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Mensalão: dirigentes do Banco Rural constituiam núcleo financeiro do esquema

26 Jul 2012 - 16:47

Secretaria de Comunicação Procuradoria Geral da República

O núcleo financeiro do esquema criminoso investigado na Ação Penal 470, que ficou conhecido nacionalmente como mensalão, era integrado pelos principais dirigentes do Banco Rural no período de funcionamento da quadrilha (janeiro de 2003 e junho de 2005): José Augusto Dumont (falecido), José Roberto Salgado, Ayanna Tenório, Vinícius Samarane e Kátia Rabello. De acordo com as alegações finais do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, eles administravam os setores chaves que viabilizaram a dinâmica da prática dos crimes.

A Ação Penal 470 começa a ser julgada em 2 de agosto. Esta última matéria da série publica no site da PGR relembrando o esquema denunciado em 2006 detalha o funcionamento do núcleo ligado ao Banco Rural.

Segundo o PGR, o Banco Rural foi peça chave no processo delituoso, financiando parcialmente o esquema, mediante a simulação de empréstimos bancários no valor de R$ 32 milhões; permitindo a mistura dos recursos obtidos via empréstimos com dinheiro público desviado por meio de contratos de publicidade com órgãos públicos; viabilizando a segura distribuição de recursos em espécie, sem comunicar aos órgãos de controle o destinatário final; e, por fim, não comunicando as operações suspeitas de lavagem de dinheiro aos órgãos de controle.

Parceria - Para Gurgel, o Banco Rural serviu aos propósitos ilícitos de Marcos Valério e seu grupo desde pelo menos 1998. “Em 2003, quando definido o acordo delituoso com o núcleo central do grupo criminoso (José Dirceu, José Genoíno, Sílvio Pereira e Delúbio Soares), Marcos Valério, Ramon Hollerbach, Cristiano Paz e Rogério Tolentino imediatamente procuraram seu antigo parceiro, o Banco Rural, para que ingressasse nessa nova empreitada”, esclarece.

O procurador-geral cita depoimento de Marcos Valério no qual ele afirma que, vencida a eleição presidencial, aproximadamente em janeiro de 2003, passou a frequentar a sede do Partido dos Trabalhadores em São Paulo, ocasião em que estava ocorrendo a montagem da equipe de governo. Segundo o depoimento, Delúbio Soares informou a Marcos Valério que precisava de empréstimos para saldar pendências financeiras dos diretórios regionais do PT referentes às eleições de deputados Federais e Estaduais e governadores. Conforme Marcos Valério, em alguns deles foram oferecidos como garantia créditos relativos a contratos de publicidade com o Governo Federal.

Interesses econômicos - Gurgel explica que os dirigentes do Banco Rural tinham vários interesses econômicos que poderiam ser atendidos pelo governo federal, mencionando como o principal deles a liquidação do Banco Mercantil de Pernambuco. Foi o que confirmou declaração de Kátia Rabello, segundo a qual era do interesse do Banco Rural que o Banco Central definisse a fórmula de calcular o passivo e o ativo da massa em liquidação. “Por isso, não hesitaram em atender ao convite do grupo liderado por Marcos Valério, associando-se aos demais integrantes da quadrilha de forma permanente, estável e organizada para o cometimento dos delitos”, explica o PGR.

Ainda segundo as alegações finais, Marcos Valério passou a auxiliar o Banco Rural a obter o tão sonhado Banco Mercantil de Pernambuco, agendando reuniões com José Dirceu e intercedendo junto ao Banco Central. Segundo depoimento de Kátia Rabello, o Banco Rural possuía cerca de 22% das ações do Banco Mercantil de Pernambuco que ainda se encontrava sob intervenção do Banco Central e Marcos Valério foi um facilitador para a interlocução do Banco Rural junto a várias pessoas no tratamento dessa questão, sendo uma delas o ministro José Dirceu.

No Banco Central, Marcos Valério compareceu a pelo menos oito reuniões para tratar do tema com a Diretoria de Liquidações e Desestatização. Gurgel ressalta que o ganho pretendido pelo Banco Rural superavam em muito o dispêndio que fez em benefício do esquema criminoso. “Conforme documento apresentado pelo Banco Central do Brasil, o ganho do Banco Rural com o levantamento da liquidação extrajudicial do Banco Mercantil de Pernambuco superava a casa do bilhão de reais”, diz.

