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Juiz auditor levanta suspeita de que tática questionável usada por Scheifer pode ter gerado morte por 'erro de fato'

Da Redação - Arthur Santos da Silva

Vencido no julgamento de quinta-feira (24) que condenou o policial militar Lucélio Gomes Jacinto a 20 anos de prisão, o juiz Marcos Faleiros, que votou para inocentar o réu, apontou que a morte do tenente Carlos Henrique Scheifer, do Batalhão de Operações Especiais (Bope), pode ter sido ocasionada por erro da própria vítima.

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Na ocasião da morte, Scheifer comandava operação em Peixoto de Azevedo contra criminosos da modalidade novo cangaço. Vítima foi atingida por um disparo frontal efetuado pelo colega de farda na região abdominal, em um local que havia sido no dia anterior palco de confronto entre policiais e suspeitos de roubo. Responsável pelo tiro alega que reagiu por legitima defesa, confundindo a vítima (Scheifer) com um possível criminoso.
 
Ocorre que, segundo trazido no processo, Scheifer, como comandante da operação, decidiu por utilizar estratégia de emboscada denominada Tróia. Conforme informado nos autos, Tróia é empregada para ludibriar os criminosos que, acreditando na partida dos militares do local do confronto, reduzem o estado de alerta, denunciando suas posições para policiais em tocaia.
 
Conforme Faleiros, a modalidade Tróia é um tipo de patrulhamento de emboscada muito usado pelo BOPE do Rio de Janeiro. No entanto, não há previsão nos manuais militares para esse tipo de atuação, em especial no Manual de Patrulhamento Militar do Exército Brasileiro, elaborado pela Academia Militar das Agulhas Negras.
 
Ainda segundo o magistrado, a utilização da Tróia é bastante controversa e vem sendo denunciada por organizações de direitos humanos e instituições democráticas. A estratégia ocasiona a execução dos suspeitos.
 
Ao votar, Faleiros destacou que uma guarnição entrando na selva para localizar e emboscar delinquentes do novo cangaço fortemente armados, utilizando da controversa técnica de Tróia, que sequer tem protocolos escritos, aliado a uma falta de motivação comprovada de um homicídio doloso, reforçaria tese do erro de fato.
 
Ou seja, seria plausível que o réu Lucélio Gomes Jacinto desferiu o tiro que matou Scheifer por acidente, imaginando-se numa situação de legítima defesa ou estrito cumprimento do dever legal. Sobre erro de fato, Código Penal Militar considera  que é isento de pena quem, ao praticar o crime, supõe, por erro plenamente escusável, a inexistência de circunstância de fato que o constitui ou a existência de situação de fato que tornaria a ação legítima.
 
“O que se conclui dos autos, portanto, é que existe dúvida se houve o homicídio qualificado ou se houve o erro de fato. Até pensa-se que o réu Jacinto não seja honesto ou santo, porém o fato dos réus serem comprovadamente mentirosos não implica dizer que são homicidas. A mentira não prova o homicídio. Uma conclusão desse tipo é muito perigosa. A mentira pode ter sido por vários motivos, inclusive para encobrir essa tática controversa chamada 'Tróia', por ser contrária aos direitos humanos”, salientou Faleiros.

O voto do juiz auditor foi seguido apenas por um dos militares do conselho de sentença. Por maioria, Lucelio Gomes Jacinto foi condenado à pena privativa de liberdade de 20 anos de reclusão, a ser cumprida inicialmente em regime fechado, devendo aguardar o recurso preso. Mandado de prisão, porém, foi suspenso por força de estar em vigor habeas corpus proferido pelo Tribunal de Justiça.
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