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Sexta-feira, 19 de abril de 2024

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sem véu de noiva

“Se soubesse que não tinha véu, não teria vindo”: comerciante relata frustração de turistas em cachoeira que secou em Chapada; veja fotos e vídeos

Foto: Rogério Florentino / Olhar Direto

“Se soubesse que não tinha véu, não teria vindo”: comerciante relata frustração de turistas em cachoeira que secou em Chapada;  veja fotos e vídeos
Cartão postal de Chapada dos Guimarães (60 quilômetros de Cuiabá) que costumava receber cerca de 150 mil visitantes por ano antes da pandemia, a cachoeira Véu de Noiva passa por um momento crítico em decorrência da atual crise hídrica. Em tempos normais, a água forma uma linda queda de 75 metros. Mas quem procura o ponto turístico no Parque Nacional hoje só consegue enxergar uma fina 'linha branca' que despenca em uma pequeno poço de aspecto turvo. Sem o principal atratativo, sobra ao visitante desfrutar dos paredões e tentar a sorte de avistar as araras que fazem ninhos por ali.


“Se soubesse que não tinha véu, eu não teria vindo”. Foi isso que ouviu de um turista o morador da cidade há mais de 20 anos e também comerciante, Antônio Cabral Souza, 40. Ao Olhar Direto, ele contou que a queda d’água diminuiu perceptivelmente há um mês, e a cada dia que passa o volume fica menor.

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Com a redução no número de visitantes por causa da pandemia e também com a crise hídrica de Chapada dos Guimarães, Antônio detalha algumas dificuldades. “A gente não consegue pagar as contas, acumulou tudo, até para comer ficou difícil, tudo subiu”, diz.



O público também tem mudado nos últimos dias. “Diminuiu muito [a visitação] e agora vem mais pessoas da região. Antes vinham pessoas de fora. Nos últimos dois anos, a seca foi muito puxada. Esses dias chegou um turista e falou: ‘se soubesse que não tinha véu, eu não teria vindo’”, lamentou.

Desde 2008, não é possível tomar banho no local, pois houve um desmoronamento que feriu alguns turistas e matou uma pessoa. Moradora da capital mato-grossense, Eva Maria foi uma das pessoas que frequentou o local antes da restrição. Ela descreve como ‘emocionante’ a experiência que teve há mais de uma década.

“Tínhamos acesso [a água], as pessoas tomavam banho. Já consegui ir acima, muito lindo, era uma emoção. Por conta de acidentes e para proteger, criou-se essa limitação”, lembra Eva, que acompanhava uma amiga de Brasília (DF) para conhecer o Véu de Noiva.

“A natureza é maravilhosa, pena que o homem coloca a mão e estraga”, acrescentou a amiga, Janes Costa, que guia de turismo. “Eu vim na expectativa de ver o Véu de Noiva, e o que a gente viu, infelizmente, é pouca água”.

Crise hídrica

Chapada dos Guimarães decretou situação de emergência causada pela ausência de chuva em todo território no fim do mês de julho. A homologação estadual aconteceu no dia 13 de agosto, com validade de 180 dias (seis meses).

O documento cita que o ecoturismo está prejudicado devido ao exaurimento hídrico nos atrativos turísticos, o que causa desequilíbrio em toda a cadeia comercial que compõe a sua base econômica. Diante da situação, o poder público municipal foi obrigado a contrair despesas extraordinárias e não suportadas na ordem de R$ 80 mil, despesas que podem chegar a R$ 622 mil até o fim do período de estiagem.

Reprodução: Internet

Véu de Noiva em 30 de agosto. Foto: Rogério Florentino / Olhar Direto

Em recente entrevista ao Olhar Direto, o prefeito Osmar Froner explicou que pelo terceiro ano consecutivo a cidade sofre com a seca. “O Lago do Manso está com 279,60 metros. A cota mais baixa está em 17% do seu volume. É a mais baixa da história do Manso. E a cota mínima é 278,80. É preocupante, está entrando 31 metros cúbicos por segundo, saindo pouco mais de 100. No entorno do lago, os córregos exauriram. Das 70 comunidades que temos, 22 estão com extrema dificuldade com a água”, disse.

“Este ano queremos entregar 12 poços artesianos e vamos continuar com esse programa para abastecer as comunidades. Enquanto isso, estamos levando o abastecimento através de caminhão-pipa e em outros locais dando a solidariedade com cesta-básica, com socorro e presença, inclusive do prefeito nos finais de semana para amenizar esse impacto da seca”, pontuou.

Para este ano, os institutos preveem um sinal de melhora com relação a chuva, conforme o professor de Climatologia do Departamento de Geografia da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), doutor Rodrigo Marques, pontua que os institutos preveem um sinal de melhora.

“O grande problema é que este ano choveu cerca de metade do esperado. E desde o fim do ano passado tem chovido menos. As previsões indicam que teremos chuvas dentro da normalidade. Se isto se confirmar, até o final de setembro a estação chuvosa deve se iniciar”.

O curso da água

Criado em abril de 1989, o Parque Nacional de Chapada dos Guimarães está localizado na bacia do rio Cuiabá. Um dos principais cursos d’água é o Rio Coxipó, cuja nascente fica fora do Parque Nacional, na área urbana do município, que constitui parte de sua área de recarga.



