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Domingo, 20 de julho de 2025

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DEFEZ DE BENS NO AEROPORTO

Acusado de movimentar milhões em contratos superfaturados no Estado, empresário soube de operação e destruiu provas

Foto: Reprodução

Acusado de movimentar milhões em contratos superfaturados no Estado, empresário soube de operação e destruiu provas
Relatório da Polícia Civil de Mato Grosso, proveniente da Operação Suserano, aponta que o empresário Alessandro Nascimento, acusado de liderar suposto esquema de R$ 28 milhões, ao saber da ofensiva, teria tentado destruir provas e se evadir de Cuiabá com a filha e esposa.  A Operação Suserano foi deflagrada no dia 24 de setembro de 2024 pela Delegacia Especializada de Combate à Corrupção (Deccor) para investigar esquema de superfaturamento e desvios de recursos públicos envolvendo a compra de equipamentos agrícolas com emendas parlamentares, totalizando R$ 28 milhões.


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Entre os principais alvos da ação estão o ex-secretário de Agricultura Familiar, Luluca Ribeiro, e Alessandro do Nascimento, um empresário que, com a ajuda de "laranjas", incluindo sua filha Ana Caroline Ormond, teria movimentado quantias milionárias no esquema.

Relatório da delegada Juliana Rado, concluído em 14 de maio de 2025, além de apontar suposto envolvimento de vários deputados no caso, revelou que alguém vazou a operação para Alessandro. Sabendo da ofensiva, ele passou a organizar a própria evasão patrimonial e a destruição de provas.

Conforme as diligências da polícia civil, Alessandro, sua esposa Herley, e suas filhas haviam embarcado em um voo às vésperas da operação, com retorno previsto para o mesmo dia. Ao serem abordados discretamente no desembarque, Alessandro apresentou um celular Samsung, embora utilizasse um iPhone 15 Pro Max (modelo A2849) antes da operação, e a quantia de R$ 10.000,00 em espécie foi apreendida em sua mochila sem declaração.

A esposa demonstrou atitude suspeita, solicitando à filha Ana Caroline que lhe entregasse um celular que estava em sua bolsa. Imagens do aeroporto obtidas em 26/09/2024 confirmaram que Alessandro adquiriu as passagens em um dia antes da ação, às 19h, para embarque às 4h do dia 24 (data da ofensiva), mas antecipou sua saída comprando nova passagem no balcão de uma companhia aérea, com Ana Caroline inclusive repassando o cartão para a compra.

Mais tarde, o empresário foi flagrado entrando em uma loja dentro do aeroporto Marechal Rondon, onde deixou um celular e um notebook. A loja pertencia a uma amiga de infância de Ana Caroline. O funcionário que recebeu os bens informou que o celular estava formatado ("Olá, bem-vindo"). O celular, um iPhone de cor preta, foi posteriormente retirado por um homem que se identificou como "José Dinaldo", que assinou um livro de protocolo da loja, sem apresentar documento de identificação.

Já o notebook foi entregue espontaneamente à polícia por Ivete, mãe de Mariana e administradora da loja, que é amiga de longa data de Alessandro e sua família. Ivete relatou que seu esposo, Edmar José da Silva, também amigo de Alessandro, havia sido procurado por ele na véspera da operação para guardar documentos acondicionados em caixas.

Imagens do prédio onde o casal reside confirmaram que Alessandro entregou duas caixas plásticas pretas com diversos documentos a Edmar na garagem, por volta das 20h30min do dia 23, pedindo que os guardasse antes de viajar. Edmar declarou que Alessandro aparentava estar apressado e não havia deixado documentos antes, e que as caixas continham, entre outros, "santinhos" de campanha eleitoral.

Edmar ainda informou à investigação que presenciou Alessandro, em reunião na Tubarão, mencionar a entrega de mais de mil kits de agricultura familiar e exclamar: "ainda bem que eu só atendo sete deputados e não vinte e quatro", e que Alessandro construiu um galpão ao lado da casa de sua mãe para entrega desses kits.

Além do vazamento com a respectiva fuga e ocultação de provas, as investigações fizeram diligência na sede do Pronatur, no dia 24, a qual estava em estado de abandono, sem sinais de funcionamento, com acúmulo excessivo de correspondências, indicando ausência prolongada de pessoas.

No endereço da empresa Tubarão Sports e residência de Alessandro do Nascimento, em Cuiabá, a equipe policial precisou forçar a entrada e constatou que ele e sua família não se encontravam no local, havendo indícios de que haviam saído recentemente, possivelmente na madrugada anterior ao cumprimento do mandado, com vestígios de manuseio de malas e roupas.

Funcionários da Tubarão Sports relataram que, na noite anterior à operação, um evento da firma foi cancelado. Na empresa ainda foram encontradas pastas com documentos de sócios que eram funcionários (como Euzenildo Ferreira da Silva), canhotos de cheques com anotações de "saque" e valores, e documentos da empresa Tupã Comércio e pedidos vinculados ao Pronatur, além de um caderno com a expressão "queimar documentos".

O relatório destaca que houve entrega de kits entre 28 de outubro e 12 de novembro de 2024, mesmo após determinação da SEAF para suspensão imediata das atividades do Pronatur. Em depoimento, um aliado do empresário Alessandro do Nascimento – apontado como líder do esquema – afirmou ter presenciado reunião em que ele afirmou “atender sete deputados”, número que coincide com os parlamentares identificados como autores das emendas suspeitas, totalizando R$ 27,5 milhões.

Alessandro é apontado como sócio oculto da empresa Tupã Comércio e Representações, principal fornecedora dos kits. Segundo os investigadores, ele usava familiares e pessoas interpostas, como o ex-chapeiro Euzenildo Ferreira da Silva, para ocultar sua participação na empresa. A filha de Alessandro, Ana Caroline Ormond, é investigada por movimentações financeiras milionárias incompatíveis com sua renda e por possível ocultação de patrimônio.

O presidente do Pronatur, Wilker Weslley Arruda, teria formalizado os acordos com os parlamentares e organizado eventos de entrega com foco político. Ele também é investigado por evolução patrimonial incompatível com sua função. O então secretário da SEAF, Luiz Artur de Oliveira Ribeiro, seria o responsável pela liberação dos recursos das emendas e pode responder por crime de responsabilidade.

Além disso, o relatório aponta a participação de servidores públicos na estruturação do esquema, incluindo o fiscal dos contratos, Leonardo da Silva Ribeiro, que teria validado orçamentos irregulares, e o conselheiro fiscal do Pronatur, Yhuri Rayan Arruda, que teria favorecido empresas ligadas a seus familiares.

A Controladoria-Geral do Estado (CGE), a Procuradoria-Geral do Estado (PGE) e a própria SEAF constataram que, apesar do pagamento de quase R$ 30 milhões ao Pronatur, apenas 10 beneficiários foram identificados como efetivamente contemplados com os kits.

A Polícia Civil conclui que há indícios concretos de prática de crime eleitoral, uma vez que os eventos de entrega dos kits foram utilizados como forma de promoção pessoal de deputados em ano eleitoral, com coleta de dados de beneficiários e ampla divulgação. Diante disso, o relatório sugere a remessa do inquérito ao Ministério Público Eleitoral e a federalização da investigação, sob responsabilidade da Polícia Federal e da Justiça Eleitoral. O caso segue em tramitação.
 
 
 
 
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