magistrado naquela época, como, por exemplo, nomear sempre o seu irmão como perito, em processos de terra em Mato Grosso. Por esse fato ele já chegou a ser advertido por seus superiores do Poder Judiciário.
Não se conheciam naquela época deslizes criminais do juiz. Ninguém lhe fazia essas acusações. Hoje, Julier é acusado de cometer quase todos os mesmos crimes antes cometidos por João Arcanjo Ribeiro. Ele está sendo investigado pela Polícia Federal por crimes contra a administração pública, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. Quem determinou a investigação do juiz foi o Tribunal Regional Federal.
Pelos dados apurados até agora e, pelo pouco que foi vazado para a opinião pública, Julier está sendo investigado como suspeito de ter cedido aos apelos de um bacharel em Direito (Tiago Dorileo), conhecido nos meios jurídicos como intermediador de compra e venda de sentenças. É investigado também por ter recebido favores de um administrador público, Gian Castrilon, presidente demitido do Detran por Silval Barbosa, após as denúncias ganharem as manchetes de jornais. Resta esclarecer que Castrilon era afilhado político de deputado Mauro Savi, considerado também padrinho da nati morta candidatura de Julier ao governo do Estado.
O juiz também teria tido encontros, inclusive em sua residência, com um empresário do ramo de construção civil e dias depois saiu uma sentença diminuindo os débitos tributários do empresário junto à Receita Federal em decisão monocrática do juiz.
As explicações do juiz não têm sido nada convincentes. Alegar perseguição da Polícia Federal, que está sob o comando do PT, é abusar da capacidade de compreensão de quem mora em Cuiabá interpretar os fatos. Todos sabemos que as dúvidas sobre a PF seriam mais consideradas se a atuação da instituição fosse no sentido de proteger o juiz, considerado filiação partidária certa ao PT.
Por enquanto, Julier é apenas suspeito e somente com a conclusão dos inquéritos é que saberemos se o juiz, em função do apetite eleitoral e diante da necessidade de fazer caixa de campanha, resolveu aderir às práticas criminosas para tentar se viabilizar. Recentemente, ele tomou atitudes difíceis de entender, como, por exemplo, buscar o apadrinhamento de sua candidatura na Assembleia Legislativa de Mato Grosso e mais especialmente junto ao deputado Riva.
Pior em tudo isso são as explicações do juiz petista. Recentemente, disse que é preciso verificar que ele não está sendo investigado por captação de dinheiro em factoring, o verdadeiro motivo da operação Ararath. Será que o Julier está querendo passar uma lição ética que tomar empréstimos em factoring é mais grave do que negociar sentenças e reunir-se em grupo para dar prejuízos ao Estado?
Resumindo: a situação do juiz é grave. Os documentos contra Julier devem ser encaminhados ao Conselho Nacional de Justiça, onde deve ser julgado, podendo ser punido com a aposentadoria compulsória. Nesta hipótese, terá deixado o Judiciário pela porta dos fundos.
Existem lamentavelmente algumas coincidências entre os crimes pelos quais Arcanjo já foi condenado e aqueles pelos quais Julier está sendo investigado.
Isso me faz lembrar com tristeza os ensinamentos do procurador Scalope, que dizia em seus discursos na campanha do PT ao governo em 1990. Ele, como procurador de justiça militar, ensinava nos palanques que “pior que um bandido é um bandido de farda”. Hoje, é possível completar “pior que um bandido e um bandido de farda é um bandido de toga, como a ministra Eliana Calmon diz existir nas entranhas do Poder Judiciário.
Anterro Paes de Barros é radialista, jornalista, advogado, ex-vereador, deputado constituinte e senador da República