Depois de mais de 25 anos de luta, o povo Apiaká celebrou o reconhecimento oficial de seu território pelo Estado brasileiro. A conquista foi destacada durante a 11ª edição do Festival Juruena Vivo, realizada na aldeia Curva, localizada na Terra Indígena Erikpatsa, pertencente ao povo Rikbaktsa.
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Além do reconhecimento territorial, o encerramento do licenciamento da Usina Hidrelétrica Castanheira, que ameaçava a biodiversidade da região, foi outro motivo de celebração.
O manejo da castanha-do-brasil e o turismo de base comunitária são pilares da autonomia econômica dos Apiaká. Essas atividades não apenas garantem renda, mas também desempenham um papel crucial na proteção territorial.
“Quando reocupamos nossa terra tradicional, havia um garimpo a apenas 15 minutos de barco. Sem uma fonte de renda sustentável, alguns poderiam ser tentados a buscar trabalho no garimpo”, relembra Eduardo Morimã, líder da comunidade.
Para evitar essa situação, a comunidade estruturou as atividades de manejo de castanha e turismo de pesca esportiva. De março a novembro, a comunidade se dedica ao turismo, enquanto de dezembro ao início da próxima temporada de pesca, concentram-se na coleta de castanhas.
A agenda natural das atividades também precisou ser harmonizada com o ciclo da agricultura familiar. “Quando é época de cuidar da roça, há um revezamento. Quem está no turismo há mais tempo volta para a roça, enquanto outros assumem as atividades turísticas”, explica Morimã.
Outro ponto de inovação foi o desenvolvimento de chumbadas biodegradáveis para a pesca esportiva. Feitas com argila e areia, essas chumbadas são uma alternativa ecológica ao chumbo, que é tóxico. O sucesso do projeto deu visibilidade às práticas sustentáveis dos Apiaká e abriu portas para a regularização do turismo de base comunitária na Terra Indígena Apiaká do Pontal e Isolados. Atualmente, a comunidade aguarda a aprovação formal da Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) para oficializar a atividade.
Eduardo Morimã destaca os principais benefícios das atividades: “Elas promovem o envolvimento da comunidade, a proteção do meio ambiente, a geração de renda e o fortalecimento de nossas organizações”. Com apoio do projeto “Berço das Águas”, realizado pela Operação Amazônia Nativa (OPAN) e patrocinado pelo Programa Petrobras Socioambiental, os Apiaká e os Rikbaktsa fortalecem suas cadeias produtivas e a prática de um turismo consciente e inclusivo.
A 11ª edição do Festival Juruena Vivo foi também um espaço de trocas de experiências entre povos indígenas e comunidades tradicionais. Durante a mesa de debate “Economias regionais que valorizam a floresta e o Cerrado em pé”, Eduardo Morimã compartilhou as conquistas dos Apiaká.
Outros representantes também trouxeram exemplos inspiradores. Ana Vylena Souza, da Rede Tucum (CE), relatou a bem-sucedida experiência do turismo de base comunitária em comunidades extrativistas cearenses. Tatá Apurinã, da Associação dos Produtores Indígenas da Terra Indígena Caititu (APITC), destacou o impacto positivo do sistema de agrofloresta e o papel da associação na melhoria da qualidade de vida local.
A experiência do povo Rikbaktsa foi apresentada por Aldenor Matsimu, que relatou o desenvolvimento de uma agricultura familiar sustentável em 100 hectares da Terra Indígena Japuíra, onde cada família cuida de um hectare. Já Elaine Guilherme, da Associação São Brás de Nova Bandeirantes, relatou a história do grupo de mulheres Cereja Negra, que produz cafés especiais com práticas sustentáveis.
As experiências relatadas no Festival Juruena Vivo destacam que é possível aliar a preservação ambiental com a geração de renda. Projetos como o “Berço das Águas” e as práticas sustentáveis do povo Apiaká provam que a floresta e o Cerrado podem se manter em pé enquanto promovem o bem-estar das comunidades locais.
O protagonismo dos povos indígenas, ao adotar práticas sustentáveis e inovadoras, evidencia a importância de valorizar seus conhecimentos ancestrais para a preservação dos biomas brasileiros e a promoção de uma economia justa e solidária.