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Como a vovó já dizia...

Fabrício Gonçalves de Oliveira

Como a vovó já advertia aos seus netos, prevenir é melhor do que remediar. Esse ditado popular, incessantemente reproduzido por gerações, passa a ideia de que as pessoas devem adotar precauções para evitar que algo de ruim aconteça. No ambiente de trabalho não é diferente.

A empresa, responsável pela exploração da atividade econômica para obtenção de lucro, deve buscar, primeiramente, a eliminação, na raiz, dos riscos de acidente do trabalho e doenças ocupacionais, e não apenas tentar neutralizá-los ou administrar suas consequências. Todavia, muito embora a legislação seja clara quanto a essa obrigação, ainda é normal associar acidente de trabalho a uma obra do acaso ou a um suposto erro do trabalhador.

De fato, há situações excepcionais em que se admite a culpa da vítima, ou até mesmo o dolo. Mas, na maioria das vezes, ela não tem nenhuma responsabilidade. Mesmo assim, paga um preço alto.

Os riscos, diga-se de passagem, são em geral extremamente previsíveis, ou seja, é possível (e exigível) que o empregador se antecipe para eliminá-los. Infelizmente, não é isso que acontece na realidade. Na construção civil, por exemplo, é comum o trabalho em altura, assim como o risco de queda (claro e previsível). Entretanto, essa ainda é uma das maiores causas de morte no trabalho no Brasil. São vãos abertos no chão sem qualquer sinalização, sacadas sem proteção, andaimes completamente irregulares, e por aí vai...

Apesar de ser costumeiro, na área trabalhista, vozes no sentido de que empregado se acidentou porque simplesmente não viu um “buraco” no terraço de um prédio, a verdade é que a responsabilidade é do empregador que não adotou as providências para impedir que o funcionário tivesse acesso àquele local e ali caísse. É dele, do patrão contratante, a culpa.

Por isso é também importante destacar a função dos chamados Equipamentos de Proteção Coletiva, que preservam a saúde de todos os trabalhadores, e não apenas de um ou outro. Na construção civil, utiliza-se muito os guarda-corpos, que nada mais são do que barreiras protetivas, que evitam que uma pessoa venha a sofrer determinada queda.

Sem dúvida, essa proteção é muito mais efetiva do que certos Equipamentos de Proteção Individual, como um capacete. Não que os EPIs sejam dispensáveis, pelo contrário, devem ser utilizados sempre pelo trabalhador. Mas, convenhamos, um capacete protegerá o trabalhador caso caia de uma altura de 10 metros? Lógico que não! No máximo, poderá amenizar, com sorte, os efeitos negativos de um pequeno acidente.

A prevenção passa pelo conceito de que o trabalho deve se adaptar ao homem, e não o homem ao trabalho. É por isso que o Direito do Trabalho estabelece a necessidade do planejamento antes mesmo do empreendimento começar a funcionar.

Documentos como o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA) e o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO) não são meras formalidades exigidas pela lei. Não mesmo! São imprescindíveis para que o empregador identifique os riscos e, de antemão, pense nas ações para que eles não se concretizem, salvando vidas.

Ademais, não podemos nos afastar de uma grave situação atualmente vivenciada: a aprovação do Projeto de Lei 4.330/2004, que estenderá a terceirização para qualquer atividade, inclusive a finalística. Ora, sabemos que grande parte das empresas terceirizadas não realiza investimentos mínimos em saúde e segurança dos trabalhadores. Para se ter uma ideia, hoje, a cada 10 acidentes registrados no país, oito envolvem terceirizados. E é lógico que, caso o projeto vire lei, esse número vai aumentar e muito!

Acidentes de trabalho não são meras fatalidades. São consequências do desrespeito a regras básicas de prevenção. Neste ponto, nossos avós estavam certos: é melhor prevenir do que remediar. Até porque não existirá, muitas vezes, sequer um “remédio” hábil para curar a “ferida”.


Fabrício Gonçalves de Oliveira é procurador-chefe do MPT em Mato Grosso
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