Conforme explica, as ações dos dirigentes do Banco Rural perpassaram todas as etapas do esquema ilícito, desde a sua origem (financiamento), passando pela sua operacionalização (distribuição) e, ao final, garantindo a sua impunidade (não comunicação das operações suspeitas).

Dirigentes - Comprovou-se que Marcos Valério e Rogério Tolentino eram os principais interlocutores junto à cúpula do Banco Rural, relacionando-se diretamente a José Augusto Dumont, então vice-presidente do banco. Mas, para Gurgel, este não foi o único autor dos delitos praticados na instituição financeira, como querem fazer crer os demais acusados, integrantes do núcleo financeiro. “Aliás, há fatos delituosos consumados, ou cuja consumação perdurou (gestão fraudulenta) após a data da sua morte”, declara.

Nesse sentido, Gurgel aponta as sucessivas renovações dos empréstimos fictícios relatados na denúncia, autorizadas pelos demais dirigentes do Banco Rural – José Roberto Salgado, Kátia Rabello e Ayanna Tenório, que consumaram o crime de gestão fraudulenta.

Em relação a Kátia Rabello, que integrou a cúpula decisória do Banco Rural desde abril de 1999 e assumiu o cargo de presidente em outubro de 2001, Gurgel afirma que ela acompanhava os negócios que as empresas de Marcos Valério e seu grupo faziam com o banco, principalmente pelo notável volume de recursos que movimentava, o que lhe assegurava o status de um cliente excepcional. O PGR diz que ela esteve reunida pelo menos duas vezes com o ex-ministro José Dirceu para tratar dos recursos repassados pelo Banco Rural (empréstimos fictícios) e da contraprestação que seria viabilizada, especialmente na liquidação do Banco Mercantil de Pernambuco.

José Roberto Salgado ingressou no Banco Rural em 1995, foi diretor da instituição financeira, e assumiu, em abril de 2004, com o falecimento de José Augusto Dumont, a função de vice-presidente da área de operações. Como diretor estatutário, foi o responsável pela administração das agências no exterior, inclusive a Trade Link Bank, empresa mantida no exterior pelos dirigentes do Banco Rural para viabilizar operações de lavagem de dinheiro. Ele integrava a diretoria executiva das três unidades externas do Banco Rural, responsáveis pela transferência de recursos ao exterior para a conta Dusseldorf, de titularidade de Duda Mendonça e Zilmar Fernandes.

Segundo Gurgel, Vinícius Samarane é vinculado ao Banco Rural desde 1993 e, em 2002, assumiu a Diretoria de Controles Internos, setor responsável pelo combate a práticas ilícitas e, também, de manter a conformidade dos procedimentos do banco com as normas do Banco Central, tendo atuado decisivamente para viabilizar o esquema de lavagem de dinheiro executado pelo Banco Rural.

Ayanna Tenório ingressou no Banco Rural em abril de 2004 para assumir o cargo de vice-presidente. Cabia-lhe, de acordo com seu depoimento, a gestão das seguintes áreas: tecnologia, departamento jurídico, recursos humanos, administração em geral, orçamento e planejamento, inspetoria, compliance, contabilidade e desenvolvimento de produtos, setores vitais, conforme o PGR, para a execução dos crimes de autoria da quadrilha que envolviam o Banco Rural. Gurgel afirma que ela não participou da formação inicial da quadrilha, mas aderiu ao grupo organizado em curso.

Segundo o procurador-geral da República, dentro da estrutura organizacional do Banco Rural, a instrução comprovou que os acusados, no lapso temporal de funcionamento da quadrilha, tinham o poder decisório nas áreas empregadas para o cometimento dos delitos. “Além de injetar recursos para viabilizar o esquema criminoso por meio de concessões e renovações de empréstimos fictícios, os dirigentes do Banco Rural idealizaram e disponibilizaram um seguro formato de distribuição dos valores sem identificação dos destinatários reais para o Banco Central do Brasil e o Conselho de Controle de Atividades Financeiros (Coaf)”, conclui.

Cobertura do julgamento - A Procuradoria Geral da República criou uma área no site de notícias para reunir as informações sobre o julgamento da AP 470. Usuários da microblog Twitter também poderão acompanhar a sustentação oral do procurador-geral da República por meio do perfil @MPF_PGR, prevista para 2 de agosto.

Veja aqui a íntegra da denúncia apresentada em 2006 e o quadro com a relação de crimes e réus.
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