O promotor de Justiça Gerson Barbosa, responsável pela ação pedindo a desocupação e a demolição de construções da Área de Preservação Permanente (APP) localizada entre a Estação de Tratamento de Água ETA Porto e a instituição de ensino Unirondon, investiga mais 100 casos semelhantes de ocupações indevidas.
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Os números foram revelados ao
Olhar Jurídico em entrevista exclusiva na sede das promotorias do Ministério Público, na última sexta-feira (12). Além do processo que pode demolir partes da casa de Shows Musiva e do instituto de ensino Unirondon, cerca de 50 casos estão judicializados e mais 50 casos são investigados em inquéritos.
“Existem em torno de 50 ações com cerca de 30 sentenças e liminares concedidas sem serem cumpridas. Eu tenho cerca de 50 inquéritos envolvendo APP. É um problema gravíssimo em Cuiabá. A gente vê pelos mapas, muitas nascentes aterradas, APPs degradadas e isso está ocasionando um dano muito grande. Cuiabá já foi cidade verde. Hoje existem loteamentos de Áreas de Preservação Permanente”, revelou o promotor.
Gerson Barbosa e seu trabalho ganharam repercussão na última semana justamente por ir contra empreendimentos consolidados em Cuiabá.
Na Ação Civil Pública pedindo a desocupação e a demolição de construções localizadas às margens do Rio Cuiabá, na Avenida Beira Rio, além de Unirondon e Musiva, é relatado que outros 15 ocupantes da área não tiveram interesse em celebrar Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Ministério Público.
Segundo a 17ª Promotoria de Justiça de Defesa da Ordem Urbanística e do Patrimônio Cultural, foram realizadas oito audiências ministeriais, sem que a demanda pudesse ser resolvida de forma consensual e extrajudicial.
“Veja bem, foi feito um levantamento de técnicos da prefeitura e de técnicos do Ministério Público, naquela área que foi objeto do inquérito civil. A Unirondon, por exemplo, o estacionamento está em APP. O que o Ministério Público pede é a demolição daquela parte que está em APP”, esclareceu.
Preocupado com uma possível repercussão distorcida dos fatos, Gerson Barbosa explicou que o pedido não significa a total derrubada das estruturas e imóveis constantes no local.
“Eu não estou pedindo para demolir todos os imóveis. Eu estou pedindo demolição e retirada de entulhos da área de preservação permanente. Essa é intocável. Por exemplo, se determinado imóvel, ele está invadindo 10 metros de APP, diz respeito àqueles 10 metros. Tanto é que não é só esse pedido na ação. Eu estou pedindo a regularização do imóvel. Calçada Padrão, arborização, sistema de esgoto. Eu estou pedindo toda a regularização do imóvel e mais projeto de regularização de área degradada”, pontuou Gerson Barbosa.
Em sede de inquérito civil, o Ministério Público verificou que a área invadida foi doada pela União ao Município de Cuiabá, mediante condição de que o município a doasse aos ocupantes. A doação aos ocupantes das áreas, porém, não se efetivou, pelo fato dos mesmos não terem se cadastrado na Superintendência do Patrimônio da União em Mato Grosso, como havia sido condicionado.
Ocorre que, não bastasse a desconformidade das condutas adotadas pelos invasores com a legislação vigente, o Poder Público foi conivente com a situação, tendo em vista que foi constatado pelo agente de fiscalização e regulação da prefeitura municipal de Cuiabá que os empreendimentos instalados na avenida Beira Rio (dentro da APP Rio Cuiabá) possuem Alvará de Funcionamento para o exercício da atividade comercial e afins.
“A ação também é contra o município, inclusive o pedido de recuperação de área degradada é contra o município. A gente pede para eles exercerem o dever de poder de polícia, para verificar a questão da regularidade. Para evitar invasão. Então vários pedidos envolvem o município. O município também é réu nessa ação. Inclusive o projeto de recuperação de área degradada, nós também acionamos o município de Cuiabá, para que execute esse projeto. Primeiro que o município não agiu para obter a regularidade. Pelo contrário, deu até alvará de funcionamento”, elucidou o promotor durante entrevista.
Ainda buscando elucidar questões, Gerson Barbosa esclarece normas técnicas no caso. “O rio Cuiabá tem 100 metros de APP nas suas margens. Isso deve ser observado. É intocável. Fauna e flora, é para toda manutenção do ecossistema”.
Obra recente da prefeitura de Cuiabá e localizada a cerca de 500 metros da área objeto da ação, a nova Orla do Porto, segundo Barbosa, obedece ao que é determinado em lei.
“A Orla do Porto foi licenciada pela Secretaria de Meio Ambiente. É uma obra especial. É igual uma ETA Porto. A lei prevê o serviço público de distribuição de água. Há possibilidade de eventualmente ficar em APP, com determinadas restrições que a lei prevê. No caso da Orla do Porto, houve um licenciamento e todo um processo para o licenciamento", finalizou.
As obras da Orla do Porto incluíram a construção de um calçadão com cerca de 1,3 mil metros, pista de caminhada, áreas de contemplação do rio, mirante, academias ao ar livre e cinco bares ou restaurantes. No total, o orçamento foi de R$ 28 milhões.
Sobre a ação, a petição inicial formulada Pelo Ministério Público já foi entregue, no último dia 8 de maio, a Flávia Catarina Amorim, juíza da Vara Especializada de Meio Ambiente de Cuiabá.
Outras áreas
Ainda exemplificando ocupações de APP, o Ministério Público do Estado de Mato Grosso, também por meio da 17ª Promotoria de Justiça de Defesa da Ordem Urbanística e do Patrimônio Cultural de Cuiabá, ingressou com ação civil pública requerendo a desocupação de Área de Preservação Permanente (APP) do Rio Cuiabá, na região do bairro Coophamil.
O pedido também inclui a demolição das construções e a retirada dos entulhos existentes no local.
Ao todo, foram acionadas 10 pessoas, além da prefeitura e eventuais sucessores dos ocupantes da APP.
O Ministério Público Estadual também pleiteia ao Judiciário que condene os requeridos a executarem o Plano de Recuperação de Áreas Degradadas, que deverá conter, entre outras exigências, a delimitação cartográfica e geográfica da área; laudo da análise físico-química do solo para identificação das necessidades de correção e fertilização do solo; detalhamento das atividades e serviços a serem realizados e o cronograma de execução.
No caso específico da ocupação da APP do bairro Coophamil, informações colhidas nas audiências promovidas pelo Ministério Público demonstram que a área foi inclusive contemplada com pavimentação asfáltica do Programa de Aceleração de Crescimento (PAC).
Na ação, o promotor de Justiça destaca trechos de um relatório elaborado pela Delegacia Especializada do Meio Ambiente que aponta inúmeros casos de invasões atuais que vêm fomentando mercado clandestino de venda e revenda de lotes ilegais.
As APPs, segundo ele, além de proteger os recursos hídricos e o solo, servem para refúgio de fauna e flora, e tem importância na paisagem.