Na margem direita, após a Cachoeirinha, o Rio Coxipó recebe o córrego Piedade, formador da Cachoeira dos Namorados e forma a cachoeira Véu de Noiva. Na sequência, recebe ainda o córrego Independência, que tem nascentes fora do Parque Nacional e forma o Circuito das Águas.

Algumas propriedades, no entanto, fazem a captação da água, antes da queda do Véu de Noiva. Com isso, levantou-se um questionamento sobre essa absorção e como ela poderia influenciar na diminuição do volume da água ano após ano.

Neste trecho de aproximadamente 2 kms entre a nascente e o Parque Nacional, ficam o Vale da Benção, onde há alguns empreendimentos de agricultura, a Hortatec, a Escola Técnica Estadual de Ensino Profissional e Tecnológica de Buriti, entre outros.


Captação da água pela empresa é regular. Foto: Rogério Florentino / Olhar Direto

Os moradores da região levantaram hipóteses sobre o uso de recursos hídricos da Hortatec. Porém, o direito é concedido através da portaria Nº 522 de 05 de junho de 2018 da Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema), que vigorará até o ano de 2028.

A publicação no Diário Oficial do Estado (DOE) cita que a finalidade é de irrigação de 20 hectares para uso da família solanácea, pelo sistema de gotejamento e 10 hectares de hidroponia, na Fazenda Buriti.  

Em conversa com a reportagem, o socioproprietário José Francisco Cardoso Meirelles disse que os trabalhos estão de acordo com as normas ambientais e que, inclusive, nos últimos anos, reduziu o consumo de água.

“O gotejamento já acabou, só tenho dois hectares, virou só hidroponia. Essa água é colocada em uma caixa, bombeada ela volta por gravidade pela hidroponia e fica circulando o dia inteiro. Qual meu consumo? É o consumo da planta pela raiz e um alguma coisa pela evaporação do calor”, cita o empresário que se mostrou disposto a abrir seu empreendimento para mostrar o processo de cultivo.



Zeca considera injusto atribuir a redução da água no Véu de Noiva ao trabalho da Hortatec. Afirma também que todo ano no período da seca há essa redução e que os problemas hídricos ocorrem até mesmo na área urbana da cidade. “Não somos nós que estamos acabando com a água. É uma série de coisas em um rio pequeno e uma situação de seca prolongada e absurda, que vem desde o ano passado. Esse ano de 2021 não choveu o esperado”.

Avaliações do ICMBio

Em relatório do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) produzido há mais de dez anos, já são citadas questões que merecem destaque a fim de prevenir a degradação e contaminação dos recursos hídricos de Chapada dos Guimarães. Veja a seguir: 

- Disposição de resíduos sólidos: hoje, o lixão da cidade de Chapada dos Guimarães está próximo à nascente de um afluente do rio Coxipó;

 - A questão da urbanização: a cidade de Chapada dos Guimarães está na borda do planalto, com expansão para o Vale da Benção; parte da cidade está em região de drenagem das nascentes do rio Coxipó, mas não existe sistema de tratamento de esgoto e o sistema de águas pluviais é restrito a algumas áreas. Atualmente, as águas de chuva drenam diretamente das ruas para as nascentes e cursos d’água;

- Turismo predatório: existem, no limite do Parque Nacional, principalmente na faixa que vai do rio Mutuca à Salgadeira, inúmeras chácaras de lazer com construções irregulares e facilidade de acesso a áreas fechadas para visitação ou interditadas para recuperação.

 - Uso de agrotóxicos e insumos agrícolas em empreendimentos agropecuários localizados próximo às nascentes, veredas e matas ciliares.




Naquela época, algumas propriedades ou posses, em sua maioria, chácaras de recreio, já usufruíam da área do Parque. A relação entre os ocupantes e a Unidade de Conservação ainda é conflituosa, já que a maioria deles desrespeita as leis ambientais, especialmente em relação à proteção de Áreas de Proteção Ambiental (APP’s), onde são construídas diversas estruturas para dar apoio às atividades de lazer.



A situação fundiária de Chapada dos Guimarães é complexa e os primeiros registros de esforços para esclarecer foram em 1990. Sabe-se que ainda há estabelecimentos comerciais instalados em áreas invadidas do Parque Nacional, cujos processos de regularização estão em andamento e longe de terem uma conclusão. 

Governo de Mato Grosso quer fazer investimentos

O governador Mauro Mendes (DEM) viajou a Brasília no dia 28 de julho, para falar diretamente com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e pediu que o Parque Nacional de Chapada dos Guimarães fosse estadualizado, para que assim os projetos e construções sejam feitos com dinheiro estadual.

Depois disso, o Governo de Mato Grosso obteve autorização para fazer os investimentos estruturais. O secretário de Desenvolvimento Econômico, César Miranda, responsável pelo setor do turismo em Mato Grosso, conversou com a imprensa nesta manhã de segunda-feira (9) e confirmou que duas propostas haviam sido encaminhadas ao Ministério do Meio Ambiente para que o estado faça obras.

A autorização foi dada por meio de um termo de cooperação firmado entre a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico (Sedec) e o ICMBio, órgão responsável pelo parque. 

Os investimentos englobam o Complexo Véu de Noiva, com a construção de estrutura com escadas, elevador, e passarelas para conferir a cachoeira de perto. A previsão inicial é que o Estado invista cerca de R$ 50 milhões no parque. As obras devem ser finalizadas até dezembro de 2022.
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