Quando a agente de saúde Reggy Rose Lopes de Oliveira, de 51 anos, ouviu os gritos e pedidos de socorro da médica Jaqueline Matos da Croce, de 31, que foi atacada à facadas por um paciente psiquiátrico no PSF São José, no bairro Cristo Rei, em Primavera do Leste (a 234 km de Cuiabá), na tarde dessa quinta-feira (25), não pensou duas vezes em tentar salvar a colega de trabalho, que está grávida de quatro meses.
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Ao intervir na tentativa de homicídio, Rose foi esfaqueada no peito e chegou a ser socorrida com vida. Levada para um hospital particular da cidade, a morte da agente de saúde aconteceu quando era transferida para o centro cirúrgico. Durante o trajeto, Rose teve uma parada cardíaca e não resistiu.
Para a família, a agente de saúde foi uma "heróina", já que agiu rapidamente para tentar ajudar a médica grávida. A vítima deixou três filhos, sendo duas mulheres de 20 e 27 anos, que está grávida de sete meses, e um adolescente de 17.
A sobrinha de Rose, Laura Oliveira, conta que o agressor já entrou no consultório desferindo facadas em Jaqueline. De acordo com Laura, o ele era paciente psiquiátrico do local e tinha atendimento marcado nesta quinta-feira (25).
"Minha tia estava na outra parte do postinho saiu correndo, foi [até o consultório] no intuito de ajudar ela [a médica atacada]. Acho que minha tia gritou com ele, falou alguma coisa e ele partiu para cima dela. Minha tia correu como uma heroína, deu a vida dela em troca duas vidas. Pensou na vida da médica e da criança que a doutora estava esperando".
A suspeita é de que ela tenha tido um episódio de surto. Aos policiais militares que atenderam a ocorrência, o homem disse que cometeu o ataque por conta de um "atendimento ruim".
"Não teve como ser atendido outro dia, estava com a consulta marcada para hoje de manhã, não sabemos se ele estava sem o remedio e ficou nervoso. Deu um surto e foi até o postinho. Segundo relatam, do lado do postinho tinha uma creche, ele passou lá, tentou entrar e falou que precisava matar alguém".
Os funcionários da creche ainda teriam tentado avisar a equipe do postinho que o agressor estava indo para a unidade de saúde, mas não conseguiram, conforme conta Laura.
"Ele entrou no postinho e foi direto na sala da médica. Lá começou a atacar a doutora com golpes, ela grávida começou a gritar. Uma colega correu para outra sala e ligou para policia".
Um dentista que também atua no PSF chegou a tentar defender as colegas de trabalho usando uma mesa como "escudo". Laura explica que o agressor continuou esfaqueando a mesa "sem parar". Quando outras pessoas interviram na situação, o suspeito saiu correndo para a rua.
Do lado de fora do PSF, o homem ainda gravou um vídeo mostrando a faca usada para atacar as profissionais de saúde. Mesmo ferida, Rose conseguiu andar e dizer para outras funcionárias do local que o peito estava ardendo muito.
A sobrinha dela conta que, a princípio, ninguém percebeu que a agente de saúde também havia sido esfaqueada.
"Estavam socorrendo a médica, minha tia foi andando, tirou a mão viram que ela estava esfaqueada no peito. Falaram para ela apertar, ainda foi andando para o carro de uma colega enfermeira. Ela foi tentando conversar com ela".
Quando chegou no hospital, Rose precisou de tranferência de sangue e três bolsas chegaram a ser utilizadas. Os médicos também precisaram drenar o pulmão da vítima. Jaqueline ainda está internada em estado grave e precisou passar por cirurgia, não há informações atualizadas sobre o estado da médica.
Agente de saúde deixou três filhos
Descrita pela sobrinha como a "mais coração" dos nove irmãos, Laura deixou três filhos, sendo que uma das mulheres está grávida de sete meses. Antes de desmaiar por conta da dor causada pela facada, a agente de saúde lembrou da filha do meio.
"Ela disse que estava doendo muito, pediu para a amiga cuidar da filha que vai ganhar neném e fechou os olhos. Desmaiou", conta Laura.
As duas filhas mais velhas são fruto do primeiro casamento de Rose, que ficou viúva quando estava na segunda gestação. Até então, ela morava em Minas Gerais, mas decidiu tentar a sorte em Mato Grosso, onde passou em concurso realizado para Primavera do Leste.
"Se casou de novo e teve outro filho. Não deu certo e ela seguiu a vida solteira. Ela criava os três filhos sozinha, as meninas casaram recentemente. Sempre batalhou em busca de crescimento. São nove filhos, dos nove, era a mais coração".
A sobrinha explica que os filhos da agente de saúde "estão arrasados", já que a mãe também desempenhava o "papel de pai" na vida deles.
Segundo Laura, a tia era envolvida com questões sociais. Católica fervorosa, participava da Comissão Carcerária, que tinha atuação na penitenciária da cidade. A agente de saúde também tinha formação de técnica de enfermagem, mas deixou a profissão de lado para cuidar da mãe, de 83 anos.
Trabalhava em serviço social da igreja fazendo sopa para moradores de rua. A minha tia cuidou do meu avô até ele falecer, depois era a companheira da minha avó, dormia todos os dias com ela. Quando terminou o curso de enfermagem, trabalhava de dia como agente de saúde e a noite fazia plantão. Depois saiu para ficar as noites com a mãe".
O velório de Rose será realizado em Primavera do Leste até às 15h desta sexta-feira (26). Depois, o corpo será levado para Poxoréu (a 264 km de Cuiabá), onde o enterro acontecerá na manhã deste sábado (27).
O agressor foi preso em flagrante logo após o crime e segue detido. A Polícia Civil vai investigar o caso.