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"Me senti como as mulheres que atendo", diz defensora que denunciou ter sido expulsa de sala por juiz

Da Redação - Vinicius Mendes

A defensora pública Rosana Leite, do Núcleo de Defesa da Mulher, disse ter se sentido como as vítimas de machismo ao ser expulsa pelo juiz Jurandir Florêncio de Castilho Junior, da 14ª Vara Criminal de Cuiabá, de uma audiência sobre um caso de estupro e violência doméstica, na última sexta-feira (12).

Ela afirmou que foi procurada pela vítima para que acompanhasse a audiência e acusou o juiz de tê-la impedido de permanecer no local, a não ser que fosse para defender o réu.
 
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A Defensoria Pública de Mato Grosso realizou uma entrevista coletiva nesta segunda-feira (14) para que a defensora esclarecesse o caso. Segundo ela, uma jovem, que hoje tem 18 anos, e que teria sido estuprada pelo próprio pai, teria procurado a Defensoria Pública para que fosse acompanhada em uma audiência em que daria depoimento.
 
 O processo corre em Mato Grosso do Sul, mas como a vítima reside em Cuiabá ela seria ouvida, por carta precatória, na 14ª Vara Criminal da Capital em audiência na tarde da última sexta-feira (12). De acordo com a defensora, a vítima a teria procurado para que se sentisse segura durante a audiência.
 
Na coletiva a defensora reforçou diversas vezes os artigos 27 e 28 da Lei Maria da Penha, que estabelecem que vítimas de violência doméstica sejam acompanhadas  por um advogado em todos os atos processuais, cíveis e criminais.
 
No entanto, no dia da audiência ela afirma que foi impedida pelo juiz Jurandir Florêncio de acompanhar a vítima. Segundo ela, o juiz teria dito que não havia necessidade da presença dela ali, a não ser que fosse para defender o réu. Ele ainda teria dito que “neste local não se fala de gênero, aqui a senhora não vai defender mulher, aqui não precisa da defesa da mulher”.
 
O magistrado ainda teria questionado se ela de fato seria defensora pública e Rosana Leite disse que sim, reforçando mais uma vez os artigos 27 e 28 da Lei Maria da Penha. O juiz, segundo a defensora, permaneceu irredutível e pediu que ela se retirasse da sala, que não começaria a audiência com ela ali. Ao final ele ainda teria dito “doutora fica tranquila, aqui ninguém vai causar mal à vítima ou machucá-la”. Ela disse ter se sentido como as vítimas que defende, que sofrem com o machismo.
 
“Eu me senti como as mulheres que eu atendo, vítimas de machismo, tendo em vista que naquele momento ele disse que se eu quisesse ficar, que eu ficasse na defesa do réu, então essa fala dele mostra o tamanho do machismo que nós convivemos. Me senti extremamente triste, fragilizada, em não poder acompanhar uma vítima que me procurou e que estava depositando toda a confiança no trabalho desta defensora pública. Então foi muito difícil eu ter que ser tirada de uma sala de audiência, isso me doeu muito e está doendo muito”, disse.
 
O caso já foi levado ao conhecimento da Defensoria Pública, encaminhado ao defensor público geral e ao corregedor-geral, que disseram que irão pedir as providências correcionais, já que houve impedimento do exercício da função da defensora pública, o que configuraria abuso.
 
“Eu entendi que houve um abuso da parte dele em não deixar que esta defensora acompanhasse aquela vítima e que e pudesse desempenhar a minha função como defensora pública que atua na defesa da mulher vítima. Então isso realmente foi o mais dolorido sobre o que ele fez, que foi cercear a defesa de uma vítima, o acompanhamento, o amparo que ela merecia, de acordo com os artigos 27 e 28 da Lei Maria da Penha”, disse a defensora.
 
Rosana Leite disse que este foi a primeira vez que algo assim lhe aconteceu. Ela disse confiar na Justiça de Mato Grosso e acredita que tudo será apurado como deve, para que as mulheres vítimas não se sintam prejudicadas ao buscar o judiciário.
 
A assessoria do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT)afirmou que não pode se posicionar antes  de conhecer todos os detalhes do ocorrido, antes de ouvir o outro lado, sob pena de manifestar  opinião sem profundo  conhecimento  de causa. O TJ disse ainda que cabe à Corregedoria se manifestar, dentro do processo, quando for provocada, e depois do devido trâmite de eventual procedimento interno.
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